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Governo Milei trava avanços do Mercosul para marcar posição oposta ao Brasil, notam analistas

© AP Photo / Seth WenigJavier Milei caminha pelo pregão da Bolsa de Valores de Nova York antes de tocar o sino de abertura. EUA, 23 de setembro de 2024
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Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas afirmam que a decisão de Milei de travar a indicação de brasileiro como coordenador de fundo do Mercosul é mais uma ação tomada para demonstrar o distanciamento com o governo Lula e sua agenda de integração regional.
O governo do presidente argentino, Javier Milei, vem travando há cinco meses a indicação do economista brasileiro Luciano Wexell para o cargo de coordenador-executivo da unidade técnica do Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), bloco composto por Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia.
O fundo foi criado em 2004, no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o objetivo de reduzir as assimetrias entre países do bloco. É financiado majoritariamente por Brasil e Argentina e tem como principais beneficiários Uruguai e Paraguai. A ideia é fomentar o desenvolvimento de países mais pobres do Mercosul, de maneira a nivelar economicamente os membros do bloco em um modelo similar ao promovido pela União Europeia (UE).
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Cairo Junqueira, professor do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e pesquisador do Observatório de Regionalismo (ODR), analisa as distintas visões de cada lado em relação ao imbróglio. Ele afirma que Milei argumenta que, desde 2007, o Focem não conta com uma coordenação geral, e que isso não impede que o fundo funcione.
Em contrapartida, o governo Lula recentemente quitou uma dívida com o Focem, e agora "quer dar andamento em alguns projetos". Ele lembra que, embora o Focem tenha a política de redução de assimetria, parte desses fundos pode ser alocada em obras também no Brasil.

"Então o governo brasileiro quer isso também. O fato de indicar Luciano [Wexell] é ter alguém que entende do assunto, é mais especialista, está mais ligado à área e seria muito bom para o Brasil nesse sentido. Então são interesses e posicionamentos diversos", argumenta.

Ele afirma que a situação não é uma novidade e marca o que chama de "distanciamento conjuntural e de ocasião" entre os governos de Brasil e Argentina, de Lula e Milei, que já foi vivenciado em outras ocasiões, com presidentes diferentes.
Ele frisa que, historicamente, o Mercosul tem uma dinâmica "muito atrelada a interesses governamentais", avançando quando os governos de Brasil e Argentina estão próximos e retraindo quando há distanciamento nas relações.

"O que eu enxergo agora, basicamente, com as suas devidas proporções, é um movimento similar ao que gente viu na época em que [Jair] Bolsonaro estava aqui [na presidência] e o [Alberto] Fernández na Argentina. A gente vê agora [esse mesmo movimento], claro, com trocas de presidentes."

Ele acrescenta como exemplo de aproximação que resultou em posições divergentes em torno do Mercosul os primeiros dois mandatos de Lula, quando a Argentina era presidida por Néstor Kirchner e, posteriormente, Cristina Kirchner.
"A gente pega um outro momento de aproximação, por exemplo, entre o [Mauricio] Macri, na Argentina, e o [Michel] Temer aqui no Brasil. A gente vê esses movimentos [acerca do Mercosul] um pouco mais próximos. Quando a gente vê, por exemplo, [Jair] Bolsonaro e [Alberto] Fernández, ou agora, Lula e Milei, há certo distanciamento, e algumas questões de fato ficam travadas."
Junqueira enfatiza que o que Milei deseja é demonstrar um distanciamento em relação ao bloco, embora ressalte que o presidente argentino age muito mais pelo discurso do que pela prática. Ele destaca que essa mesma intenção motivou a ausência de Milei na reunião de lideranças do bloco ocorrida em julho em Assunção, no Paraguai. Seria a primeira participação de Milei em uma reunião do Mercosul, e o não comparecimento marcou a primeira ausência de uma liderança argentina em um evento do bloco.
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Em contraponto, Junqueira ressalta que a agenda de Lula é totalmente oposta, mais pró-Mercosul no sentido de fortalecimento do bloco, em prol da integração. Ele afirma que para contornar a situação, Lula terá de recorrer à diplomacia.

"É uma questão que envolve muita conversa, muita cooperação, muito diálogo num primeiro momento, antes de chegar a um rompimento ou algo do tipo, que é muito difícil de acontecer", afirma.

Governo Milei não mira a integração sul-americana

Bruno Lima Rocha, jornalista, cientista político e professor de relações internacionais, avalia que Wexell é um grande especialista brasileiro em integração regional, com capacidade de criar uma unidade aduaneira ou monetária ou uma proposta que "fosse um encontro das necessidades conjuntas" dos outros países do Mercosul.

"Mas a impressão que dá da chancelaria argentina, com a ministra Diana Mondino e o próprio papel de Javier Milei em relação ao Mercosul, é que o governo argentino tem como missão tirar qualquer tipo de potencialidade do Mercosul. Simples assim."

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Rocha afirma que "tudo aquilo que for ao encontro dos interesses ocidentais, o governo argentino vai se posicionar a favor".
Ele aponta que é um posicionamento oposto a Sergio Massa, seu rival na disputa pela presidência argentina que, em 2023, ainda candidato, visitou Brasília em um momento em que estavam sendo traçados interesses comuns entre Brasil e Argentina via Mercosul.

"Seria a [criação de uma] unidade aduaneira, uma moeda intercambiável e digital entre os bancos centrais, [...] o aumento da capacidade ou a retomada do Banco do Sul, ou o aumento da capacidade de investimento via NBD [Novo Banco de Desenvolvimento], o banco do BRICS, uma companhia de navegação binacional que se dedicaria tanto ao fomento da indústria naval dos dois países como também à navegação de cabotagem."

Ele diz considerar o uso racional de recursos do Mercosul defendido por Milei como "um discurso contra o planejamento", já que o governo argentino vem barrando todo planejamento possível no Mercosul.
"Porque poderia ser criado um sistema de securitização com venda conjunta, uma bolsa comum, uma cota de venda comum de soja, por exemplo, dos quatro países, uma cota de venda de commodities comuns, fosse para a União Europeia, para os EUA ou para a China, mas nada disso acontece", afirma.
Rocha acrescenta que o governo Milei não tem qualquer plano fora "liberar os recursos minerais, acabar com qualquer tipo de subsídio, não fazer nenhum acordo estratégico em nível sul-americano e não pensar a América Latina como bloco".
"Enfim, manter a inserção subordinada de uma economia primarizada diante dos países ocidentais, em geral, e dos EUA, em particular. É isso que eles [argentinos] querem. E aí, quando o Brasil coloca uma possibilidade concreta de ter uma tecnocracia que pense o Mercosul dentro de uma estratégia de médio prazo, [o governo argentino] dá para trás", conclui.
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