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Mercenários ficariam sem apoio jurídico do Brasil e podem ser presos na Rússia, diz analista

© Sputnik / Konstantin MikhalevskyCidadão britânico Aiden Eslin, acusado de participar como mercenário como parte de formações armadas ucranianas em hostilidades no território de Donetsk, durante audiência (foto de arquivo)
Cidadão britânico Aiden Eslin, acusado de participar como mercenário como parte de formações armadas ucranianas em hostilidades no território de Donetsk, durante audiência (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
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Moscou reafirma que mercenários estrangeiros são alvos militares legítimos e passíveis de prisão na Rússia como criminosos comuns. Brasil ainda é o segundo país latino-americano que mais fornece mercenários para Kiev e faz pouco para reprimir grupos de recrutadores atuando em solo nacional, disseram analistas à Sputnik Brasil.
Nesta quarta-feira (15), o porta-voz da presidência russa, Dmitry Peskov, declarou que mercenários estrangeiros lutando ao lado de Kiev são alvos militares legítimos para a Rússia. A afirmação foi feita em resposta à pergunta de jornalistas sobre suposto desaparecimento de mercenário australiano na zona de combate.
"[A Rússia] está bem ciente - e isso se reflete no terreno - que mercenários estrangeiros participando das hostilidades ao lado do regime de Kiev, lutando com armas nas mãos contra nossas Forças Armadas, são alvos legítimos", afirmou Peskov.
Conforme o déficit crônico de soldados nas Forças Armadas da Ucrânia se torna agudo, o papel dos mercenários estrangeiros no campo de batalha fica evidente. Nesta sexta-feira (16), militares russos relataram à Sputnik terem eliminado mercenários estrangeiros durante a libertação do vilarejo de Peschanoe, na direção de Pokrovskoe.
© Sputnik / Stanislav KrasilnikovMilitares russos na direção de Krasny Liman na zona da operação militar especial.
Militares russos na direção de Krasny Liman na zona da operação militar especial. - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
Militares russos na direção de Krasny Liman na zona da operação militar especial.
"Havia mercenários entre os inimigos. Identificamos bandeiras da Polônia e da Bulgária", disse um soldado da tropa de choque à Sputnik. "Para ser mais preciso, eram parte da 425ª brigada de assalto aerotransportada das Forças Armadas da Ucrânia, o batalhão nacionalista 'Skala', composto por mercenários e nazistas."
© Sputnik / Stanislav KrasilnikovUma estrada na direção de Krasnoarmeisk (Pokrovsk, na denominação ucraniana) na zona da operação militar especial.
Uma estrada na direção de Krasnoarmeisk (Pokrovsk, na denominação ucraniana) na zona da operação militar especial. - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
Uma estrada na direção de Krasnoarmeisk (Pokrovsk, na denominação ucraniana) na zona da operação militar especial.
Segundo militares que participaram da libertação de Peschanoe ouvidos pela Sputnik, o inimigo usava exclusivamente armas da OTAN, sem nenhuma arma de fabricação nacional identificada durante a operação.

América Latina

Mercenários latino-americanos também arriscam as suas vidas na linha de frente do conflito ucraniano. Apesar da presença massiva de colombianos, o Brasil é o segundo país que mais fornece soldados para as forças de Kiev. De acordo com o jornalista Lucas Leiróz, que pesquisa a atividade mercenária no Brasil, os motivos que levam os latino-americanos a optar por lutar na Ucrânia são sociais, políticos e econômicos.

"O cenário brasileiro é de desindustrialização econômica e desemprego. Por isso, parte das classes mais baixas veem no serviço militar obrigatório a chance de um primeiro emprego", disse Leiróz à Sputnik Brasil. "Muitos brasileiros conseguem estender o serviço militar obrigatório até o período máximo de oito anos [...], mas depois disso não conseguem se manter nas Forças Armadas."

Confrontado com a escassez de postos de trabalho, esses militares buscam oportunidades fora do país, o que explica não só a presença de brasileiros no campo de batalha ucraniano, mas também a profissionalização militar do crime organizado nacional.
Militar durante a operação Verde Brasil II, em Porto Velho (RO), em 11 de maio de 2020 - Sputnik Brasil, 1920, 23.12.2024
Operação militar especial russa
Mercenários brasileiros formam grupo para lutar ao lado do Exército ucraniano (FOTOS)
"Vemos que pessoas egressas das Forças Armadas acabam transmitindo conhecimentos para traficantes, uma situação muito comum no Brasil hoje", lamentou Leiróz. "Vemos cidadãos brasileiros que entraram nas Forças Armadas ainda jovens, que obtiveram toda sua formação profissional voltada para a área militar, e, no final, precisam aplicar esses conhecimentos fora dela."
De acordo com o presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, Rodolfo Queiroz Laterza, o retorno destes mercenários ao Brasil também preocupa, dada a falta de acompanhamento psicológico e material.

"[O retorno] é um grave problema e risco para a segurança nacional. A imensa maioria não se adequa à sociedade em uma vida regular e em conformidade com a lei, ficando suscetíveis a cooptação por facções criminosas", disse Laterza à Sputnik Brasil.

Para o jornalista e pesquisador Leiróz, a exposição de mercenários brasileiros à ideologia neonazista em voga entre combatentes na Ucrânia também preocupa.
© Sputnik / Ilya PitalevAutoridades algemam o cidadão croata Vekoslav Prebeg, acusado de participar como mercenário em hostilidades no território da Donetsk como parte de formações armadas ucranianas (foto de arquivo)
Autoridades algemam o cidadão croata Vekoslav Prebeg, acusado de participar como mercenário em hostilidades no território da Donetsk como parte de formações armadas ucranianas (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
Autoridades algemam o cidadão croata Vekoslav Prebeg, acusado de participar como mercenário em hostilidades no território da Donetsk como parte de formações armadas ucranianas (foto de arquivo)
"Por mais que muitos mercenários sejam motivados pelo ganho financeiro, quando chegam ao contexto da guerra, eles se tornam ideologizados e fanatizados pelo contexto ideológico e político da Ucrânia", alertou Leiróz. "De fato, há muitos brasileiros na Ucrânia, muitos já morreram, mas muitos continuam em atividade. Existem vários relatórios mostrando a presença de brasileiros [na região russa] de Kursk."

Mercenários em território russo

A presença de mercenários latino-americanos na região de Kursk foi destaque na mídia russa nesta semana. A procuradoria geral do país iniciou processo judicial contra o mercenário paraguaio Jorge Adrian Lugo Jiménez, por crimes de terrorismo e atividade mercenária.
De acordo com as autoridades russas, Jiménez não só violou as fronteiras da Rússia ilegalmente, mas também cometeu crimes contra a população civil.
"Com o objetivo de intimidar a população, causar danos significativos à propriedade e desestabilizar as atividades das autoridades, o réu cometeu crimes contra civis", disse o Comitê de Investigação russo em comunicado à imprensa.
© Foto / Procuradoria-Geral da RússiaMercenário paraguaio Jorge Adrian Lugo Jiménez, em foto divulgada pelo canal do Telegram da Procuradoria-Geral da Rússia
Mercenário paraguaio Jorge Adrian Lugo Jiménez, em foto divulgada pelo canal do Telegram da Procuradoria-Geral da Rússia - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
Mercenário paraguaio Jorge Adrian Lugo Jiménez, em foto divulgada pelo canal do Telegram da Procuradoria-Geral da Rússia
Segundo Leiróz, como a atividade mercenária não é regulada internacionalmente, "a partir do momento que ele viola as fronteiras da Rússia, as autoridades russas têm todo o direito de atuar".

"Isso explica por que ele será processado na esfera criminal civil, e não na esfera do direito da guerra. Quando ele entra no território russo, ele passa a ser um cidadão estrangeiro comum, cometendo crimes na Rússia", explicou Leiróz. "Ele não será coberto pelo direito militar, já que tomou a decisão individual e voluntária de se engajar no conflito."

O processo movido contra o paraguaio deve servir de alerta para demais mercenários latino-americanos. Em função da sua posição internacional ambígua, na qual luta por um país do qual não possui cidadania, o mercenário frequentemente fica sem apoio jurídico de nenhum ente estatal.
© Foto / Ilya PitalevCidadão britânico Andrew Hill, acusado de participar como mercenário em operações militares no território de Donetsk como parte de formações armadas ucranianas, se apresenta em tribunal (foto de arquivo)
Cidadão britânico Andrew Hill, acusado de participar como mercenário em operações militares no território de Donetsk como parte de formações armadas ucranianas, se apresenta em tribunal (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
Cidadão britânico Andrew Hill, acusado de participar como mercenário em operações militares no território de Donetsk como parte de formações armadas ucranianas, se apresenta em tribunal (foto de arquivo)
"Ao se prestar ao trabalho de participar como mercenário em uma guerra, a pessoa se coloca em uma situação de total vulnerabilidade", disse Leiróz. "A única proteção legal que eles podem ter é aquela permitida pelo próprio país que os capturou."
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O presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, Laterza concorda, afirmando que o mercenário se encontra "totalmente vulnerável do ponto de vista jurídico".

"Havendo cooperação jurídica da Rússia com os países envolvidos, pelo princípio da justiça universal que norteia a extraterritorialidade da Lei penal, [os mercenários] serão processados criminalmente pela Rússia, com as possibilidades de expedição de mandados de prisão com acionamento da Interpol", disse Laterza.

Caso o país de origem, como o Brasil, intercedesse em favor do mercenário, isso configuraria "grave quebra de acordos jurídicos internacionais que pautam a extraterritorialidade da Lei Penal de cada Estado-nação".
"O princípio da justiça penal universal [...] estabelece que o agente do crime deve ser sujeito à lei do país onde for encontrado, independentemente de sua nacionalidade, do local do crime ou do bem jurídico lesado", explicou Laterza. "No Brasil, o princípio da justiça penal universal está previsto no artigo 7º do Código Penal."
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Para ele, o Brasil não age de maneira suficiente para mitigar a atividade mercenária entre os seus cidadãos.
"[O Brasil deveria] investigar a cooptação e recrutamento de cidadãos brasileiros para agirem em conflitos internacionais como mercenários, mediante pagamento de recompensas", acredita Laterza. "Como se trata de crime com repercussão interestadual, [isso deveria ser feito] pela Polícia Federal com apoio das Polícias Civis."
O analista Leiróz acredita ser necessário ampliar a cooperação jurídica internacional para mitigar a atividade mercenária e controlar grupos de recrutadores atuando em solo brasileiro.

"Temos muitos grupos extremistas, neonazistas e neofascistas que atuam nas sombras no Brasil, incentivando esse tipo de atividade", disse Leiróz. "Temos também o próprio trabalho irresponsável da mídia hegemônica, que retrata a guerra como algo fácil [...], iludindo brasileiros a irem para lá achando que vão ganhar dinheiro fácil."

Processos judiciais como o iniciado pela Rússia contra o mercenário paraguaio demonstram que as consequências penais da atividade mercenária são reais. "São cidadãos que abandonaram sua pátria para cometer crimes no exterior. E deve estar a par das consequências dessas decisões", concluiu Leiróz.
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