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Interesse em errar: por que o mercado financeiro tem uma taxa tão baixa de acerto em suas previsões?

© AP Photo / Andre PennerHomem olha para monitores com preços das ações na sede da bolsa B3 em São Paulo, 21 de outubro de 2021
Homem olha para monitores com preços das ações na sede da bolsa B3 em São Paulo, 21 de outubro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 04.03.2025
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Nos últimos anos, o mercado financeiro brasileiro errou 95% de suas previsões econômicas. Essa disparidade entre expectativa e realidade trata-se do conceito de cisne-negro, eventos financeiros de difícil previsão, ou a manipulação de mercados pelas elites econômicas?
Este foi o tema do episódio desta terça-feira (4) do Mundioka, podcast da Sputnik Brasil apresentado pelos jornalistas Melina Saad e Marcelo Castilho.
#566 Mundioka - Sputnik Brasil, 1920, 04.03.2025
Mundioka
Os erros do invisível mercado, que derrubam até o governo
Em entrevista ao programa, o professor de economia do Ibmec Brasília Renan Silva afirmou que tanto explicações sobre a dificuldade de se realizar previsões quanto a manipulação ativa são cenários possíveis de acontecer e que possuem lastro na história.
"Séculos atrás já havia esse ímpeto dos agentes de mercado de usar informações privilegiadas e direcionar os investidores 'amadores' para algum tipo de movimento do mercado que favoreça alguns grupos econômicos", disse o especialista.
Silva ressalta, no entanto, que o mercado financeiro é extremamente complexo, sendo composto por milhares a milhões de participantes "com diferentes níveis de informação, análise e experiência".
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Então, é natural que haja um grau de falha nas previsões, tanto quando há um cenário de volatilidade na economia, como era o Brasil nos anos 1980 e 1990, ou nos últimos anos, com um entra e sai de legislações fiscais, de Teto de Gastos para Arcabouço Fiscal.
O professor destaca, contudo, que essas falhas nas previsões têm efeitos reais na economia e, principalmente, na vida dos cidadãos comuns. Se o mercado prevê uma alta na inflação, comerciantes e empresários podem começar a se defender dessa inflação e já imputar uma alta nos preços, criando uma "inflação futura que ainda não aconteceu e gerar uma inflação inercial".

"Previsões errôneas sobre possível recessão, a gente tem visto muito isso no Brasil ultimamente, podem levar as empresas, por exemplo, a reduzir investimentos ou até mesmo demitir precipitadamente os funcionários, criando um ciclo vicioso."

Quando o erro tem um viés

Ao Mundioka, o economista e petroleiro Pedro Faria destacou que "é normal errar previsões econômicas". O que chama atenção é que essas previsões erram "sistematicamente pro mesmo lado [...] quando o erro tem um viés".
O analista lembrou ao programa casos de manipulação da política monetária no passado, como em 2012, quando descobriu-se que bancos ingleses estavam mentindo para a autoridade central sobre os juros praticados nos seus empréstimos privados intrabancários.
Por mais que no atual caso brasileiro não exista evidências de manipulação ou conspiração deliberada, as expectativas do mercado "não são neutras", afirmou Faria, justamente pelo sistema de metas no qual se sustenta a política monetária brasileira.
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Baseado nas expectativas de diferentes agentes econômicos, o sistema de metas de inflação culmina nos Boletim Focus, divulgados pelo Banco Central, e nas políticas do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC.
Em teoria, todos os agentes econômicos relevantes deveriam ser ouvidos pelo BC na elaboração do boletim. No entanto, a maioria dos consultados são bancos, casas de investimento e corretoras, isto é, agentes que têm interesses distintos aos do governo.

"Eles têm consciência disso e eu tenho a impressão de que eles utilizam, de fato, as expectativas como forma de guiar o debate público para algo que os interessa."

Como exemplo dessa diferença, Faria destacou as previsões errôneas do mercado, que não só apresentaram uma taxa de erro de 95% nos últimos anos como também erraram em larga medida.
No início de 2024, o mercado previa um crescimento de 1,8% no Brasil. No entanto, uma estimativa do Banco Central aponta que esse número está mais próximo de 3,5%. "Então nós não estamos falando de um erro pequeno, é quase o dobro."
Em parte, essas falhas se devem muito mais às más concepções econômicas do que qualquer outra coisa. "São modelos que subestimam o efeito do gasto público no crescimento econômico", detalha o economista.

"Agora, se você sistematicamente erra para o mesmo lado, aí nós temos um problema. Seja de manipulação, seja porque o seu modelo está mal feito, você tem algum interesse em fazer uma previsão que não é a mais estatisticamente possível."

Assim como o professor Renan Silva, o economista Pedro Faria também apontou que esses erros têm consequências reais no dia a dia do cidadão, como ao pregar por um aumento na taxa de juros. "Isso afeta o custo de financiar um imóvel, o custo de empreender, de fazer uma expansão na empresa."
O problema ecoa, novamente, para o sistema sobre o qual a política monetária brasileira está montada. Segundo Faria, dá-se um peso demasiado para as expectativas dos agentes econômicos, "que eu não vejo ser o caso em outros países".
"Nos Estados Unidos e na Europa, obviamente, os bancos centrais escutam os agentes do mercado financeiro, mas eles não têm um efeito tão central assim nas suas decisões como a gente vê aqui nas próprias atas do Comitê de Política Monetária."
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