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Objetivo dos EUA em Gaza é conter a influência de Rússia e China no Oriente Médio, notam analistas

© AP Photo / Abdel Kareem HanaCrianças brincam perto dos escombros de casas e prédios destruídos em Jabalia, norte da Faixa de Gaza, em 7 de março de 2025
Crianças brincam perto dos escombros de casas e prédios destruídos em Jabalia, norte da Faixa de Gaza, em 7 de março de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 10.03.2025
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Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas apontam que, ao tentar tomar o controle de Gaza, os EUA tentam impedir que o Oriente Médio se alinhe aos vencedores da luta geopolítica do pós-Guerra Fria, que hoje compõem o BRICS, sobretudo China e Rússia.
A Faixa de Gaza possui reservas significativas de gás natural e petróleo, cujo potencial econômico tem atraído interesse internacional, inclusive dos EUA.
O campo de Gaza Marine, por exemplo, descoberto no ano 2000 pela British Gas Group, está localizado a aproximadamente 36 km da costa de Gaza, a uma profundidade de 610 metros. Estimativas indicam que o campo contém mais de 1 trilhão de pés cúbicos (cerca de 28,3 bilhões de metros cúbicos) de gás natural. Somados a isso, estudos da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês) estimam que as reservas de petróleo na região palestina somam cerca de 1,7 bilhão de barris.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas analisam se por trás da proposta do presidente dos EUA, Donald Trump, de transformar a Faixa de Gaza em uma riviera turística, estaria a ambição de acessar os recursos presentes na região.
Ualid Rabah, presidente da Federação Árabe Palestina (Fepal), afirma que a intervenção dos EUA na Palestina data de séculos, junto com os ingleses, com o objetivo de tornar a Palestina um país de ocidentais. Ele afirma que Israel, após sua criação, se tornou um "bunker" dos EUA no Oriente Médio, mas que agora Tel Aviv vive uma "crise existencial" e "precisa acelerar a limpeza étnica da Palestina".

"Isso não é pouca coisa. Se Israel hoje entrar em colapso, quer dizer que a presença estadunidense naquela região, privilegiada como é por meio do 'bunker Israel', entraria em colapso."

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Ele afirma que, somado a isso, o domínio estratégico da região traria de "gorjeta" duas reservas gasíferas, presentes na costa de Gaza, que têm riquezas estimadas de US$ 600 bilhões (cerca de R$ 3,5 trilhões) a um U$ 1 trilhão (cerca de R$ 5,8 trilhões), "mais do que o PIB da maioria dos países do mundo".
Rabah aponta ainda que, ao tentar tomar o controle de Gaza, os EUA buscam impedir que o Oriente Médio se alinhe "aos vencedores da luta geopolítica pós fim da Guerra Fria", que hoje compõem o BRICS, especialmente aos dois países mais importantes do grupo, que são Rússia e China. Ele frisa que potências do Oriente Médio, como Egito, Arábia Saudita, Irã e Emirados Árabes Unidos já integram o grupo, e está sendo analisada a entrada da Turquia.
"Isso tudo significa um desafio para os EUA. Os EUA estão tentando alterar essa realidade, tentando se afirmar num mundo que eles sabem que não poderá deixar de ser multilateral, mas precisam fixar a sua posição neste mundo multilateral. Quer dizer, eles vão admitir que há potências capazes de jogar em cenas importantes, rivalizando com os EUA, mas eles querem se afirmar neste mundo em que eles não serão a única hiperpotência", afirma.
Ele destaca que 151 países reconhecem a Palestina, e quase a totalidade das resoluções em prol da causa palestina que passam pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) tem quase a unanimidade de votos a favor, com exceção de EUA, Israel e "alguns micropaíses que, somados, têm um milhão de habitantes, portanto não representam nada".
"Então, não é exatamente uma comunidade internacional que não quer a [criação de um Estado da] Palestina, infelizmente, são os EUA, pelo uso da força, pelo uso do seu poderio econômico, pelo uso do seu poderio diplomático e pelo uso indevido e obsceno do veto na ONU."
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Ele frisa que a Palestina obteve reconhecimento internacional, passou a ter embaixada em mais de 150 países, a ter um assento na ONU, e presença em todo o sistema da organização, incluindo o Tribunal Penal Internacional (TPI) e a Corte Internacional de Justiça (CIJ).

"Isso tudo garante, por exemplo, que Israel esteja sendo julgado, embora a petição tenha sido da África do Sul, por crime de genocídio na Corte Internacional de Justiça. Mas também no TPI, que emitiu os mandatos de prisão contra [Benjamin] Netanyahu, quem apresentou as petições foi a autoridade palestina", afirma.

Tatiana Delgado, analista de relações internacionais, especialista em geopolítica e defesa, mestre e doutoranda em Estudos Estratégicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pesquisadora associada ao Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE), afirma que as reservas presentes na costa de Gaza obviamente trariam autonomia e voz ao povo palestino, caso eles conseguissem deter os direitos sobre essa exploração.

"O gás do [campo de Gaza] Marine gera um entrave ainda maior nessas relações, ele foi descoberto há 25 anos atrás e desde então não houve a permissão em nenhum dos projetos para exploração nesse campo dessas reservas, e elas acabam criando um incentivo econômico que intensifica disputas territoriais na região. Israel controla já o acesso marítimo ali na Faixa de Gaza e restringe a exploração palestina sempre com a alegação de preocupações de segurança, de que o Hamas poderia utilizar recursos para financiar fins militares", afirma.

Ela acrescenta que isso acaba reforçando a ocupação e marginaliza a possibilidade de autonomia palestina, "enquanto os atores externos como Egito, Jordânia, a própria União Europeia e os EUA parecem mais monitorar e observar as possíveis oportunidades energéticas da região".
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Delgado enfatiza que, nos últimos anos, Israel vem dobrando a sua cadeia de valor na exploração de gás produzido offshore na região e abastecendo tanto o mercado interno do país quanto exportando para o Egito e para a Jordânia.

"E seria conveniente então para Israel deter os direitos sobre essas reservas e, se caso a Palestina conseguisse então reverter essa situação, seria muito importante para o povo palestino e poderia, sim, modificar algumas dinâmicas tanto na região quanto internacionalmente", afirma a especialista.

No recorte dos EUA, ela afirma que Washington prioriza o gás de xisto presente em território estadunidense, e que o interesse estratégico no Oriente Médio está ligado a conter rivais, sobretudo China e Rússia.
"Gaza não seria propriamente o ponto central para a independência energética dos EUA, mas, obviamente, o potencial que existe lá pode ser parte de uma estratégia mais ampla de influência regional, especialmente para limitar essa expansão chinesa, principalmente infraestrutura crítica. E Gaza, sob o domínio israelense, ou melhor ainda, na visão do Trump, como uma riviera no Oriente Médio, seria extremamente favorável para conter as iniciativas chinesas e ainda fortalecer o corredor de gases [que abrange] Israel, Grécia e Chipre, que também é bastante benéfico para a União Europeia e, em consequência, também para os EUA, enfraquecendo a China."
Sobre o vídeo que recentemente causou controvérsia, por apresentar a Faixa de Gaza, com uso de inteligência artificial, como uma riviera, na qual aparecem Trump, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e Elon Musk, Delgado afirma que o vídeo parece mais uma prova de que Trump, nesse novo mandato, parece mais um joguete nas mãos de Musk.

"Porque aquele vídeo, completamente [feito por] inteligência artificial, foge até da ideia de riviera e me parece mais uma miragem, uma ideia completamente fantasiosa dos dois, até porque toda essa questão de insegurança na região afasta os investimentos internacionais. Mas não duvido que, no fundo, eles tenham, claro, essas intenções, mas aquilo foi um total deboche político, uma coisa que não se pode admitir e que também demonstra os perigos da própria inteligência artificial usados para esse tipo de questão na política", afirma a analista.

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