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O que importa para a defesa brasileira não é quanto se gasta, mas como, dizem analistas

© Foto / Divulgação / ExércitoMilitares do Exército Brasileiro perfilados durante celebrações do Dia do Soldado, em 25 de agosto de 2023
Militares do Exército Brasileiro perfilados durante celebrações do Dia do Soldado, em 25 de agosto de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 10.07.2025
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Especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil afirmam que atrelar investimento militar ao PIB não é a forma ideal de desenvolver um orçamento, destacando a necessidade de entender as carências das Forças Armadas.
A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) anunciou, no fim de junho, o compromisso dos países-membros de desembolsar ao menos 5% do produto interno bruto (PIB) em gastos militares anualmente — das 32 nações da aliança, apenas a Espanha não se comprometeu com a meta.
O objetivo ambicioso da OTAN, que via os aliados sofrendo para conseguir despender 2% do PIB em defesa anteriormente, levantou a discussão: o Brasil deve pensar em uma meta parecida com a da aliança militar?
Em entrevista à Sputnik Brasil, analistas acreditam que a grande questão não é quanto o Brasil deve atrelar do PIB à defesa, mas sim como desembolsar valores de maneira estrategicamente apropriada.
O pesquisador Jorge Oliveira Rodrigues, ligado ao Instituto Tricontinental de Pesquisa Social e ao Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (Gedes), explicou que os gastos militares devem ser feitos em um contexto que faça sentido com outras políticas públicas, para garantir "segurança e soberania" ao país, e não priorizados a ponto de favorecer a economia a partir da indústria bélica, por exemplo.

"A decisão, portanto, não pode se basear em supostos retornos que o investimento em defesa traria para a economia nacional. É uma decisão política, que, justamente por isso, não pode se restringir aos quartéis."

Segundo Rodrigues, atrelar os gastos em defesa ao PIB é um "erro de concepção grotesco" que "reflete o colonialismo epistêmico que grassa em nosso país, sendo inclusive fortemente presente" nas Forças Armadas do Brasil.

"Defesa não é receita de bolo, onde juntamos X% do PIB com um número Y de efetivos e temos como resultado uma política. Seguir o exemplo da OTAN como realidade absoluta é fruto de uma dificuldade em pensar a defesa brasileira a partir da nossa própria realidade."

Fabricio Ávila, presidente do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE), declarou que, atualmente, o gasto do Brasil em questões militares gira em torno de 1% do PIB — uma redução de cerca de 3 pontos percentuais desde o fim da década de 1950. Sendo assim, para o especialista seria exagero investir 5% do PIB do Brasil em defesa.
"Se a gente for gastar os 5% do PIB, cerca de R$ 100 bilhões, é um exagero na nossa realidade", comenta Ávila. "O gasto é relativo e tem que atender às necessidades de cada força armada."
Para o presidente do ISAPE, o ideal é que o Brasil invista pelo menos US$ 200 (cerca de R$ 1,1 mil) por habitante em defesa, patamar alcançado no início dos anos 2000, contra os US$ 100 (por volta de R$ 550) atuais. Embora o assunto do momento seja o quanto investir em artigos militares ou como remunerar tropas, a discussão para o especialista passa por essas instituições estarem prontas para lutar ou não quando solicitadas.
Nesta quinta-feira (10), a Câmara dos Deputados aprovou uma medida provisória (MP) que reajusta o salário-base de militares das Forças Armadas em 9%, incluindo ativa, reserva e pensionistas, informou o g1. A MP, agora, segue para o Senado, onde pode ganhar caráter definitivo.

"Geralmente as pessoas falam em orçamento militar e pensam muito na questão de salários, muito na questão de pensões, muito na questão de aprisionamento de recursos, e menos na prontidão. O grande problema das Forças Armadas modernas, não só as brasileiras, mas as do mundo inteiro, é a questão da prontidão. Ou seja, se elas estão prontas ou não para entrar em combate."

Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (à esquerda), em encontro com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, no Fórum Econômico Mundial, em Davos. Suíça, 21 de janeiro de 2020 - Sputnik Brasil, 1920, 30.06.2025
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Quem é o inimigo do Brasil?

Ao estabelecer uma meta de 5% do PIB para gastos militares, a OTAN faz uma declaração velada de que tem um inimigo a combater. Caso contrário, não faria sentido os Estados da aliança militar desembolsarem tamanho recurso em defesa.
Rodrigues ressalta que, antes de pensar em grandes gastos bélicos, é preciso responder: quem é o inimigo do Brasil? Como exemplo da importância de entender quem pode ser um rival brasileiro, o especialista cita a quase venda da Embraer para a Boeing, uma empresa norte-americana, e o risco de o país perder soberania em projetos militares importantes.

"Faz sentido investir em projetos como o KC-390, da Embraer, quando, há pouco tempo, a empresa esteve ameaçada de ser vendida à Boeing? Para que tal resposta seja apresentada, é preciso que o governo federal, o Congresso, a academia e a sociedade civil sentem à mesa para discutir."

Para Ávila, o aumento do orçamento militar da OTAN sinaliza a preparação para uma nova guerra, nomeada por ele como "convencional" e, em seguida, classificada como "preocupante".
"Esse aumento [de investimento] é preocupante, porque mostra que a Europa sobe o tom e já se prepara para o retorno da guerra convencional. Sem criar alarmismos, mas é algo muito preocupante."
Já Rodrigues alerta para o conceito do "dilema de segurança", que acontece quando o aumento de gastos militares de um país é percebido como fonte de ameaça por outro, ocasionando uma bola de neve em investimento militar regional.
Dessa forma, Rodrigues entende que faz muito mais sentido para o Brasil se aliar aos países da América do Sul e gastar em uma "estrutura de segurança coletiva", mas sem seguir o modelo da OTAN.

"Isso não quer dizer que a saída é uma aliança militar sul-americana, aos moldes da OTAN, mas sim a construção de um arcabouço de confiança mútua onde os vizinhos e demais parceiros não fossem encarados como ameaças e, em conjunto, pudessem apresentar suficiente potencial dissuasório a ponto de mitigar ameaças externas."

Ávila destaca que há paz na América do Sul desde a Guerra do Paraguai e não vê nenhum tipo de conflito iminente na região. Ainda assim, entende que há uma questão coletiva nos países do continente sobre qual deve ser o investimento militar.

"Talvez seja um grande dilema das Forças Armadas brasileiras, argentinas, entre outras, que é justamente no que investir, onde investir e qual vai ser o melhor investimento. […] Todo mundo compara forças armadas a um seguro. E seguro, geralmente, ele é caro pensando em nunca usar."

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