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'Bandido bom é bandido morto' x 'Combater não é matar': o tiro de largada das eleições de 2026

© Tânia Rêgo/Agência BrasilMoradores em meio a carros incendiados um dia após a megaoperação das polícias Militar e Civil que provocou mais de 120 mortes nos complexos da Penha e do Alemão. Rio de Janeiro (RJ), 29 de outubro de 2025
Moradores em meio a carros incendiados um dia após a megaoperação das polícias Militar e Civil que provocou mais de 120 mortes nos complexos da Penha e do Alemão. Rio de Janeiro (RJ), 29 de outubro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 05.11.2025
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Com um saldo de uma centena de mortos, a megaoperação policial nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro (RJ), na última terça-feira (28), causou uma reviravolta na agenda eleitoral do país.
Após repercussões positivas da atuação policial entre a opinião pública, aumentou a popularidade do governador do estado, Cláudio Castro (PL), que ainda recebeu apoio de outros governadores de oposição, como Ratinho Junior (PSD-PR), Romeu Zema (Novo-MG), Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e Ronaldo Caiado (União-GO). Todos são nomes cogitados para disputar as eleições contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2026.
Castro, que até então deixaria o governo no fim de 2026, sem perspectiva de cargos, agora almeja o Senado e deu musculatura para a bancada da bala tentar uma candidatura própria ao Executivo fluminense.
Um dia depois da megaoperação, o governo federal gastou cerca de R$ 1 milhão para impulsionar seis posts nas redes sociais sobre segurança pública, defendendo o uso da inteligência e condenando ações em comunidades.
Entretanto, pesquisas divulgadas nesta semana revelaram que a maioria da população do estado do Rio aprovou a iniciativa, pautada pela lógica eternizada na expressão "Bandido bom é bandido morto". A ação mais letal da história do país foi positiva para 64% dos entrevistados, segundo pesquisa da Quaest divulgada no domingo (2).
Em entrevista à Sputnik Brasil, a cientista política Clarisse Gurgel, professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), frisou que operações como essa ocorrem cotidianamente como forma específica de organizar a sociedade e revitalizar a popularidade de governantes.
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"Quando Cláudio Castro opera, ele está valorizando vários dos ativos envolvidos em seu projeto de poder, e tudo vira mercadoria: matar tem valor de troca; rende votos; produz diversos especialistas em segurança; acentua a separação entre os que estão no centro e os que estão na margem com sua indústria da repressão."

A cientista política destacou a oferta cada vez mais escassa de trabalho como um dos principais fatores do conflito urbano, estimulado pela "imensa concentração de riqueza" e pela "sociedade de consumo". O que é tratado como desordem social, ponderou, na verdade faz parte da ordem: "Isso explica uma operação que elimina pobres ser vista por muitos como política pública".
Para a especialista, o maior desafio dos chamados partidos progressistas é recuperar os territórios populares com trabalho cotidiano e organicidade:

"Esses espaços estão ocupados pelos poderosos, pelos que querem apenas lucro", comentou. "O que a esquerda precisa é disputar essa capacidade de organização cotidiana, aparentemente inexistente, mas que existe porque não há vazio na política", afirmou.

Professor de ciência política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jorge Chaloub também pontuou, em conversa com a Sputnik Brasil, o sucesso internacional desse modelo de segurança pública:
"É um caminho para você mobilizar popularmente a direita e algo que enquadra a esquerda não apenas no Brasil, mas no mundo. Por outro lado, a esquerda quer trazer uma narrativa de que ela também combate, que combater não é matar."
O especialista realçou que a ação violenta do Estado em território periférico é parte da história da fundação do Brasil. A novidade, na sua avaliação, é o "elogio da morte" por autoridades políticas da história recente, como o ex-governador do RJ Wilson Witzel, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e, agora, Castro.

"Não é que as mortes sejam efeitos colaterais de alguma forma necessários. Tem quase uma ideia de que a morte é boa por si, porque se faz a faxina. E isso, com esse grau, com essa dimensão tão explícita, me parece novo. […] Esse discurso sai um pouco da margem e passa para o centro, para governadores, presidentes. Não é o deputado estranho que quer propor a pena de morte. É o presidente do Brasil, é o governador do Rio de Janeiro. Isso é novo."

Sobre as recentes pesquisas de opinião, Chaloub alertou sobre o risco de interpretá-las "no calor da hora":
"Tendem a ser muito mobilizadas pelas personalidades do debate. Acho que as pessoas estão tratando esses dados como muito objetivos", comentou, pontuando que a análise dos resultados deve atentar para os números, sobretudo as pesquisas por telefone.
Também em entrevista à Sputnik Brasil, Josué Medeiros, cientista político, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Observatório Político e Eleitoral (Opel), avaliou que as pesquisas sobre a megaoperação sugerem que há espaço para uma disputa de projetos sobre segurança pública. Ele deu como exemplo o fato de a maioria das mulheres entrevistadas ter sido contra a operação.
"A clivagem de gênero importa muito, com as mulheres rejeitando a violência da operação enquanto os homens apoiam."

"É possível construir até as eleições não apenas um discurso, mas uma ação concreta da esquerda nesse tema, baseada em inteligência e com o objetivo de golpear os fluxos de financiamento do crime organizado, segmentos que estão operando no mercado financeiro e lucrando com o tráfico de armas e drogas sem nunca ter pisado em uma favela", prosseguiu.

Assim como Chaloub, Medeiros chamou a atenção para o fato de a extrema-direita em todo o mundo se unificar em torno da pauta da segurança com viés punitivista.
Na opinião de Medeiros, a democracia em toda a região latino-americana sofrerá ameaças consistentes nos próximos anos, com enfoque na segurança pública pela via da violência e repressão.
"É preciso que os governos progressistas avancem em uma resposta concreta e eficaz, baseada em inteligência, golpes contra os cabeças das facções e uma política de segurança mais comunitária e efetiva no dia a dia do cidadão", defendeu.
No caso brasileiro, o coordenador do Opel defendeu uma política coordenada para diminuir a indignação da população com abusos e violações cometidos por criminosos:

"O sentimento de uma trabalhadora ou trabalhador quando tem seu celular roubado, muitas vezes ainda sendo pago em várias prestações, é de indignação justificada e nada tem a ver com um punitivismo da extrema-direita, mas pode ser capturado pelos projetos fascistas. O governo federal precisa agir sobre isso."

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