- Sputnik Brasil, 1920
Panorama internacional
Notícias sobre eventos de todo o mundo. Siga informado sobre tudo o que se passa em diferentes regiões do planeta.

Análise: ausência de clareza impede Brasil de consolidar seu entorno estratégico

© AP Photo / Andre PennerO presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, durante evento na COP30, em Belém (PA), em novembro de 2025
O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, durante evento na COP30, em Belém (PA), em novembro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 20.11.2025
Nos siga no
Especiais
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, Augusto Teixeira Júnior explica o conceito, principais desafios para se tornar influente perante vizinhos e região e como atuação militar dos Estados Unidos na área pode impactar plano de defesa brasileiro.
A segunda metade do século XX foi marcada pela polarização mundial entre Estados Unidos e União Soviética. As duas principais potências à época atuavam com grande ímpeto na política externa para garantir áreas de influência e, assim, angariar aliados ao redor do mundo.
Algumas décadas se passaram desde o fim deste período emblemático da história contemporânea, mas o trabalho de países para construir uma rede de aliados continua. Porém, diferente dos anos 1900, não existem apenas duas potências dividindo o globo, e sim diversos personagens atuando em escalas distintas.
Dentro deste jogo, o Brasil não fica de fora. Desde 2008, documentos de órgãos ligados à defesa nacional estabelecem a importância da atuação em um entorno estratégico, que atravessaria toda América do Sul, o Caribe e chegaria à parte ocidental do continente africano.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, o professor de relações internacionais da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Augusto Teixeira Júnior explica que este conceito não é novidade na política de defesa brasileira e se inspira em geopolíticos como Golbery do Couto e Silva, que citavam a importância da área de influência além da Bacia da Prata.
O especialista é categórico ao afirmar que o tema do entorno estratégico não deveria ser aplicado somente na área da defesa, mas também nos campos econômico, comercial e diplomático.
O especialista também destaca a importância de fazer esta ideia sair do papel para não ser uma eterna teoria. "Uma coisa é você ter as ideias estratégicas postuladas nos documentos, outra são as políticas realizadas, inclusive a própria política externa, reverberando esse entendimento geopolítico."

"Porque, para o Brasil, no mundo em transformação, em que a gente assiste à rápida configuração de uma multipolaridade, [...] o entorno estratégico brasileiro é o nosso horizonte necessário em relação à construção de futuro."

O especialista acredita que o Brasil tem questões no campo da defesa que deveriam ser alvos de debate público. Ele cita, por exemplo, a falta de clareza de governos federais brasileiros sobre os objetivos nacionais e, consequentemente, onde a defesa está inserida nisso. Outro ponto, para ele, é a presença de ministros que não são devidamente capacitados para aturem nos seus cargos por não ter pleno conhecimento da pasta.
Teixeira Júnior conta que há um entendimento entre pesquisadores sobre uma negligência civil em assuntos de defesa do Brasil, recaindo toda a responsabilidade e atribuições nas mãos de militares.

"Temos, em grande parte, o segmento organizado para pensar defesa como sendo os militares. Eles, em geral, têm as suas prioridades, os seus interesses, como qualquer burocracia organizada. E, assim, postulam. Nesse sentido, temos uma desconexão entre aquilo que as três forças querem. O Ministério da Defesa é relativamente frágil naquilo que deveria ser forte para gerar uma convergência entre essas três burocracias densas e com identidade própria, com objetivos políticos estipulados pelo governo, que, em geral, não estão claros."

O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva dá entrevista coletiva em sua residência oficial, Palácio da Alvorada, em Brasília, Brasil, 22 de julho de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 09.11.2025
Notícias do Brasil
Lula cobra integração regional e cita 'ameaça de uso da força militar' na América Latina

O perigo do descontrole na zona de interesse

A dimensão continental do Brasil, além da importância econômica, tornam o país o principal expoente da América do Sul, disputando com o México o título de nação mais influente da América Latina. Estas designações, porém, não garantem à Brasília o posto de guardião da região.
Nas últimas semanas, os Estados Unidos iniciaram uma série de ataques contra embarcações que supostamente transportam drogas no mar do Caribe e no Pacífico. Recentemente, as autoridades militares do país oficializaram a ofensiva, nomeada de missão Lança Austral, com pouquíssimas declarações do governo brasileiro acerca destes eventos.
Opositora dos Estados Unidos, a Venezuela é um dos países que mais se preocupam com o deslocamento de tropas norte-americanas para a região. Em uma eventual invasão de Washington ao território de Caracas, um dos principais impactados é o Brasil, explica Teixeira Junior.
"Em primeiro caso, uma operação afeta a perspectiva daquilo que o Brasil entende como sendo a sua área de influência, a área de interesse imediata, objeto de um conflito armado, algo que é um problema gigantesco. O que também seria se, por exemplo, a Venezuela invadisse a Guiana para tomar a região do Essequibo. Imagina no contexto de um cenário realizando em que os Estados Unidos fazem uma operação de invasão contra a Venezuela, especialmente com tropas em solo."
Ele também cita como possíveis dificuldades uma crise de refugiados venezuelanos em estados próximos ao território do país, como Roraima, além de grupos criminosos venezuelanos em busca de um novo mercado ou até núcleos de resistência armada para lutar contra as tropas norte-americanas.
Essa atenção de Donald Trump para a América Latina, em especial a região do Caribe, não é de hoje. Segundo o especialista, houve um fortalecimento do Comando Sul dos Estados Unidos, responsável pelos interesses norte-americanos na região, desde o primeiro mandato.
"E agora, nesse contexto da segunda administração Trump, nós vemos com muita clareza que os Estados Unidos perceberam que a ausência de uma estratégia unificada para lidar com a América Latina e Caribe, que sempre foi vista como quintal, como área de retaguarda, como área distante dos grandes polos de tensão internacional, agora é objeto de assédio, na perspectiva de que eles entendem que precisam retomar espaços que eles entendem como perdidos para a China."
Teixeira Junior explica que o Brasil é considerado um chamado global swing state, ou seja, um país que não está nem necessariamente do lado dos Estados Unidos, nem necessariamente do lado da China.

"Dependendo de para onde o Brasil caminhe, ele pode afetar o equilíbrio de poder dentro desses grandes alinhamentos. É por isso que a América Latina e Caribe, especificamente o nosso entorno estratégico, se torna um palco de disputa [global]."

Logo da emissora Sputnik - Sputnik Brasil
Acompanhe as notícias que a grande mídia não mostra!

Siga a Sputnik Brasil e tenha acesso a conteúdos exclusivos no nosso canal no Telegram.

Já que a Sputnik está bloqueada em alguns países, por aqui você consegue baixar o nosso aplicativo para celular (somente para Android).

Feed de notícias
0
Para participar da discussão
inicie sessão ou cadastre-se
loader
Bate-papos
Заголовок открываемого материала