O acordo, assinado durante as negociações bilaterais entre o presidente russo, Vladimir Putin, e o premiê indiano, Narendra Modi, que foram antecedidas por conversações duras com os EUA. Em setembro, Nova Deli foi inclusive visitada pelo secretário de Estado Mike Pompeo que, porém, não conseguiu que o país descartasse o contrato com a Rússia.
A Índia acredita que a compra dos S-400 os vai os ajudar a manter o balanço de forças com a China, que já comprou esses sistemas de defesa antiaérea, bem como influirá nas relações com outro país vizinho, o Paquistão.
Aliás, para preservar suas posições na região, Nova Deli também alocará 100 bilhões de dólares ao rearmamento do exército. Uma grande parcela desta soma irá para a Rússia, pois embora os EUA estejam aumentando suas exportações bélicas para o país, não têm análogos ao S-400, escreve o jornalista. Além disso, os norte-americanos não estão dispostos a partilhar grande parte das suas tecnologias militares com os indianos.
"Nova Deli está ciente que pode acabar sendo alvo de sanções, mas está preparada para tais riscos. Os cálculos se baseiam em sólidos argumentos geopolíticos. Durante o governo de Trump, Washington se afastou bruscamente tanto da China quanto de seu aliado na Ásia do Sul, o Paquistão. Os norte-americanos não têm outros aliados senão Nova Deli na região. Por isso os indianos estão seguros que a Casa Branca não se atreverá a introduzir sanções", escreve Gashkov.
Ao mesmo tempo, é pouco provável que a Casa Branca fique satisfeita com a recente celebração do acordo russo-indiano, pois já introduziu sanções contra Pequim por cooperar com a Rússia no campo militar.
"Fazer o mesmo com os indianos significaria se afastar de mais um país. Já não o fazer significaria demonstrar fragilidade política e o caráter condicional das sanções anunciadas", reflete o colunista.
Entretanto, existe uma "escapatória" para sair deste impasse, pois formalmente a Índia realmente "reduziu as compras de armas da Rússia", o que, porém, é algo bem formal, pois 40% das importações neste campo continuam cabendo à produção russa.
O autor relembra que os contratos militares celebrados ainda na época soviética continuam a ser úteis a Moscou — Nova Deli tem em serviço aviões MiG e Su, tanques T-72 e T-90, bem como um submarino atômico russo. Além do mais, as recentes negociações resultaram em novas compras — desta vez de navios de guerra no valor total de 2,2 bilhões de dólares.
O principal foco das conversações entre Putin e Modi teve a ver com a possível criação de um sistema de pagamentos que permita efetuar transações sem usar o dólar, pois tal tecnologia reduziria a zero as sanções extraterritoriais norte-americanas. Esses dois países não são os únicos que manifestam apoio à iniciativa — entre outros, esse desejo também é manifestado por políticos europeus e pelas autoridades chinesas. Mas para aprender a viver sem a moeda norte-americana, a comunidade internacional vai precisar de algum tempo, adverte o autor.
"Enquanto as tecnologias alternativas não estiverem difundidas, Nova Deli espera pela reação de Washington em relação ao contrato [com a Rússia]. Não há unanimidade nas elites norte-americanas. A Casa Branca está inclinada a fechar os olhos à violação Indiana do regime de sanções. Entretanto, o Congresso, onde a retórica é liderada pelos republicanos com visão antirrussa, pode exigir que seja observada formalmente a lei CAATSA [Lei de Contenção de Adversários da América Através de Sanções]", argumenta Gashkov.
Os especialistas consultados pelo autor do texto também acreditam que a Índia dificilmente se deparará com medidas restritivas.
A mesma opinião foi manifestada pelo pesquisador do Instituto de Economia e Relações Internacionais da Academia de Ciências da Rússia, Aleksei Kupriyanov.
"A atual administração norte-americana não está interessada no agravamento das relações com a Índia, considerando Nova Deli como um aliado potencial na confrontação com Pequim […] É pouco provável que devamos esperar pelas sanções norte-americanas devido ao recente contrato, enquanto as possíveis restrições na sequência de contratos futuros vão depender do desenvolvimento da situação política interna nos EUA e de sua dinâmica no relacionamento com a China", resumiu.