Nesta terça-feira (22), os presidentes da Rússia e da Turquia se reuniram para negociações no balneário russo de Sochi. Na agenda, a ofensiva militar turca no nordeste da Síria. Após mais de sete horas de negociações, os líderes assinaram um memorando de entendimento.
O presidente Vladimir Putin disse que a Rússia compreende as razões que levaram a Turquia a realizar a ofensiva militar, mas alerta que ela não deve ser realizada em detrimento da integridade territorial síria ou beneficiar terroristas.
Putin reiterou a posição de Moscou de que a Síria deve ser liberada de toda "presença militar ilegal" em seu território.
Ministério da Defesa da Turquia: não haverá nova ofensiva
Após as negociações entre Putin e Erdogan, o Ministério da Defesa da Turquia anunciou que não haverá nova operação contra as milícias curdas na Síria.
De acordo com o Ministério "não há necessidade" de uma nova ofensiva "neste estágio", uma vez que o "corredor de paz" na zona de fronteira irá garantir o retorno de milhões de refugiados à Síria.
Turquia e Rússia selam acordo
O acordo prevê que as milícias curdas – o principal alvo das operações turcas – irão se afastar a uma distância mínima de 30 km da fronteira com a Turquia.
A operação turca, por sua vez, irá continuar somente entre as localidades de Tel Abyad e Ras al-Ain, entrando no máximo uma profundidade de 32 km no território sírio.
Exército sírio na fronteiras
As demais regiões fronteiriças da Síria – de Kobane a Tel Abyad, e de Ras al-Ain até à fronteira com o Iraque - serão controladas pelo Exército da Síria, com apoio das forças russas.
Patrulhas russo-turcas na fronteira
Paralelamente, as áreas não atingidas pela operação turca serão patrulhadas em conjunto pela Turquia e Rússia, a uma profundidade máxima de 10 km no território sírio.
Prisioneiros de organizações terroristas
Um tema sensível das negociações foram os inúmeros prisioneiros do Daesh (organização terrorista proibida na Rússia e demais países) mantidos em prisões e campos no nordeste da Síria.
Putin insistiu que o caos gerado pela ofensiva turca não pode permitir que esses prisioneiros escapem.
"É importante que os membros de organizações terroristas, incluindo o Daesh, cujos militantes estão sendo mantidos prisioneiros por grupos armados curdos, não se aproveitem das ações das Forças Armadas da Turquia", ressaltou o presidente russo.
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, por sua vez, advertiu que aqueles que criaram e mantêm as prisões devem compreender a sua "responsabilidade" pela prevenção de fugas.
Revitalizando os Acordos de Adana de 1998
Ambos os países reiteraram a importância de revitalizar o Acordo de Adana, um pacto de segurança firmado entre a Turquia e a Síria em 1998.
O acordo permite incursões militares turcas na região fronteiriça, enquanto Damasco se comprometeu a não abrigar membros do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) em seu território. Ancara considera o PKK uma organização terrorista.
Apesar da significativa deterioração das relações diplomáticas entre a Síria e a Turquia nesses oito anos de conflito, o acordo nunca foi denunciado. Moscou prometeu fornecer apoio para que o documento seja implementado, de acordo com a "realidade contemporânea".
O PKK luta há décadas pela criação de um Estado independente curdo, em algumas regiões do atual território da Turquia. A Turquia acusa as milícias curdas sírias de apoiarem o PKK. Apesar de bandeiras do PKK serem frequentemente hasteadas pelas milícias curdas da Síria, não é possível estabelecer o nível exato de relacionamento entre os dois movimentos.
Posição americana na Síria é muito 'variável e contraditória' para ser considerada
O memorando assinado entre a Turquia e a Rússia trata dos mesmos temas e das mesmas regiões geográficas que o acordo entre Turquia e Estados Unidos, firmado há cinco dias pelo vice-presidente dos EUA, Mike Pence, e o presidente da Turquia, em Ancara.
No entanto, o "cessar-fogo" acordado entre Washington e Ancara foi criticado ontem durante as negociações.
"Não estamos olhando para os Estados Unidos e para a sua posição. A posição [norte-americana] é demasiado variável e contraditória, e obviamente a coalizão liderada pelos Estados Unidos está em território sírio ilegalmente, como é sabido", declarou o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, aos repórteres.
Damasco endossa as negociações
Após a reunião com Erdogan, o presidente da Rússia falou com o seu homólogo sírio, Bashar Assad, de acordo com o porta voz do Kremlin, Dmitry Peskov.
Assad endossou o memorando e declarou que os guardas de fronteiras sírios estão prontos para cooperar com as forças russas.
Ofensiva turca na Síria
No dia 9 de outubro, o nordeste sírio foi invadido pelas Forças Armadas da Turquia. A operação teve como alvo as milícias curdas que atuam em território sírio, que Ancara considera "terroristas".
A ofensiva foi iniciada dois dias após Donald Trump ter anunciado a retirada das tropas norte-americanas do nordeste da Síria.
Na semana passada, os EUA e a Turquia acordaram um cessar-fogo de cinco dias, que expirou às 22h00 do horário local (16h00 do horário de Brasília) da terça-feira (22).
Ancara havia declarado estar pronta para retomar a operação, caso os norte-americanos não cumprissem com o prometido e garantissem a retirada das milícias curdas para 30 km de distância da fronteira turca.
Moscou incitou repetidamente a Turquia a restringir as suas atividades na fronteira turca e respeitar a integridade territorial da Síria.