Desde o início do ano, o dólar já se desvalorizou em mais de um real. Do patamar de R$ 5,70, a moeda americana caiu para a casa dos R$ 4,60. Nesta segunda-feira (4), o ativo estava cotado em R$ 4,62 até às 15h45 da tarde, no horário de Brasília.
Entre os diversos impactos na economia, um dos mais relevantes é no preço dos combustíveis. Isso porque a Petrobras adota a política de preços internacionais, condicionando o custo do petróleo brasileiro ao dólar.
Assim, a desvalorização do dólar frente ao real aparece como uma esperança para aliviar o bolso dos brasileiros.
Mas a valorização da moeda nacional, de fato, será suficiente para amenizar os efeitos da dolarização nos preços dos combustíveis?
Especialistas consultados pela Sputnik Brasil são reticentes quanto a eventuais benefícios à população e apontam que há fatores além do dólar que entram na conta.
Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, acredita que a desvalorização da moeda americana terá poucos efeitos sobre a gasolina comprada pelo consumidor final. Segundo ela, outros custos no produto final impedem uma redução drástica nos preços.
"Com o real mais valorizado, o custo para comprar petróleo refinado do exterior e comercializar aqui fica um pouco mais baixo. Mas não é só o custo internacional que impacta", disse Inhasz.
Logo da estatal Petrobras na Refinaria Alberto Pasqualini em Canoas, Rio Grande do Sul, 25 de outubro de 2021
© REUTERS / DIEGO VARA
A especialista afirma que quase 40% do preço do combustível corresponde ao custo que a Petrobras tem na produção. Além disso, ela ressalta que 35% do que o consumidor paga pela gasolina são de impostos.
"[A queda do dólar] ameniza uma parte desse custo, mas existem outros tantos componentes, como o etanol na composição da gasolina, que continua em alta. Por isso, uma eventual queda de preço de combustível pode não ser do jeito que a população de fato imagina", alertou.
A professora do Insper avalia que uma "desdolarização" da cotação não seria o melhor caminho. Para ela, esta seria uma solução de curto prazo e "pouco efetiva e sustentável" ao longo do tempo.
"A Petrobras vai continuar recebendo combustível mais caro, de acordo com a cotação de dólar e do barril de petróleo, o que vai impactar os custos de produção. Isso criará déficits e prejuízos financeiros no médio e longo prazo para a Petrobras, e o consumidor em algum momento pagará por isso", disse ela.
A Petrobras passou a adotar a política do preço de paridade de importação (PPI) em 2016, na gestão de Pedro Parente, no governo de Michel Temer.
Atualmente, a presidência da companhia está vaga desde a semana passada, com a saída do general da reserva Joaquim Silva e Luna, demitido após o presidente Jair Bolsonaro (PL) revelar publicamente seu incômodo com os preços dos combustíveis no país.
Seu antecessor, o economista Roberto Castello Branco, também sofreu pressão do governo federal por conta da política de preços da estatal.
Maior produção nacional
Afinal, existe alguma maneira do nosso combustível não depender das oscilações externas?
O economista Sérgio Caldas, professor da FGV da PUC-Rio, indica que a saída é investir no refino e na exploração de novos campos de petróleo com características que atendam ao vácuo existente na produção interna.
"Há características do óleo que hoje só são atendidas via importação", destacou o economista.
O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, anunciou que o Brasil deverá aumentar a produção de petróleo, em 2022, em cerca de 300 mil barris por dia, correspondendo a um incremento de 10% da produção nacional, conforme noticiou a revista Exame, em 23 de março.
O órgão projeta que o país deve ter um crescimento de 70% em sua produção na próxima década, ultrapassando a marca de cinco milhões de barris por dia em 2030. Atualmente, o Brasil tem capacidade de extração de três milhões de barris diários.
Em Brasília, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, participa de evento ao lado do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, em 28 de setembro de 2020
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Para Caldas, a notícia é boa para os brasileiros, que, com a maior oferta de petróleo, poderão comprar gasolina mais barata no futuro.
Já a economista Juliana Inhasz não projeta um cenário muito otimista. Para a especialista, o aumento de produção não será capaz de reduzir o custo do barril de petróleo internacional. Consequentemente, segundo ela, o preço final dos derivados não sofreria alterações.
"Não vamos conseguir produção de forma tão intensa a ponto de impactar o mercado internacional. Nosso impacto no preço do barril seria pequeno."
A professora lembra ainda que o petróleo produzido pelo Brasil precisa de uma técnica específica de refino, o que já encarece o processo.
"É mais difícil de se refinar. Então, o custo de refino é maior. Vamos produzir mais petróleo que pede essa maior intervenção para se tornar derivado", disse.