Eleições 2022

Brasil com Lula vai priorizar relações com América do Sul, África e BRICS, dizem analistas

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições do último domingo (30) deve promover uma guinada na política externa brasileira e pode reaproximar o Brasil dos países da América Latina e abrir caminho para a retomada do protagonismo brasileiro em assuntos ambientais, segundo especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil.
Sputnik
Mesmo antes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cravar a vitória definitiva de Lula sobre o atual presidente, Jair Bolsonaro, lideranças latino-americanas celebravam a dianteira do petista na apuração, após o instituto Datafolha projetar que o cômputo terminaria com uma recondução do petista ao Palácio do Planalto.
O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, e a vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, estão entre os que se anteciparam e comemoraram logo após Lula tomar a frente na apuração. Posteriormente, presidentes de México, Chile, Bolívia, Cuba e Venezuela começaram a celebrar o triunfo do presidente eleito.
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O respaldo internacional de Lula ficou evidente com o pronto reconhecimento por lideranças da região e de países como China, França, Canadá, Estados Unidos, Alemanha, Portugal e Espanha.
Em seu primeiro discurso após a vitória, Lula falou sobre seus planos para a política externa brasileira.

"O mundo sente saudades do Brasil. Aquele país soberano que falava de igual para igual com os países mais ricos e poderosos e que, ao mesmo tempo, contribuía para o desenvolvimento dos países mais pobres. O Brasil que apoiou o desenvolvimento dos países africanos, que trabalhou pela integração da América Latina, da América do Sul e do Caribe, que fortaleceu o Mercosul e ajudou a criar o G20, a Unasul [União de Nações Sul-Americanas], a CELAC [Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos] e o BRICS. Hoje nós estamos dizendo ao mundo que o Brasil está de volta, que o Brasil é grande demais para ser relegado ao triste papel de pária do mundo."

O foco na América Latina e nos processos de integração regional fica evidente no discurso de Lula. Para Ana Garcia, professora de relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e diretora do BRICS Policy Center, esse será o ponto central da agenda do novo governo.

"Este mandato de Lula vai ser uma reconstituição da integração regional, não tenho nenhuma dúvida disso", aponta Garcia.

"O Brasil vai agora, com o Lula assumindo o poder, se virar à integração regional. Então, agora, a probabilidade maior é o Brasil entrar em relações mais incisivas com o Mercosul, em primeiro lugar, e com os demais países da América do Sul, em segundo lugar. A África vai ficar em terceiro lugar", explicou a especialista.
Para Garcia, a prioridade dada ao BRICS vem logo na sequência. "O BRICS vem depois, com uma agenda muito forte de reconstrução da relação com a China", diz a professora da PUC-Rio, que acredita que o Brasil tem potencial de se colocar como mediador do conflito entre Ucrânia e Rússia a partir da articulação do BRICS.
Garcia inclusive descarta, em parte, a tese de isolamento internacional do Brasil com Bolsonaro, destacando que a relação com o BRICS não foi abalada no período. A pesquisadora, no entanto, reconhece que houve uma perda de protagonismo em algumas agendas, principalmente a ambiental.
"Lula vai poder — e a tendência é essa — reconstruir a imagem do Brasil na agenda do meio ambiente internacional, particularmente nas negociações internacionais de clima. Lula vai ter uma capacidade de retomar essa agenda muito maior."
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Paulo Velasco, professor de relações internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), concorda que a integração regional será um dos pontos principais da agenda internacional de Lula. Segundo o especialista, durante o governo Bolsonaro o país atuou como um "coadjuvante" na América Latina.

"O Brasil tende a buscar recuperar sua projeção internacional, e a região vai ganhar muita importância. Com Bolsonaro, o Brasil prestou muito pouca atenção no seu entorno regional. A relação com a Argentina, especialmente na era Fernández, se deteriorou de maneira brutal. O Mercosul também viveu um período de relativa estagnação, muito focado só em uma agenda comercial; perdeu muito de seu vigor. E, no resto da região, o Brasil passou a atuar como um coadjuvante, o que é muito estranho", afirma Velasco.

"Espera-se que o Brasil olhe mais para a região, que passe a atuar de maneira mais enfática nos temas regionais, como a crise da Venezuela. O Brasil tem muito a contribuir para o desenvolvimento da América do Sul, da América Latina", completou.
Velasco avalia que o BRICS vai ser muito importante na agenda internacional de Lula, assim como outros mecanismos de cooperação Sul–Sul. O especialista destaca que o novo governo deve buscar uma relação com a China "sem mesquinharia ideológica", após os atritos do bolsonarismo com o país asiático, e enxerga uma manutenção da postura que o Brasil tem com relação à Rússia.
"A Rússia é um país em que se pode dizer que há uma coincidência de agendas entre Bolsonaro e Lula. [...] O Brasil tende a manter sua postura de distanciamento [do conflito da Ucrânia], defendendo uma solução negociada", aponta.
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