Panorama internacional

Rússia e América Latina: parceria na construção de um mundo multipolar

Atualmente há um grande número de países empreendendo esforços para a construção de um mundo multipolar, dentre eles os países latino-americanos e a Rússia. Este, por um lado, é o resultado das ações erráticas do Ocidente, que destruiu por completo a confiança nos princípios e nas normas do convívio internacional.
Sputnik
Com isso, tem crescido também o número de países que optaram por seguir uma política externa independente, a exemplo da Rússia, em contraposição ao totalitarismo político do "eixo autoritário" mundial representado pelos países ocidentais e capitaneado pelos Estados Unidos.
Diante desse contexto, regiões como a América Latina, que sempre foi vítima de golpes de Estado no passado e de interferências do Ocidente em seus negócios domésticos, sabem que já não podem se sentir seguras diante do atual estado das coisas.
Hoje, o nível de confiança da "maioria global" no Ocidente foi reduzido significativamente, em função das crises no Leste Europeu e no Oriente Médio, que lançaram luz à verdadeira face "anti-humanista" de europeus e de norte-americanos.
Ao mesmo tempo, blocos militares como a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) prometem ampliar sua presença na Ásia, aumentando as tensões com a China e demonstrando indícios de que estão prontos para iniciar mais uma guerra agressiva, a fim de enfraquecer um adversário geopolítico.
Autoridades da Rússia e do Brasil dialogam durante encontro no Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPIEF, na sigla em inglês). Rússia, 14 de junho de 2023
Ao assistir a toda essa loucura, a América Latina tem preferido estabelecer alianças estratégicas extrarregionais com países como a China e a Rússia que, contrariamente ao Ocidente, defendem a "democratização das relações internacionais".
Apesar de não serem pautadas por proximidade geográfica ou cultural, as relações da América Latina com Moscou se refletem em sua proximidade de princípios e de valores comuns em política externa.
Esta, aliás, tem sido uma das principais marcas dessa nova ordem global, na qual a cooperação inter-regional funciona como eixo de contestação ao hegemonismo do "eixo autoritário" ocidental. Em síntese, esse processo demonstra a oposição da "maioria global" de um lado e do Ocidente do outro, oposição que tende a se fortalecer pelos próximos anos.
Ainda que, por enquanto, o chamado Ocidente coletivo mantenha grande influência em instituições-chave da governança global, essa dominância vem paulatinamente se degradando com o tempo. Novos centros de poder como Índia e China, por exemplo, já apresentam economias cujo peso pode ser colocado a par com a das principais potências ocidentais, dando uma cara mais asiática para a geopolítica do século XXI.
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, e o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, participam de uma reunião em Moscou. Rússia, 11 de novembro de 2023
Afinal, a tendência é de que o Oriente continue a se fortalecer enquanto o Ocidente enfraquece cada vez mais e de forma óbvia, uma vez que já não consegue angariar o apoio da opinião pública mundial para suas empreitadas.
É nesse contexto que a Rússia de Putin, além de reivindicar uma liderança conjunta com o Sul Global, incluindo a América Latina, tem trabalhado para defender a formação de um mundo multipolar baseado na pluralidade de valores e de civilizações.
Em vista disso, o Ocidente não é mais capaz de estabelecer padrões e de ditar regras de conduta aos demais países, sobretudo em vista de seu apoio criminoso às hostilidades, hoje em curso no Leste Europeu e na Faixa de Gaza.
Vemos que, ao ser deixada nas mãos do Ocidente, a ordem internacional dos últimos anos essencialmente se tornou muito menos segura para um grande número de povos ao redor do mundo; hoje, em especial, para os palestinos.
Contudo, a oposição atual entre o Ocidente coletivo e a "maioria global", capitaneado pela Rússia, representa um sinal de que as coisas estão mudando, e mudando de forma muito mais rápida do que se imaginava.
Nas próximas décadas, por exemplo, a tendência é de que a América Latina faça parte ativamente da consolidação de um mundo multipolar, em cooperação com importantes centros de poder como Moscou e Pequim.
Ministro das Relações Exteriores da Bolívia, Rogelio Mayta, e o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, participam de uma entrevista coletiva conjunta após sua reunião em Moscou. Rússia, 22 de outubro de 2021
Isso porque o papel da Organização das Nações Unidas (ONU) e de outras instituições internacionais dominadas pelo Ocidente se mostrou ineficaz em deter o sofrimento humano generalizado, fornecendo o ambiente ideal para a formação de alianças estratégicas como entre a Rússia e a América Latina.
A respeito, aliás, das relações de Moscou com a região, é preciso dar crédito às ideias do eminente diplomata russo Yevgeny Primakov, ministro das Relações Exteriores entre 1996 e 1998, que impulsionou a Rússia a atingir seus interesses em política externa por meio da cooperação com diferentes centros emergentes ao redor do globo.
Em suas visitas realizadas à América Latina ao longo da carreira, Primakov já falava sobre a construção de um mundo multipolar, quando essa realidade ainda parecia ser muito distante. Tal interpretação, portanto, mostrou-se verdadeira e fez com que as relações bilaterais russo-latino-americanas se baseassem não em afinidades ideológicas, mas em afinidades quanto a objetivos comuns de política externa.
Desde então, a Rússia sempre esteve interessada no fortalecimento da América Latina como um centro de poder independente do mundo multipolar, conforme defendido inúmeras vezes pelo atual ministro das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, e pelo presidente russo, Vladimir Putin.
O presidente argentino, Alberto Fernández, e o presidente russo, Vladimir Putin, apertam as mãos durante uma entrevista coletiva conjunta após sua reunião no Kremlin, em Moscou. Rússia, 3 de fevereiro de 2022
A América Latina, por sua vez, se interessou pela cooperação com a Rússia como forma de contrabalancear o domínio dos Estados Unidos na região.
Moscou e as elites latino-americanas, em resumo, apoiam um mundo no qual possa imperar não os ditames de uma superpotência isolada e narcisista, mas o respeito ao multilateralismo e aos interesses legítimos da chamada "maioria global".
Por fim, a reação à crise ucraniana e aos ataques recentes de Israel na Faixa de Gaza mostraram que os países latino-americanos não mais corroboram as políticas criminosas do Ocidente no Leste Europeu e no Oriente Médio.
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, e o embaixador do Chile na Rússia, Eduardo Raul Escobar Marin, brindam com champanhe durante cerimônia em Moscou. Rússia, 15 de setembro de 2023
Pelo contrário, hoje a América Latina, juntamente com a Rússia, tem condenado as ações destrutivas do "eixo autoritário" representado pelas elites atlanticistas, que a todo custo tentam manter o controle das rédeas do sistema internacional.
Consegui-lo, entretanto, já não é mais possível, pois o mundo unipolar da década de 1990 já se desfez de uma vez por todas. O momento agora é outro. O momento agora, como as relações entre a Rússia e a América Latina provam, é o da construção de um mundo mais justo, mais humano e multipolar.
As opiniões expressas neste artigo podem não coincidir com as da redação.
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