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Selva de pedra: por que o Brasil tem menos de 7% das áreas urbanas cobertas por vegetação?

Atualmente, o Brasil tem menos de 7% das áreas urbanas cobertas com vegetação. Quando as cidades alcançam ou superam esse percentual, ainda enfrentam outro problema: a desigualdade na distribuição de árvores em seu território. Por que esse fator deve ser encarado como um problema, inclusive para a saúde dos brasileiros?
Sputnik
Um levantamento do MapBiomas — rede de universidades, ONGs e empresas de tecnologia que esquadrinham o uso da terra no Brasil — revelou que as cidades brasileiras têm apenas 6,9% de sua área total coberta por vegetação.
O estudo, feito com base em imagens de satélite de 5.569 municípios brasileiros, mostra que a maior concentração é no bioma Mata Atlântica e na região Sudeste.
Algumas cidades, como o caso do Rio de Janeiro, superam o percentual apresentado. Entretanto, há desigualdade na distribuição da vegetação. Nesse caso, o município conta com pontos isolados, enquanto outros contam com grande concentração. Esse cenário, conforme pontuou Julio Pedrassoli, coordenador da Equipe Urbano do MapBiomas, em entrevista ao Jabuticaba Sem Caroço, podcast da Sputnik Brasil, não resolve o problema.

"Muitas cidades, às vezes, têm um grande parque. Mas ele é isolado, colocado num ponto. Está num ponto da cidade que beneficia aquele entorno, geralmente mais valorizado, inclusive. E as áreas mais periféricas vão também sofrer com a falta de vegetação. Então a distribuição desigual dessa vegetação é um problema tão grande quanto a baixa quantidade de vegetação que a gente mapeou."

Em termos absolutos, a cidade do Rio de Janeiro, que tem parques naturais como o da Pedra Branca e o Parque Nacional da Tijuca, é a que possui mais área de Mata Atlântica, com 12.300 hectares.
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De acordo com o pesquisador, apesar do percentual de 7% ser uma média do país, a grande maioria das cidades conta apenas com 3% de suas áreas urbanas cobertas por vegetação. "O problema maior se concentra nas cidades das região Norte e Nordeste atualmente", revela.
As cidades com menores parcelas de cobertura verde no país, segundo o MapBiomas, são Lizarda, no Tocantins, e Jerônimo Monteiro, no Espírito Santo, com apenas 1,002%.

Percentual baixo de áreas verdes nas cidades pode impactar saúde dos brasileiros

Pedrassoli cita que umas das principais preocupações relacionadas ao baixo nível de vegetação em áreas urbanas está no controle de temperaturas.

"Estudos no Brasil e fora hoje sugerem que, por exemplo, […] se tiver menos de 30% da área de um bairro coberta por vegetação, a temperatura começa a aumentar drasticamente. Isso é a realidade da maior parte das cidades brasileiras", aponta.

Com a elevação da temperatura, vem problemas de saúde, como "doenças cardíaca e respiratória", acrescenta.
Soma-se à má distribuição de áreas verdes, na qual geralmente as regiões periféricas ficam em desvantagem aos problemas de saúde e há, portanto, segundo o especialista um "acúmulo de mais desigualdade nas cidades".
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Áreas urbanas subestimam a importância da vegetação?

"Estamos acostumados a pensar a cidade como: a cidade chega primeiro, depois as pessoas chegam. Uma boa parte muito grande da realidade brasileira é o contrário, não é? Primeiro as pessoas chegam, aí a cidade tem que correr atrás para dar conta de levar os serviços", comenta Pedrassoli sobre o nosso processo histórico de urbanização.
Nesse caso, ele acrescenta que "se a gente pensar as áreas verdes como mais uma infraestrutura, algo muito importante, ainda mais em mudança climática, que regula a temperatura e uma série de coisas, é mais uma das infraestruturas que são falhas nas cidades brasileiras".
Entretanto, se historicamente os processos são desfavoráveis no que tange a cobertura verde nas cidades brasileiras, pouco tem sido feito para mudar, conforme externalizaram os analistas.
Pedrassoli fala em regressão das normas de proteção da vegetação urbana no Brasil, citando uma alteração legislativa ocorrida no final de 2021, que mudou o Código Florestal em relação a uma obrigatoriedade de margem a ser deixada nos rios em áreas urbanas.

"No apagar das luzes, o Congresso alterou essa legislação, passando para os municípios a capacidade de decidir quanto eles vão deixar ou não na beira dos rios, que geralmente é a área que a gente acaba mantendo de vegetação na cidade", comenta.

Se antes as chamadas áreas de proteção permanente obrigavam o mínimo de 15 metros, "a legislação do jeito que está hoje não tem mais metragem mínima, ou seja, o município pode decidir o que ele achar e dizer", arremata.
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Inclusive, segundo Pedrassoli, o Rio Grande do Sul "já tem cidades que não têm mais faixa de app".

"A vegetação é uma tecnologia enorme. Talvez uma das mais eficazes que a gente tem hoje para diminuir os impactos desses eventos extremos que estão cada vez mais frequentes. Por quê? Porque, por exemplo, se você tem uma vegetação na beira do rio, a água que vai para o rio e não vai escorrer tão rápido vai sendo absorvida ao longo do caminho, e aí chega menos água no rio. Vai acumular menos, com velocidade menor", explica.

Outro fator preponderante é o não direito à moradia, segundo o analista. Em vez de um ambiente saudável, a formação da cidade segue uma lógica do mercado. "Quando a cidade deixa de ser um direito e passa a ser uma mercadoria, a gente vai acabar incidindo nesse tipo de resultado em sua grande maioria", ressalta.
No lugar da qualidade da cidade, reverbera o pensamento de lucro máximo em caso de "aproveitar o máximo do solo impermeabilizado, construir o máximo que der para cima, com verticalização e tudo mais para poder vender".
Nesse caso, a proteção das pessoas fica em segundo plano. "A vegetação, hoje, no cenário que a gente está de mudança climática, estando presente nas áreas urbanas, é uma questão de sobrevivência, de proteção das pessoas por conta do incidente de doença, dos desastres e tudo o mais."
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Outro motivo incipiente que subestima a importância da cobertura de vegetação nas cidades é a própria cultura social: "Falta um reconhecimento maior do valor da arborização; na verdade, de toda a vegetação nas cidades", comenta a bióloga Lara Lutzenberger, presidente da Fundação Gaia.
As árvores, ao contrário da valorização, são encaradas como ameaça no ambiente urbano, em casos, por exemplo, de possível queda de um galho ou da própria árvore em carros, fiações ou construções.

"As cidades são focadas no concreto e, na verdade, a gente precisa realmente trazer com força a natureza do campo para dentro da cidade. […] Toda uma questão cultural precisa ser mudada", salienta.

Se por um lado a intervenção nas cidades é, por vezes, justificada sob a perspectiva de plantar mais árvores ao derrubar uma para fazer determinada obra, a bióloga enxerga a ação como uma "heresia".
"Não faz o menor sentido. Primeiro que derrubar uma árvore frondosa que levou décadas para crescer, que abriga toda uma multiplicidade de outros seres vivos, não se compensa isso no plantio de uma muda que não se sabe nem se vai vingar", argumenta.
Além disso, o tempo que ela levará para estabelecer a complexidade que a árvore anterior tinha é muito grande e é um fator que precisa ser levado em consideração.

"A gente faz parte da natureza, a gente está umbilicalmente vinculado à natureza, e é preciso resgatar essa proximidade, essa conexão, essa vivência de natureza, porque ela realmente agrega vitalidade para nós mesmos em todos os âmbitos da nossa vida", finaliza a presidente do Instituto Gaia.

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