Nesta quarta-feira (23), o ministro das Relações Exteriores Mauro Vieira, que chefia a delegação brasileira na cúpula dos líderes do BRICS, falou com jornalistas sobre a posição do Brasil em relação à nova onda de expansão do grupo.
Em resposta a questionamento feito pela Sputnik Brasil, o ministro Mauro Vieira confirmou o seu compromisso com o BRICS e prometeu uma presidência brasileira ativa para 2025.
"O nível de engajamento será total. Nós vamos trabalhar com o mesmo afinco e a mesma dedicação que trabalhamos até agora em todas as iniciativas a que pertencemos", disse Vieira à Sputnik Brasil. "Temos uma série de iniciativas e projetos para a nossa presidência, como o sistema de pagamento internacional entre os países do BRICS."
O chefe do Itamaraty nota que o Brasil tem experiência em selar acordos para realizar comércio sem o dólar, tema também levantado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu discurso na reunião de líderes do BRICS desta quarta.
Após o cancelamento da participação do presidente Lula na Cúpula do BRICS de Kazan, a delegação brasileira ficou reduzida em número de ministérios participantes. O ministro Vieira negou que a delegação modesta seja indício de desengajamento do país com a articulação.
"A delegação brasileira é substantiva, formada pelos sherpas e vice-sherpas brasileiros, o embaixador do Brasil em Moscou, vários outros funcionários do Itamaraty… Uma delegação grande, representativa, como sempre foi em todas as reuniões do BRICS", declarou Vieira à Sputnik Brasil.
Mauro Vieira (ao centro) durante a reunião estendida da cúpula de chefes de Estado do BRICS em Kazan. Rússia, 23 de outubro de 2024
© Stanislav Krasilnikov / Photohost agency brics-russia2024.ru
Segundo ele, o BRICS é "uma plataforma importante para o Brasil", que após a expansão se converteu em "um instrumento de inserção internacional, cooperação, concertação de ideias e posições políticas que só beneficiam aos países-membros do grupo".
BRICS: novos membros
Um dos eventos mais esperados da cúpula de chefes de Estado do BRICS de Kazan é o anúncio da categoria de países parceiros do grupo. A intenção dos diplomatas é criar uma divisão intermediária para que os novos membros se integrem ao grupo de forma paulatina.
"Atingimos consenso sobre os princípios e critérios que guiarão essa ampliação. Os países-membros do BRICS aderem a certos princípios, e os próximos membros também acederão a eles", explicou Vieira.
Entre os critérios estão o apoio à reforma do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), tema caro ao Brasil, e a não adesão a sanções econômicas impostas de forma unilateral.
"O Brasil é contra as sanções unilaterais de qualquer país que seja. Nós só aceitamos e transformamos em lei interna as sanções que são aprovadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. Já as sanções unilaterais, nós somos totalmente contra", asseverou Vieira. "E não há nenhum país no BRICS que imponha sanções unilaterais."
Segundo ele, a adesão dos membros do BRICS à reforma da governança global, que inclui mudanças no modus operandi de instituições financeiras internacionais, deve acelerar a aprovação de medidas concretas. "Acho que o BRICS é mais um grupo que pode fazer pressão pela mudança da governança global. Vai ser muito importante que essa convergência que foi notada hoje se reproduza […] no curto prazo, e não se arraste por um século", declarou Vieira.
"Vamos celebrar ano que vem 80 anos da ONU, espero não precisar esperar outros 80 anos para ver uma reforma da governança global."
O consenso sobre os critérios e princípios de adesão abre portas para a discussão de quais países serão convidados a entrar no grupo. Apesar de não haver uma lista oficial de países que poderão ser convidados, as que circulam nos bastidores da cúpula de Kazan têm de 10 a 13 países elencados, apurou a Sputnik Brasil.
"Uma vez atingido o consenso, o Brasil é favorável a que haja um número de dez, já que atualmente o BRICS conta com dez membros, e, portanto, que os parceiros também sejam dez", disse o ministro.
Mauro Vieira e o presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante abertura da cúpula de chefes de Estado do BRICS em Kazan. Rússia, 23 de outubro de 2024
© Sergey Bobylev / Photohost agency brics-russia2024.ru
Ucrânia
O ministro Vieira manifestou satisfação com a linguagem da declaração final do BRICS, divulgada na tarde de hoje (23). Para ele, o texto logrou cobrir de forma equilibrada até os temas mais sensíveis da agenda internacional, como o conflito ucraniano.
"O documento final reflete a posição de todos e está muito bom. Hoje mesmo, durante as reuniões, eu me referi à iniciativa apresentada pela China e Brasil [sobre resolução do conflito ucraniano], que é uma plataforma, um oferecimento que está aberto para que mais países se juntem, possam promover um espaço de conversa e negociações que leve à cessação de hostilidades, sobretudo", disse o chanceler brasileiro.
Conflito no Oriente Médio e Israel
Um dos temas tratados na declaração final da cúpula de chefes de Estado do BRICS é o conflito no Oriente Médio, com foco para a situação em Gaza e demais territórios da Palestina ocupada. Apesar de declarações fortes do governo brasileiro condenando as ações militares israelenses, Vieira não acredita que o rompimento das relações diplomáticas seja uma saída para a crise.
"Nós não rompemos relações diplomáticas porque acreditamos no diálogo e achamos que conversando, dialogando pelos canais diplomáticos é sempre melhor. Então não está em consideração romper relações", disse Vieira. "Romper relações não leva a nada, só leva ao acirramento da situação e pode levar a conflitos maiores na região."
Na quinta-feira (24), o ministro Mauro Vieira deve participar das atividades da Cúpula do BRICS no formato Outreach, que inclui países convidados do grupo. Na edição deste ano, o BRICS Outreach deverá incluir delegações de Turquia, Venezuela, Bolívia, Armênia e Azerbaijão.
O chefe da delegação brasileira deve encerrar sua missão em Kazan por volta das 22h00 do horário local (16h00 no horário de Brasília), quando parte rumo à capital russa, Moscou.