O Irã convive há pelo menos
quatro décadas com sanções, seja por parte dos Estados Unidos, do Canadá ou da União Europeia. Fora do sistema internacional e obrigado a fazer esquemas de triangulação para comercializar seus produtos, Teerã sugeriu ao BRICS um mecanismo para driblar as restrições.
"O BRICS poderia desenvolver um mecanismo comum com o objetivo de apoiar os membros da organização diante de sanções unilaterais ilegais e continuar o desenvolvimento das economias dos países, sem que haja pressões políticas injustas", disse Pezeshkian, segundo a assessoria do governo iraniano.
Em entrevista ao Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, especialistas afirmam que a pauta deve ser vista com cautela por alguns membros do grupo, que têm relações diferentes com outros atores globais no quesito negociação.
A posição de cada país nas relações internacionais pode ser um entrave para um apoio profícuo por parte das nações do BRICS.
Jorge Mortean, mestre em estudos regionais do Oriente Médio pela Academia Diplomática do Irã e doutor em geopolítica pela Universidade de São Paulo (USP), cita a postura neutra adotada pelo Brasil no campo. Outro exemplo é a Etiópia, que pode
viver um dilema, dadas as boas relações comerciais com Israel.
Por outro lado, Luana Paris ressalta que o discurso que endossa a caracterização das sanções como um instrumento colonial e, consequentemente, lança mão do apoio à ideia do mecanismo pode vir de países que também sofrem com sanções, caso da Rússia e de países africanos que compõem o grupo.
Apesar disso, situações recentes, como as tarifas disparadas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, contra o BRICS, mostraram que, apesar das diferentes agendas, no limite, pode acontecer da aplicação de uma política "sancionar todo mundo".
A ideia de propor um mecanismo antissanções
a partir do BRICS está relacionada, segundo Mortean, a uma espécie de mecanismo de compensação econômica. "Seria um propósito de tentar fomentar o intercâmbio comercial naquilo que, de fato, os iranianos têm a oferecer e também têm a comprar, fora dos setores críticos que abarcam essas sanções."
Nesse sentido, de acordo com ele, estariam nessa relação, por exemplo, o petróleo e hidrocarbonetos.
Dessa forma, o projeto deveria criar "caminhos alternativos para que os países que estão sancionados não fiquem tão prejudicados, tendo em vista que o Irã entende que a quantidade de sanções e a forma como elas são aplicadas ao seu próprio país são, de certa forma, injustas", acrescenta Paris.
Ainda segundo a pesquisadora, o BRICS já possui uma arquitetura financeira própria, que pode servir de base para qualquer mecanismo que for operacionalizado e desenvolvido. Conforme ressalta, o BRICS tem o Arranjo Contingente de Reservas (ACR), criado há mais de dez anos.
O ponto, portanto, não seria a criação de um fundo, mas um rearranjo do ACR às novas demandas.
Questionada sobre, caso o mecanismo seja concretizado, quem seria o responsável pela governança, Paris aposta que pode ser a China, uma vez que Pequim já possui "certo
desenvolvimento de liquidação internacional conectado a outros países e "talvez seja a principal fornecedora dessa tecnologia e dessa arquitetura digital". Além disso, o gigante asiático já é sede do NBD.
Porém ela destaca que esse posicionamento poderia alçar a China à liderança do agrupamento, algo que pode não ser bem visto por outros países, que enxergam um bloco horizontal, com presidências temporárias.