“Eu e a minha família vivia em Damasco até 2012. Quando começou a guerra, nós resolvemos mover a Kobane que é a minha cidade natal. Entre de pouco fui trabalhar na Turquia, mas a minha mulher e as crianças ficaram em Kobane. Em Istambul trabalhei na construção civil. Quando no ano passado os militantes [do Estado Islâmico] atacaram Kobane, eu rapidamente levei a família a Istambul. Vivíamos uma vida difícil porque o salário foi pequeno. A minha irmã mais velha vive na Suíça e o irmão mais velho no Canadá. A irmã propôs que vínhamos a ela e nós aceitamos a proposta. Eu encontrei uma pessoa que faz transferes de refugiados. Ele enviou-nos a Bodrum para um contrabandista. Esta pessoa levou-nos para as montanhas e disse que íamos começar a viajem dali e cobrou 1.200 dólares de cada um. Cerca da meia-noite embarcamos num barco e zarpamos do litoral. Junto conosco mais 13 pessoas estavam no barco. Em breve surgiram grandes ondas. Em reparar isso, o nosso monitor mergulhou no mar e afastou-se nadando. As ondas ficavam cada vez mais fortes e o nosso barco capotou sacudido por uma delas. Começamos a gritar em pânico. Eu tentava acalmar as crianças, gritava para que não tivessem medo e que tudo ficará bem. Durante uma meia-hora eu conseguia segurar eles em cima da água e não deixá-los asfixiar-se. Mas em qualquer momento as forças deixaram-me e eles se afundaram; Quando eu consegui levantá-los, ambos eram mortos. Os que sabiam nadar entre nós conseguiram salvar-se. Eu ficava no mar por três horas e meia até que os funcionários da guarda costeira levaram-me para o litoral.
É claro que eu percebi o risco de uma viagem destes, mas depois de ler muitas histórias de como refugiados sucessivamente atingiram Europa, eu tinha esperanças de que teríamos sorte.
Levei os corpos da minha família e hoje planeio voltar à pátria, a Kobane, para sepultá-los ali. Agora na minha vida resta nada, apesar da memoria e três sepulturas.
Vou continuar em Kobane e diariamente vou visitar a sepultura da minha mulher e os filhos. Os filhos foram tudo para mim. Eu os amei mais do que a minha vida. Eu decidi fazer a viagem para o seu futuro bem na Europa. Agora já nunca poderei olhar para o mar, imediatamente vejo os acontecimentos horríficos daquela noite…
Tudo que peço do mundo é achar a via de parar com a catástrofe, por fim às mortes de pessoas inocentes que tentam se salvar e achar o asilo no estrangeiro. Os meus filhos morreram, mas outras famílias também têm filhos que não devem morrer. O mundo deve parar com a tragédia”.