“Podem me prender, mas não vão me calar! Se pudessem, eles eliminariam a letra ‘K’ do alfabeto”, disse Cristina sob aplausos de correligionários e pessoas que passavam pela Avenida Comodoro Py, sede do tribunal.
Alguns analistas acreditam que as ações executadas pelo novo governo têm propiciado as condições necessárias para o ressurgimento de opositores de peso como Cristina Kirchner.
O professor de Economia Política e Internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Eduardo Crespo diz que essa reentrada está sendo promovida pelo próprio governo, com provocações como a de escalar juízes para julgar acusações que carecem de fundamento.
“O governo [Macri] começa a mostrar sinais de fraqueza importantes por vários motivos: a situação econômica piorou muito nos últimos meses, com disparada da inflação, corte de gastos públicos, demissões e até uma certa perseguição ideológica no aparelho do Estado" – diz Crespo.
Na visão de Crespo, não fazem nenhum sentido as acusações contra a ex-presidente, o então ministro da Fazenda e o chefe do Banco Central, por um swap cambial.
“Não está clara a estratégia do Governo Macri com essas provocações no momento em que estão promovendo ajustes econômicos e acusações de corrupção que vêm de fora [os Panama Papers]” – avalia Crespo.
No campo da negociação política, o professor da UFRJ lembra que, embora o Governo não tenha maioria no Congresso, ele pode negociar com diversos setores, como a parcela do peronismo que não é próxima do kirchnerismo e com grupos espalhados de radicais.
No campo econômico, contudo, o cenário é mais complexo.
“O Governo fez tudo junto, um choque de desvalorização cambial, aumento de tarifas, e eliminou retenções. Uma coisa é um ajuste gradual, outra coisa é tudo junto. A previsão para a taxa de inflação é de que vai dobrar este ano. Para este mês de abril já estão falando em 6%, que já é a inflação de todo o primeiro quadrimestre do ano passado. Ao contrário do que estavam pensando, as demissões no setor público estão gerando demissões também no setor privado, o desemprego está aumentando e provavelmente será um ano de forte recessão” – avalia.
“É um clima muito feio, e as pesquisas de opinião já estão dando uma queda de popularidade do governo. Outra característica típica da Argentina é a questão da vingança, da revanche. De repente, a pessoa que esteve 12 anos fora do governo, na oposição, em poucos meses quer vingar todo o sofrimento que passou, e isso também gera muito ressentimento do outro lado. Isso já aconteceu na Argentina muitas vezes, como na queda de Perón em 1955, com os militares em 1976, e isso é muito triste e complicado porque nunca dá certo” – concluiu.