O caso mais recente aconteceu na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. A Juíza Daniela Barbosa Assunção, da Segunda Vara Criminal de Duque de Caxias, determinou o bloqueio do aplicativo em todo o Brasil na terça-feira, 19, pelo fato de seus administradores não fornecerem a transcrição de mensagens de usuários investigados pela polícia, investigações que ocorrem em segredo de Justiça.
Os administradores não atenderam à determinação judicial, alegando que, pelo fato de as mensagens do aplicativo serem criptografadas, só têm acesso a elas o emitente e o receptor.
A juíza entendeu a recusa como tentativa de obstrução da Justiça e determinou o bloqueio do WhatsApp em todo Brasil, a partir das 12 horas de Brasília. No final da tarde da mesma terça-feira, o Ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, acolheu recurso dos administradores do aplicativo e revogou a determinação da magistrada, argumentando que a medida fora excessiva e, portanto, prejudicara muito mais os milhões de usuários do aplicativo no Brasil do que, propriamente, os seus administradores.
Para o advogado Diogo de Souza e Mello, membro da Comissão de Defesa dos Direitos do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, a revogação das determinações de bloqueio do WhatsApp por parte dos graus superiores de Justiça é uma medida correta mas que talvez não seja suficiente para impedir que outros juízes singulares adotem a mesma decisão dos outros magistrados:
"Os juízes têm autonomia funcional para decidir conforme os seus entendimentos e conforme a particularidade de cada caso", analisa Diogo de Souza e Mello. "Esta autonomia não é retirada do juiz singular, mesmo existindo decisões de instâncias superiores revogando seus atos. Ou seja, juiz algum vai deixar de decidir de acordo com os subsídios que tenha reunido ao apreciar os processos. Porém, acredito que com esta decisão do Supremo Tribunal Federal este assunto passa a ter uma pacificação maior e os juízes singulares possam então optar por outras medidas, como, por exemplo, aplicação de multas ou, num caso mais extremo, a expedição de mandados de prisão contra pessoas que os juízes entendam como passíveis de estarem obstruindo a Justiça."
O membro da Comissão de Defesa dos Direitos do Consumidor da OAB pensa ainda que "talvez os juízes, com esta decisão do STF, não se aventurem tanto em bloquear o WhatsApp. Até porque o Marco Civil da Internet, a Lei 12.965, estabelece em seu artigo 4.º que o acesso à internet é livre para todos. E, evidentemente, não se pode acessar livremente um recurso da internet se ele estiver bloqueado."
Diogo de Souza e Mello também lembrou que a Organização das Nações Unidas adotou recentemente uma resolução enfatizando essa liberdade de acesso diante de governos de alguns países que restringem o uso da internet.
O advogado concorda em que a ausência de uma lei específica, a chamada lacuna legal, dificulta a ação da Polícia e da Justiça para obtenção da transcrição de conversas de pessoas investigadas por indícios de terem cometido ou estarem cometendo crimes:
"Existe mesmo essa lacuna legal, essa brecha na legislação que permite às pessoas barrar as investigações. Mas, ao mesmo tempo, devemos lembrar que há um projeto de lei tramitando no Senado Federal que permitirá às autoridades executar estas apurações. Além disso, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, assegurou que o Governo está agilizando os procedimentos para a regulamentação desta matéria."
Em sua conversa com a Sputnik Brasil, o advogado Diogo de Souza e Mello destacou ainda que os Poderes Executivo e Legislativo devem também convocar as empresas administradoras de recursos como o WhatsApp para discutir os procedimentos, de tal modo que as empresas consigam conservar a confiabilidade dos seus usuários na garantia de sigilo das comunicações, bem como possam atender às determinações judiciais para instrução de processos criminais.