Foi então a vez de o procurador-geral se irritar. Além de negar com veemência que algum procurador tenha sido a fonte dos jornalistas, Rodrigo Janot disse em evento na Escola do Ministério Público Federal, em Brasília, referindo-se ao ministro do STF mas não citando seu nome, que ele sofre de “disenteria verbal”.
Quem também se manifestou sobre as críticas de Gilmar Mendes foi o Procurador Deltan Dallagnol, chefe da missão do Ministério Público Federal em Curitiba que apura os delitos praticados no âmbito da Operação Lava Jato. Dallagnol disse que não faz o menor sentido a proposta de Gilmar Mendes de anular as delações dos executivos da Odebrecht.
“Vejo estas desavenças com muita preocupação”, diz Cramer. “Entendo que, como representantes destas instituições – o Ministro Gilmar Mendes pelo Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, e Rodrigo Janot pela Procuradoria-Geral da República –, Mendes e Janot devem falar de maneira formal, não devem emitir opinião e não devem se manifestar casuisticamente. Estas instituições falam por meio dos seus integrantes, respeitando a liturgia dos cargos e respeitando a outra autoridade. Quando se tem um ministro do Supremo Tribunal Federal exercendo a verborragia da forma como a tem exercido o Ministro Gilmar Mendes, falando casuisticamente, falando sobre casos que ele irá julgar, dando opiniões não só no campo jurídico como também no político, isso é muito ruim para a República, muito ruim para a democracia, porque ele não pode fazer isso. A fala dele pode ser confundida com a fala da instituição, e isso é ruim.”
O vice-presidente da OAB-Rio acrescenta:
“Ao mesmo tempo, o Procurador-Geral Rodrigo Janot respondeu. Até aí não vejo qualquer problema, até porque deve ter havido alguma forma de pressão entre seus pares para que ele respondesse, mas eu acho que ele também exagerou no tom. Ele passou um pouquinho do tom, usando alguns adjetivos que considero impertinentes para a fala de um integrante da Procuradoria-Geral da República.”
“Vamos começar pelos fatos. Por um lado, existe a afirmação do Ministro Gilmar Mendes de que tem havido vazamentos seletivos de informações que seriam necessárias para a apuração de eventuais crimes na Operação Lava Jato, entre outras operações. É verdade que nós temos assistido no Brasil, ao longo dos últimos anos, a uma série de vazamentos que acabam influenciando os rumos da política e da economia do país? É verdade. Isso não começou agora. Na verdade, faz algum tempo que esses vazamentos vêm acontecendo, em clara violação à lei, e esses vazamentos acabam servindo para ativar a opinião pública em uma ou em outra direção.”
O Professor Daniel Vargas continua seu raciocínio:
“Por outro lado, é verdade que nós estamos assistindo a ministros do Supremo Tribunal Federal se manifestarem de maneira, talvez, um pouco exagerada ou pouco cuidadosa sobre questões que não dizem respeito necessariamente a casos, a questões de Direito, mas têm um estilo de ação que mais parece uma disputa política sobre os rumos do país? Também é verdade. Me parece que o caso do Ministro Gilmar Mendes não é um caso especial ou peculiar, mas é exemplo de um caso que vem acontecendo de maneira sistemática no Brasil. Não me parece adequado para a posição de um ministro do Supremo participar de discussões políticas tentando influir nos rumos do país.”
Para os dois professores de Direito, Ronaldo Cramer e Daniel Vargas, não há como dizer que a razão esteja do lado de uma ou de outra parte. E, no caso especial do Ministro Gilmar Mendes, há que se levar em conta o fato de que, como presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ele poderá estar à frente do julgamento (possivelmente ainda este ano) das ações que pedem a cassação da diplomação da chapa Dilma-Temer na eleição presidencial de outubro de 2014, por alegado recebimento de doações financeiras de origem escusa, razão pela qual é de se esperar maior compostura em pronunciamentos públicos.