Até hoje, após investigação por três órgãos e julgamentos em duas instâncias, ninguém foi preso pelo acidente. No mês passado, os três réus no processo foram absolvidos pela justiça: o diretor de segurança de voo da TAM na época, Marco Aurélio dos Santos de Miranda e Castro, o então vice-presidente de Operações da companhia, Alberto Fajerman, e a então diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Denise Maria Ayres Abreu. Todos eram acusados de atentado doloso contra a segurança no transporte aéreo, com pena prevista de 24 anos de prisão. Segundo o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), não há provas de que alguma ação direta de algum dos três contribuiu para o desastre.
De acordo com o comandante Milian Heymann, especialista em segurança aérea, pelo menos três incidentes parecidos com esse do Airbus A320 da TAM ocorreram em Congonhas, sem, no entanto, resultar em vítimas. Por sorte. Ele acredita que a conclusão das autoridades de que os pilotos estariam entre os maiores culpados pelo ocorrido é equivocada. Heymann explica que o tamanho inadequado da pista para aeronaves desse porte, a falta de grooving (ranhuras) no local, o excesso de peso do avião na ocasião e a insistência da companhia aérea para que o pouso fosse realizado em Congonhas são fatores decisivos para o acidente.
"Esse é um avião que nunca deveria estar operando ali. Aquele aeroporto deveria ter extremas restrições, para a operação apenas de pequenos turbo-hélices. No máximo, até 60 ou 80 lugares. Mas a ganância desses empresários e a cegueira desses órgãos reguladores e investigadores é que são os culpados desses acidentes", afirmou o especialista em entrevista à Sputnik. "O próprio Cenipa [Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos] listou 83 recomendações, modificações que deveriam ser feitas, para evitar que futuros acidentes como esse voltassem a ocorrer. E o que aconteceu? Nenhuma dessas recomendações foi o fator causador do acidente. O fator causador do acidente foi o piloto, que já tinha inclusive pousado em outros aeroportos nessa jornada de trabalho que terminou ali em Congonhas?", acrescentou.
Entre as vítimas do voo 3054 da TAM, em 2007, estava um grupo com 12 integrantes do movimento Tricô dos Precatórios do Rio Grande do Sul, que estava indo para a capital paulista naquele dia para participar de um evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Neste décimo aniversário da tragédia, o Sindicado dos Servidores Públicos Aposentados e Pensionistas do Estado do Rio Grande do Sul (Sinapers), criador desse movimento, realizou um ato em Porto Alegre em homenagem às pessoas que perderam a vida naquele dia.
A atual presidente do Sinapers, Katia Terraciano, também ouvida hoje pela Sputnik, disse que a sensação de impunidade existente ainda dez anos depois do ocorrido é muito grande. Segundo ela, diante do "sucateamento das instituições brasileiras", só milagres podem explicar por que outros acidentes como esse não ocorreram. Katia, que, na época, era tesoureira do grupo, conta que o processo de reconstrução depois do desastre foi muito difícil. Mas os integrantes que continuaram tricotando seguem na luta pelo pagamento de precatórios, também atuando na área social. O movimento, que recebeu mantas de tricô de diversas partes do mundo após o acidente, começou a fazer doações para instituições de caridade.
"A dor é a mesma, como se tivesse acontecido ontem", afirmou a presidente do Sinapers. "Essa tragédia estraçalhou a vida das famílias, os projetos de vida. E, infelizmente, a gente ainda tem que ouvir e constatar que a justiça não está funcionando no país. Quando se coloca a culpa nos pilotos, é muito conveniente".
Na opinião do comandante Milian Heymann, ao se responsabilizar principalmente os pilotos pelo acidente, a culpa recai sobre quem não pode se defender ou pagar indenizações pelo ocorrido. Mas "os verdadeiros culpados todo mundo sabe" quem são:
"A empresa [TAM], a Infraero, a Anac. E o Cenipa está colaborando com a impunidade dos verdadeiros criminosos."