Um dos analistas que possuem esse ponto de vista é Paulo Velasco, especialista em assuntos de América Latina e políticas da América Latina, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no Rio de Janeiro, da UERJ, e pesquisador-sênior do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI).
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, Velasco disse que as dificuldades podem ser resolvidas por meio de concessões recíprocas. Segundo ele, "o protecionismo europeu é a questão mais dramática".
"Reconhecemos que, na União Europeia, existe a política agrícola comum desde o início da década de 1960, e é ela que fundamenta uma resistência grande da Europa na hora de fazer concessões e, sobretudo, no que tange ao acesso ao mercado de alguns produtos sensíveis, notadamente o acesso da carne bovina, açúcar, etanol, dentre outros produtos", avaliou.
Do outro lado, Velasco continuou, o Mercosul também possui "dificuldades em fazer concessões à altura daquilo que a União Europeia está esperando".
"Numa negociação que busca o acordo de livre comércio, ambos os lados têm de estar dispostos a fazer concessões, inclusive em temas sensíveis. No caso do Brasil e do Mercosul, de modo geral, há uma resistência em fazer ofertas mais amplas, por exemplo, no comércio de serviços, no setor de produtos manufaturados e, especialmente, em algumas áreas como o setor automotivo", destacou.
Altos e baixos
Diante do impasse, o especialista comentou que os países do Mercosul ofereceram concessões para a União Europeia que podem ser consideradas "muito tímidas". "É claro que isso retarda o processo negociador e temos de lembrar que ele teve início lá atrás, em 1999. Nesses quase 20 anos, houve muitos períodos de altos e baixos entre União Europeia e Mercosul, mais baixos do que altos".
Mesmo diante das dificuldades, Velasco também explicou que ainda é possível que todas as partes cheguem a um bom termo, e que a política de concessões pode ser bem sucedida.
"A demanda europeia é por um acordo abrangente no setor de serviços. Os europeus não focam num ou noutro ponto específico. Há, por exemplo, setores europeus funcionando com êxito no Mercosul e, particularmente, no Brasil como é o caso dos bancos europeus. Há também a questão da presença de atores europeus nos setores de Logística, mas os europeus buscam um acordo, um guarda-chuvas no setor de serviços que permita, dentro das negociações entre Mercosul e União Europeia, uma ampla presença de europeus no setor de serviços", analisou.
Ainda segundo o especialista, o principal interessado neste acordo é o Mercosul, que exporta entre 20% e 25% do que produz para os países do bloco europeu.
"Há interesse sim para que se chegue a um acordo. Do Mercosul bem mais do que da União Europeia. A União Europeia representa muito mais para o Mercosul do que o inverso em termos de mercado. A União Europeia representa 20 a 25%, aproximadamente, das exportações do Mercosul. Já o Mercosul representa 3 a 4% das exportações europeias", disse.
Acordos regionais?
Diante da demora para que se feche o acordo, há quem defenda um maior investimento do Brasil na busca por acordos regionais. Mas, segundo Velasco, essa é uma opção que não favorece o Brasil.
"O espaço regional preferencial para o Brasil é o espaço sul-americano. O Brasil tem um espaço grande dentro do Mercosul e, quando a gente pensa para além da América do Sul, a própria ALADI [Associação Latino-Americana de Integração] tem um peso grande. Só que os mercados têm pesos diferentes para o Brasil", ponderou.
"Um mercado regional é o mercado para o qual o Brasil exporta um grande volume de produtos manufaturados. Por exemplo, quando pensamos no relacionamento do Brasil com a Argentina, vemos que o Brasil vende para a Argentina muitos carros, autopeças, eletroeletrônicos e produtos da chamada linha branca [fogões, geladeiras, máquinas de lavar, etc]. Não é o caso, evidentemente, da União Europeia e dos Estados Unidos", emendou o analista.
Diante do fato dos mercados terem pesos diferentes para o Brasil, a possibilidade de acordos e mercados regionais substituírem a falta de acordos mais amplos com a União Europeia é muito pequena, concluiu Velasco.
Citada pelo especialista, a ALADI foi criada em 1980 para promover o desenvolvimento econômico e social da região, em um processo de integração que visa ao estabelecimento, de forma gradual e progressiva, de um mercado comum latino-americano, segundo o Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
São membros da ALADI os seguintes países: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Panamá, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. A Nicarágua está em processo de adesão.
O conjunto dos 13 membros da ALADI abrange uma área de 20 milhões de quilômetros quadrados (quase cinco vezes maior do que a área dos 28 países que conformam a União Europeia), cerca de 530 milhões de habitantes e um PIB superior a US$ 5 trilhões.