De acordo com ambientalistas, os efeitos dos rejeitos de minério lançados no mar devem durar por pelo menos mais cem anos. Entretanto, não se tem um panorama completo de todos os detalhes dos danos causados pelo desastre.
Ação contra réus retomada
A Justiça federal determinou na última segunda-feira (13) a retomada da ação criminal contra as empresas Samarco, Vale, BHP Billiton, VogBR e mais 21 diretores e ex-diretores das corporações, por conta do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, que causou o desastre ambiental.
O juiz Jacques de Queiroz Ferreira, no entanto, determinou na última segunda-feira (13) que não houve irregularidade nas provas apresentadas, retomando o processo paralisado desde julho. Segundo ele, "ainda que se entenda que o monitoramento do último dia tenha sido irregular, isto não acarretaria a nulidade de toda a prova”.
Os réus respondem pelos crimes de inundação, desabamento, lesão corporal e homicídio com dolo eventual (quando se assume o risco de matar).
O que foi e o que não foi feito: da lama ao descaso
No total, são mais de 50 mil ações acumuladas contra a empresa Samarco S.A, que controla a barragem de rejeitos de mineração. Além disso, a Secretaria de Meio Ambiente do estado aplicou 36 multas contra a mineradora, mas apenas uma, de 127 milhões de reais, começou a ser paga em 60 parcelas. Já as multas aplicadas pelo Ibama ultrapassam o valor de 340 milhões de reais. No total, a mineradora pagou apenas 1,5% do valor estabelecido nestes dois últimos anos.
Após a tragédia, a Samarco fechou um acordo com o governo e estabeleceu 4 eixos de reparo dos danos: indenização aos afetados, recuperação do meio ambiente, contenção de rejeitos e reconstrução de vilarejos.
Dois anos depois da tragédia, são poucos os avanços para contornar os estragos. Em relação ao meio ambiente, apenas 2% da área verde e 10% das nascentes foram recuperadas, enquanto a recuperação das margens dos rios chegou a 73%. Mas é o drama das famílias atingidas pela lama que sofre maior impasse e parece longe de ser superado. Com o prazo estabelecido até 2019, nenhuma das obras de reassentamento para realocar famílias foi iniciada. Tampouco há qualquer previsão para reconstrução dos povoados de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, devastados pelo desastre.
A situação mais grave vem da queixa de muitas famílias que sequer conseguiram ser reconhecidas como vítimas da tragédia, e as que já foram reconhecidas como tal, receberam apenas o valor emergencial das indenizações. A instituição responsável pela restituição e o cadastro dos atingidos é a Fundação Renova, entidade controlada pelas mineradoras Vale, Samarco e BHP Biliton. Segundo o órgão, 23 mil pessoas foram cadastradas no sistema de restituição e 500 milhões de reais foram entregues para o auxílios emergenciais e indenizações.
Enquanto muitos dos afetados reclamam do árduo processo burorátrico para efetuar o cadastro junto à instituição, empurrando o processo nesses dois anos apesar da documentação completa, a Fundação Renova argumenta que há milhares de pessoas atingidas ao longo de toda a região afetada pela lama, demandando um exame detalhado de cada caso.
E o cenário dois anos após a tragédia é de muitas famílias que já foram reconhecidas como vítimas ainda aguardarem o recebimento do auxílio emergencial, que consiste em um salário mínimo e uma cesta básica.
Tragédia aumenta depressão e tentativas de suicídio
Para além das restituições materiais, outro quadro que vem se agravando de forma drástica entre os afetados é o grande aumento do número de pessoas em depressão e de tentativas de suicídio entre os que tiveram a sua vida transformada pelo desastre.
Segundo os dados da Secretaria Municipal da Saúde de Mariana, cerca de 10% dos atingidos foram diagnosticados com algum grau de depressão. Antes da tragédia, o número de pessoas atendidas pelas equipes de saúde mental, não passava de 30.
Muitas das famílias que foram obrigadas a se deslocar para outras regiões por conta da destruição de suas casas, se mudaram carregando o estigma de "povo da lama", sofrendo preconceito por supostamente se aproveitarem da busca por restituições. A tensão nessas regiões que receberam os atingidos só se agravou com o aumento do desemprego causado pelo fechamento da mineradora. Como 89% da receita da cidade de Mariana, por exemplo, vem da mineração, muitos se ressentem das vítimas que lutam por indenizações contra a mineradora. Foi registrado também um aumento significativo no consumo de álcool e medicamentos entre as populações atingidas pela lama.
A justiça determinou para o dia 27 de novembro uma audiência para a organização do processo criminal contra os réus envolvidos no rompimento da barragem, mas a expectativa é de que o processo ainda se arraste por anos. Dois anos após o maior desastre ambiental da história brasileira, o futuro das famílias atingidas e do meio ambiente afetado se mantêm bastante incerto.