Godinho explica que o ACNUR observa os movimentos migratórios em direção ao Brasil desde 2015. Desde então, afirma, a organização percebeu um crescente movimento de venezuelanos não só vindo ao Brasil como para outros países da região, como Colômbia, Peru e Equador.
Após perceberem o aumento do fluxo de migração para o Brasil, o ACNUR decidiu abrir um escritório na região Norte do país, por onde entram a maior parte dos imigrantes venezuelanos.
Ele ainda explica que 85 mil venezuelanos solicitaram refúgio ao Brasil desde 2015, segundo números da Polícia Federal e que esse quadro exigia uma resposta "mais coordenada e mais ampla para essa população".
Apesar do aumento do número de imigrantes, o porta-voz do ACNUR no Brasil lembra que sempre houve "um grande trânsito de pessoas" entre os dois países. Porém, houve um aumento nesse trânsito em razão da "complexidade da situação política, econômica e social na Venezuela".
"E os governos, juntamente com a sociedade, com o setor privado, com o ACNUR e outras agências da ONU têm procurado responder às necessidades que essas pessoas têm ao chegar em seus territórios", afirma.
Apesar do envolvimento da sociedade civil, Godinho aponta a resposta ao fenômeno dos refugiados venezuelanos tem partido diretamente das autoridades nacionais. Por isso, o esforço do ACNUR e outras agências da ONU é um apoio para a garantia do respeito aos direitos humanos, "padrões humanitários que já estão estabelecidos há muito tempo", ressalta Godinho.
Como a agência trabalha no apoio aos venezuelanos no Brasil?
O ACNUR trabalha no Brasil na orientação de quais serviços básicos devem ser disponibilizados aos imigrantes refugiados. Ele explica que faz parte do trabalho da agência prezar pela regularização da situação migratória e pelo combate à discriminação de gênero, violência sexual e atendimento às vítimas de violência desse tipo.
Luiz Fernando Godinho explica que o trabalho da agência, no entanto, depende da capacidade dos países em que estão atuando.
O trabalho da ACNUR em Roraima, explica Godinho, tem tido o apoio de diversas agências da ONU ao lado do Governo Federal. A atuação busca monitorar a fronteira com a Venezuela e aperfeiçoar o processo de documentação e registro dos imigrantes. Com isso, os refugiados podem acessar serviços universais que já existem no Brasil, como na área da saúde.
Em Roraima, a agência mantém um sistema de abrigamento emergencial e temporário com o objetivo de atender os casos mais vulneráveis.
"Nós estamos falando já de 13 abrigos estabelecidos com base nessa resposta e que hoje já acolhem cerca de 6 mil pessoas", ressalta.
A agência também trabalha de forma a distribuir os refugiados dentro do país e orienta o governo federal a fazê-lo de forma organizada, agregando a experiência de outros localidades em que esse tipo de situação também acontece. Um trabalho que o porta-voz considera "exitoso".
"Há todo um esforço para se identificar vagas disponíveis em abrigos e em outros lugares do país para que aquelas pessoas que voluntariamente decidam se deslocar mais em direção a outros pontos do país possam fazer isso de maneira ordenada e segura", afirma.
Qual o critério para a distribuição de venezuelanos?
A agência tem trabalhado de forma a identificar os locais com disponibilidade no território nacional para receber os refugiados que querem ser interiorizados no país. Godinho explica que há complexidades nesse trabalho, tais como a identificação de abrigos que atendam famílias e pessoas com necessidades especiais, como membros da comunidade LGBTI.
Esse programa, no entanto, exige que os refugiados estejam documentados e que passem por exames de saúde, assim como uma atualização das carteiras de vacina. Esses pontos são exigências do governo federal brasileiro para o embarque dos imigrantes nos aviões das Forças Armadas que fazem o transporte para outros locais.
Além de atender às necessidades dos refugiados, o programa busca desafogar o estado de Roraima.
"O objetivo do programa é criar melhores condições de integração dessas pessoas fora de Roraima, que é um estado que tem as suas limitações, ele tem um certo isolamento geográfico em direção ao país, não tem uma economia tão dinâmica quanto outras unidades da federação e é uma maneira também de desafogar, de reduzir o impacto dessa chegada nas comunidades que acolhem essas pessoas no Norte do Brasil", afirma o porta-voz do ACNUR.
"Todo refugiado quer voltar para casa, ninguém quer ser refugiado"
Uma preocupação que costuma ser posta em relação aos refugiados nos países é a questão dos empregos. No Brasil, a ACNUR, ao lado de outras agências, sociedade civil e governo federal, tem apontado caminhos para a integração dos venezuelanos ao mercado de trabalho.
"Não há, obviamente, uma reserva de mercado para essa população, mas há sim uma série de ações, uma série de atividades que visam acelerar e promover essa integração econômica", explica Luiz Fernando Godinho.
O porta-voz lembra que os refugiados recebem aulas de português e documentos como o CPF e a carteira de trabalho. Ele aponta que as pessoas que optam pela interiorização são orientadas para obterem empregos.
A entrada de venezuelanos em Roraima também ocasionou episódios de violência por parte da população local e pedidos do governo do estado para que a fronteira fosse fechada. O representante do ACNUR, explica, no entanto, que incidentes como esses não foram mais registrados.
"Felizmente não tivemos outros incidentes como aquele, foi um incidente pontual. Há, obviamente, o reconhecimento da nossa parte de que a chegada dessas pessoas representa um impacto para as cidades que estão acolhendo, para os serviços locais. E temos trabalhado, demonstrado diuturnamente todo esse esforço para reduzir a pressão, reduzir esse impacto", aponta.
Luiz Fernando ainda afirma que a sociedade local está compreendendo o trabalho em prol dos imigrantes e que há voluntários demonstrando solidariedade para com os refugiados.
O porta-voz também explica que os refugiados têm o desejo comum de retornarem ao países de origem e que isso é identificado tanto no caso dos venezuelanos no Brasil como em outras situações similares ao redor do mundo.
"Todo refugiado quer voltar para casa, ninguém quer ser refugiado, as pessoas são forçados a deixar o seu país por uma série de circunstâncias e sempre alimentam essa esperança de poder retornar, afinal de contas é onde elas têm as suas redes, é onde elas têm os seus grupos de apoio, seus familiares, a sua história está vinculada ao seu país de origem, o país o qual ela foi forçada a deixar", afirma Godinho, que ainda acrescenta que o ACNUR defende o retorno voluntário dos refugiados, uma vez que haja garantias de que isso será feito de forma segura e organizada.
O fluxo migratório deve continuar?
"O que nós podemos dizer é que temos trabalhado para estar preparados para ter uma capacidade de resposta instalada para diferentes cenários, inclusive na possibilidade que haja uma saída negociada dessa crise na Venezuela e que as pessoas possam em algum determinado momento optar voltar. Então, são diferentes cenários com os quais nós trabalhamos mas o mais importante é estar preparado para responder a esses diferentes cenários", conclui Godinho.