À época da assinatura do texto, Bolsonaro já tinha alardeado sua intenção de abandonar o compromisso firmado junto à ONU, alegando que o Pacto feria a soberania nacional. O chanceler Ernesto Araújo tinha feito coro ao posicionamento do presidente, dizendo que a imigração "não pode ser tratada como questão global", mas sim levando em conta "a realidade e a soberania de cada país".
"Para além disso são pessoas — a gente precisa chegar ao básico do básico aqui — e os direitos humanos protegem as pessoas pela sua condição humana, não pela sua nacionalidade", critica a especialista.
Camila afirma que, embora no imaginário popular o Brasil seja visto como um país que acolhe migrantes, somos muito mais exportadores que acolhedores de migração. Dados recentes do Ministério das Relações Exteriores estimam em 1 milhão o número de migrantes vivendo no Brasil, contra 3 milhões de brasileiros vivendo no exterior.
"Essa tradição de acolhimento pode estar muito ligada ao fato das famílias brasileiras terem integrantes vivendo em outras localidades. Elas sabem que essas pessoas sofrem discriminação, negação de direitos básicos mínimos (…) [Internacionalmente], essa decisão vai ser entendida como certo abandono aos brasileiros que estão vivendo no exterior", analisa.
Lei brasileira já prevê garantias superiores às do Pacto, diz professor
Mestre em Direito Internacional pela Universidade de Paris e coordenador do curso de Direito do Ibmec Minas Gerais, Dorival Guimarães Júnior diz interpretar a decisão de Bolsonaro apenas como uma mudança de paradigmas na postura do Brasil diante de organizações internacionais.
Dorival pontua que o Pacto não faz alusão ao refúgio, tema da Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1957 e acrescida pelo Protocolo de 1967 do qual, na visão do professor, "somos rigorosos cumpridores".
"[A decisão] sinaliza apenas uma mudança de condução de política externa brasileira, que deixa de lado o multilateralismo, a preponderância de organismos internacionais na tomada de decisões, e faz com que o Brasil tome decisões individualmente ou bilateralmente como for o caso", pontua.
A decisão do Brasil circulou por meio de correspondência interna às várias missões do Brasil ao exterior, mas ainda não foi formalmente comunicada à ONU. Camila Asano diz que a Conectas e demais organizações internacionais aguardam uma explicação formal para a saída do Pacto.
"O presidente usualmente se manifesta por meio de redes sociais, mas o Itamaraty tem como tradição justicar suas decisões por meio de notas oficiais formais no seu site. Até o momento isso não aconteceu".