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Contramão: enquanto Israel e Ucrânia clamam por munição, Brasil abre mão de fábrica, diz analista
Contramão: enquanto Israel e Ucrânia clamam por munição, Brasil abre mão de fábrica, diz analista
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Marinha do Brasil decide pela concessão da principal fábrica de munições do país ao capital estrangeiro, em mais um golpe à base industrial de defesa nacional... 01.08.2024, Sputnik Brasil
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Nesta quarta-feira (31), a empresa vinculada à Marinha do Brasil EMGEPRON confirmou a sua intenção de conceder uma das principais fábricas de munição brasileiras ao capital estrangeiro. A concessão da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos foi ofertada a empresas de Reino Unido, Suécia, Itália e Israel durante evento realizado no Itaim, em São Paulo.De acordo com a Marinha, a Empresa Gerencial de Projetos Navais (EMGEPRON), em parceria com a Diretoria de Sistemas de Armas da Marinha (DSAM), realizou um "road show" no centro financeiro paulistano, visando a entrega da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos (FAJCMC) à iniciativa privada.A intenção da força é angariar fundos para a "modernização da fábrica" por meio da implementação de "novo modelo de gestão" que alavanque o empreendimento. A Marinha promete publicar os editais ainda neste semestre e concluir a concessão da fábrica por até 20 anos.O bom desempenho nacional e internacional da Fábrica Müller de Campos anima os investidores. Advogado que atua nas tratativas defendeu a concessão, lembrando que "a fábrica é uma das principais produtoras de artefatos militares do mundo e, a partir da concessão à iniciativa privada, certamente vai gerar mais receita", reportou o portal Metrópoles.De fato, a fábrica opera a contento, produzindo munições de qualidade para as Forças Armadas e exportando o seu excedente para parceiros do Brasil no Sul Global. Então, afinal, para que abrir mão dessa fábrica estratégica para o Brasil? A Sputnik Brasil conversou com especialistas para compreender os motivos por trás de mais uma privatização na Base Industrial de Defesa (BID) brasileira.De acordo com o especialista, a concessão da fábrica consiste em "uma estratégia equivocada, que afeta uma área muito sensível para as Forças Armadas que é a de munições. Convenhamos que nada funciona sem munições".A notícia sobre a concessão da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos agrava os ânimos de setores nacionalistas da sociedade brasileira, já insatisfeitos com a possível venda da fábrica de foguetes Avibrás ao capital estrangeiro.Conflitos de larga escala sendo travados na Ucrânia e no entorno de Israel demonstram o caráter essencial das munições no campo de batalha. O Brasil se encontra em posição confortável nessa área, justamente pela produção nacional desses artefatos pela Fábrica Müller de Campos.A concessão da fábrica ao capital internacional também surpreende, uma vez que a Marinha poderia prospectar empresas brasileiras interessadas na empreitada. Como evidenciado no caso da Avibrás, bancos brasileiros demonstram resistência em participar de investimentos na área de defesa."A verdade é que não há nenhuma política para priorizar as compras nacionais", lamentou Farinazzo. "Este é um problema antigo, uma vez que o rearmamento das Forças Armadas deveria estar atrelado ao desenvolvimento da indústria nacional."O aumento da presença estrangeira nas indústrias de defesa nacionais amplia o já considerável nível de dependência externa que as Forças Armadas enfrentam, particularmente no setor de aviação. Nesse sentido, a redução do comprometimento do Executivo com políticas de conteúdo nacional e desenvolvimento tecnológico nacional preocupa.Apesar dos problemas estruturais, Gomes acredita que a sociedade civil organizada poderá agir contra a concessão da Fábrica Müller de Campos ao capital estrangeiro. O especialista cita como exemplo a recente resistência à venda da Avibrás no Congresso Nacional."O projeto de lei sobre a reestatização da Avibrás mostra que existem setores no Brasil que são contra a concessão de empresas da BID a grupos estrangeiros, principalmente no Congresso", disse Gomes. "A mesma mobilização poderá ser feita agora em relação a essa fábrica de munições."Ponta do icebergA concessão da Fábrica Müller de Campos se insere em um contexto mais amplo de retomada da penetração dos EUA e seus aliados da OTAN no setor de defesa brasileiro. As dificuldades dos EUA em manter a sua posição estratégica em regiões como Oriente Médio e África, aliada aos revezes sofridos no conflito ucraniano, levam os EUA a recrudescer o controle sobre o seu entorno geográfico, explica o oficial da reserva da Marinha do Brasil.O aumento das pressões norte-americanas sobre a base industrial de defesa brasileira é evidenciado pelo caso da Avibrás, quando Washington fez gestões para que a empresa chinesa Norinco não fosse considerada como possível compradora da empresa responsável pelos foguetes Astro.Além disso, há renovado entusiasmo norte-americano na venda de seus equipamentos militares para o Brasil. Ainda que obsoletas, essas armas mantêm as Forças Armadas brasileiras atreladas aos padrões da OTAN. Exemplos são a recente compra brasileira de helicópteros Black Hawk e negociações para arrematar um lote de caças F-16 usados.Governo ausenteA mais nova onda de privatizações e concessões de empresas de defesa brasileiras ocorre justamente durante um governo ligado à esquerda, que tradicionalmente adotava posições nacionalistas quanto à indústria brasileira. No entanto, as limitações políticas e financeiras do governo reduzem o papel de Lula e do Palácio do Planalto nas tratativas referentes à BID, lamenta Gomes.Conforme reportado pela Agência Brasil, o governo federal não se disponibilizou a arcar com a dívida da Avibrás, estimada em R$ 700 milhões, ou estatizar definitivamente a empresa. De acordo com o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), "não há condições, nesse momento, de financeiramente o governo entrar nessa"."O orçamento de defesa do Brasil cresce em números absolutos, mas não em porcentagem do PIB, permanecendo na casa dos 1,5%", avaliou Gomes. "Isso se demonstra insuficiente para a modernização das Forças Armadas, que buscam outras alternativas para atrair investimentos e manter os seus projetos funcionando."Na avaliação de Gomes, a concessão à iniciativa privada é uma forma de levantar fundos para bancar projetos estratégicos, já que os R$ 127 bilhões garantidos pelo governo à defesa são majoritariamente revertidos para gastos de pessoal e administrativos."Afirmar que o Brasil tem o objetivo de modernizar as suas Forças Armadas, mas manter o investimento em defesa baixo e revertido para o pagamento de pessoal me parece, para o dizer o mínimo, uma incongruência", concluiu o especialista.
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Contramão: enquanto Israel e Ucrânia clamam por munição, Brasil abre mão de fábrica, diz analista
11:36 01.08.2024 (atualizado: 13:31 01.08.2024) Especiais
Marinha do Brasil decide pela concessão da principal fábrica de munições do país ao capital estrangeiro, em mais um golpe à base industrial de defesa nacional. Nova onda de privatizações de empresas militares brasileiras em contexto geopolítico desfavorável agrava vulnerabilidade nacional, diz analista à Sputnik Brasil.
Nesta quarta-feira (31), a empresa vinculada à Marinha do Brasil EMGEPRON confirmou a sua intenção de conceder uma das principais fábricas de munição brasileiras ao capital estrangeiro. A concessão da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos foi ofertada a empresas de Reino Unido, Suécia, Itália e Israel durante evento realizado no Itaim, em São Paulo.
De
acordo com a Marinha, a Empresa Gerencial de Projetos Navais (EMGEPRON), em parceria com a Diretoria de Sistemas de Armas da Marinha (DSAM), realizou um "road show" no centro financeiro paulistano, visando
a entrega da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos (FAJCMC) à iniciativa privada.
A intenção da força é angariar fundos para a "modernização da fábrica" por meio da implementação de "novo modelo de gestão" que alavanque o empreendimento. A Marinha promete publicar os editais ainda neste semestre e concluir a concessão da fábrica por até 20 anos.
O bom desempenho nacional e internacional da Fábrica Müller de Campos anima os investidores. Advogado que atua nas tratativas defendeu a concessão, lembrando que "a fábrica é uma das principais produtoras de artefatos militares do mundo e, a partir da concessão à iniciativa privada, certamente vai gerar mais receita",
reportou o portal Metrópoles.
De fato, a fábrica opera a contento, produzindo munições de qualidade para as Forças Armadas e exportando o seu excedente para parceiros do Brasil no Sul Global. Então, afinal, para que abrir mão dessa fábrica estratégica para o Brasil? A Sputnik Brasil conversou com especialistas para compreender os motivos por trás de mais uma privatização na Base Industrial de Defesa (BID) brasileira.
"Infelizmente, a privatização de fábricas de defesa não é novidade no Brasil. Existe uma ideia de que toda empresa que não dá lucro está dando prejuízo ao Estado brasileiro", disse o pesquisador do Núcleo de Avaliação da Conjuntura da Escola de Guerra Naval, Rafael Esteves Gomes, à Sputnik Brasil. "Mas sabemos que em setores estratégicos a lógica de mercado se aplica de forma um pouco diferente."
A notícia sobre a concessão da Fábrica de Munição Almirante Jurandyr da Costa Müller de Campos agrava os ânimos de setores nacionalistas da sociedade brasileira, já insatisfeitos com a possível venda da fábrica de foguetes Avibrás ao capital estrangeiro.
"O Brasil não está olhando para o contexto internacional quando decide abrir mão de fábricas de munições ou da Avibrás", disse o especialista militar e oficial da reserva da Marinha do Brasil Robinson Farinazzo à Sputnik Brasil. "Estamos em um momento tenso geopoliticamente, com as principais potências se rearmando até os dentes. E o Brasil, ao contrário, abrindo mão das suas capacidades militares e tecnológicas."
Conflitos de larga escala sendo travados na Ucrânia e no entorno de Israel demonstram o caráter essencial das munições no campo de batalha. O Brasil se encontra em posição confortável nessa área, justamente pela produção nacional desses artefatos pela Fábrica Müller de Campos.
"Vemos os EUA modernizando suas fábricas de munição a toque de caixa, vemos as Forças Armadas de Israel e Ucrânia desesperadas atrás de munições no mercado mundial. E o Brasil, por incrível que pareça, se desfazendo da sua fábrica", considerou Farinazzo. "A fábrica tem bons balanços, exporta e é bem-sucedida, não sei qual o cálculo por trás dessa decisão."
A concessão da fábrica ao capital internacional também surpreende, uma vez que a Marinha poderia prospectar empresas brasileiras interessadas na empreitada. Como evidenciado no caso da Avibrás,
bancos brasileiros demonstram resistência em participar de investimentos na área de defesa.
"A verdade é que não há nenhuma política para priorizar as compras nacionais", lamentou Farinazzo. "Este é um problema antigo, uma vez que o rearmamento das Forças Armadas deveria estar atrelado ao desenvolvimento da indústria nacional."
O aumento da presença estrangeira nas indústrias de defesa nacionais amplia
o já considerável nível de dependência externa que as Forças Armadas enfrentam, particularmente no setor de aviação. Nesse sentido, a redução do comprometimento do Executivo com políticas de conteúdo nacional e desenvolvimento tecnológico nacional preocupa.
"Falemos claramente: outros países não repassarão tecnologia militar de ponta para o Brasil", considerou Farinazzo. "Ninguém vai te ensinar a fazer procedimentos sensíveis na área militar. O Brasil é quem precisa desenvolver suas capacidades e autonomia."
Apesar dos problemas estruturais, Gomes acredita que a sociedade civil organizada poderá agir contra a concessão da Fábrica Müller de Campos ao capital estrangeiro. O especialista cita como exemplo a recente resistência à venda da Avibrás no Congresso Nacional.
"O projeto de lei sobre a reestatização da Avibrás mostra que existem setores no Brasil que são contra a concessão de empresas da BID a grupos estrangeiros, principalmente no Congresso", disse Gomes. "A mesma mobilização poderá ser feita agora em relação a essa fábrica de munições."
A concessão da Fábrica Müller de Campos se insere em um contexto mais amplo de retomada da penetração dos EUA e seus aliados da OTAN no setor de defesa brasileiro. As dificuldades dos EUA em manter a sua posição estratégica em regiões como Oriente Médio e África, aliada aos revezes sofridos no conflito ucraniano, levam os EUA a recrudescer o controle sobre o seu entorno geográfico, explica o oficial da reserva da Marinha do Brasil.
"O que sobra para os EUA nesse contexto são o seu quintal América Latina. A intenção é criar um clientelismo militar na América Latina, de maneira que, em caso de conflito, a região não tenha para onde correr", disse Farinazzo. "Já vemos os EUA fomentando a dependência das Forças Armadas de países como Argentina e Colômbia, vemos as pressões sobre o Peru e Equador. O Brasil precisa se preparar para isso e buscar um caminho para garantir a sua independência."
Além disso, há renovado entusiasmo norte-americano na venda de seus equipamentos militares para o Brasil. Ainda que obsoletas, essas armas mantêm as Forças Armadas brasileiras atreladas aos padrões da OTAN. Exemplos são a recente compra brasileira de helicópteros Black Hawk e negociações para arrematar um lote de caças F-16 usados.
A mais nova onda de privatizações e concessões de empresas de defesa brasileiras ocorre justamente durante um governo ligado à esquerda, que tradicionalmente adotava posições nacionalistas quanto à indústria brasileira. No entanto, as limitações políticas e financeiras do governo reduzem o papel de Lula e do Palácio do Planalto nas tratativas referentes à BID, lamenta Gomes.
"O governo infelizmente está dando pouca atenção para a indústria de defesa, o que é preocupante. Prometeu investir, mas não entregou", disse o pesquisador da Escola de Guerra Naval. "O marco fiscal é um dos motivos pelos quais o governo resiste a investir mais na BID ou a assumir a dívida da Avibrás, por exemplo."
Conforme
reportado pela Agência Brasil, o governo federal não se disponibilizou a arcar com a dívida da Avibrás, estimada em R$ 700 milhões, ou estatizar definitivamente a empresa. De acordo com o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), "não há condições, nesse momento, de financeiramente o governo entrar nessa".
"O orçamento de defesa do Brasil cresce em números absolutos, mas não em porcentagem do PIB, permanecendo na casa dos 1,5%", avaliou Gomes. "Isso se demonstra insuficiente para a modernização das Forças Armadas, que buscam outras alternativas para atrair investimentos e manter os seus projetos funcionando."
Na avaliação de Gomes, a
concessão à iniciativa privada é uma forma de levantar fundos para bancar projetos estratégicos, já que os R$ 127 bilhões garantidos pelo governo à defesa são majoritariamente revertidos para gastos de pessoal e administrativos.
"Afirmar que o Brasil tem o objetivo de modernizar as suas Forças Armadas, mas manter o investimento em defesa baixo e revertido para o pagamento de pessoal me parece, para o dizer o mínimo, uma incongruência", concluiu o especialista.
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