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Corrida pelo Ártico pode ter como 'prêmio' a inviabilização da vida humana na Terra, alerta analista

© AP Photo / David KeytonQuebra-gelo finlandês navega pelo gelo flutuando no mar de Beaufort, na costa do Alasca, onde o aquecimento global está derretendo o gelo marinho a uma taxa histórica, abrindo o Ártico como nunca antes. Mar de Chukchi, 16 de julho de 2017
Quebra-gelo finlandês navega pelo gelo flutuando no mar de Beaufort, na costa do Alasca, onde o aquecimento global está derretendo o gelo marinho a uma taxa histórica, abrindo o Ártico como nunca antes. Mar de Chukchi, 16 de julho de 2017 - Sputnik Brasil, 1920, 05.08.2024
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Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analista aponta que a disputa pelo Ártico é "tratada de maneira irresponsável", o que leva ao derretimento do gelo marítimo, que não captura apenas água, mas gases do efeito estufa que acabam liberados na atmosfera com o degelo.
Ao contrário da Antártica, o Ártico não possui terra firme, sendo formado por um conjunto de calotas de gelo de águas salinas. Porém, sua plataforma continental é disputada por conta dos recursos naturais que permanecem intocados sob a camada de gelo.
Em decorrência disso, países como os Estados Unidos, por exemplo, chegaram a expandir de maneira arbitrária e unilateral os limites de sua plataforma continental no Ártico para garantir recursos minerais estratégicos presentes no fundo marinho da região.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, Pedro Allemand Mancebo Silva, pesquisador e doutorando em relações internacionais na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), alerta que a disputa desenfreada na região pode ter graves efeitos colaterais para a vida na Terra.
Silva afirma que o Ártico era uma região tranquila, mas isso mudou após o final da Segunda Guerra Mundial, quando passou a ser o ponto de contato entre as duas potências globais: União Soviética e EUA.

"Então [na época] ele vira esse ponto de contato muito importante, mas, ainda assim, a política para a região é muito uma política da dissuasão. Então é você construir a capacidade de controle e monitoramento da região", explica.

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O segundo e decisivo passo que consolidou a disputa territorial na região veio em 2008, quando um relatório do Serviço Geológico dos Estados Unidos apontou que 13% das reservas inexploradas de petróleo do planeta e 30% das reservas de gás natural inexploradas estão sob o gelo do Ártico.
Silva afirma que, a partir de então, o Ártico passou a desempenhar um papel estratégico, sobretudo quando foi descoberta a existência de jazidas de minerais raros inexploradas na região.
"Isso é super-recente porque a preocupação com a transição energética envolve uma preocupação justamente com os materiais que vão ser necessários para essa transição. E os minerais de terras-raras são muito importantes para esse tipo de investimento. Então, por exemplo, eles são usados não apenas na produção de células fotovoltaicas, como também são usados para a construção de sistemas digitais dos sistemas de controle. Tudo isso recoloca o Ártico como uma região importante, uma região com recursos importantes para a economia global — não apenas para a economia regional, mas para a economia do mundo como um todo."
O especialista sublinha que, atualmente, o principal vetor da política internacional do Ártico é o Conselho do Ártico, organização intergovernamental fundada em 1996, que tem oito Estados-membros permanentes, que são os Estados árticos: Estados Unidos, Canadá, Islândia, Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia e Rússia.
Ele afirma que o conselho é um "clube muito fechado", majoritariamente composto por países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), e que "qualquer outro país que quiser entrar, ele entra na condição de observador, que não tem direito ao voto". No entanto, ele observa que cada vez o que se vê no Conselho do Ártico é "uma polarização muito clara na linha OTAN-Rússia".

"Hoje em dia, praticamente os membros do Conselho do Ártico são a OTAN de um lado e a Rússia de outro. Você não tem nenhum país-membro que não seja membro da OTAN ou que não seja a Rússia", diz Silva.

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Entretanto, Silva afirma que a entrada da China e da Índia como membros observadores, mesmo que sem direito a voto, trouxe o BRICS para dentro do Conselho do Ártico. Ademais, o Brasil também tem interesse em fazer parte do Conselho, conforme apontou neste ano o embaixador do Brasil em Moscou, Baena Soares.
O especialista afirma que o fato de o Ártico ser tão rico em gás e petróleo levanta preocupações porque traz como consequência a possibilidade do fim da vida humana na Terra.
"Se o Ártico for explorado como querem que ele seja explorado, a gente está numa situação muito grave, porque toda exploração, tanto a exploração baseada em hidrocarbonetos como a exploração mineral, envolve maiores emissões locais e, mesmo sem grandes emissões locais, o Ártico já aquece de duas a quatro vezes mais rápido do que o restante do planeta."
Ele adverte que a corrida pelos recursos do Ártico é "tratada de maneira irresponsável", "como se fosse uma mera corrida: quem pegar primeiro, pegou e vai ganhar".

"Só que o prêmio final pode ser a inviabilização da nossa vida na Terra, porque é uma região que é muito sensível. É uma região que já está sofrendo de forma muito aguda com as transformações climáticas."

Questionado se a Petrobras, com sua ampla experiência em exploração de petróleo em águas profundas, poderia trazer expertise caso fosse chamada a participar da exploração, Silva afirma que antes de 2014 havia diversas empresas ocidentais trabalhando em parceria com as russas Gazprom e Rosneft na exploração da região.
Porém, essas parcerias se encerraram após a eclosão do conflito ucraniano e o vácuo deixado foi ocupado por companhias chinesas. Nesse contexto, ele afirma que há margem para a possibilidade de a Petrobras ser chamada a participar um dia.
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"Eu acredito que a Petrobras, dependendo de como ela se posicionar, pode se beneficiar desse tipo de exploração e pode absorver know-how, desenvolver atividade lá", afirmou o pesquisador, ressaltando a importância da transição energética por outro lado.

Silva aponta que a navegação no Ártico, sem a necessidade do uso de navios quebra-gelo, se tornou viável por conta do aquecimento global.
"Desde 2017, por exemplo, você tem travessias cada vez mais frequentes durante o inverno no Ártico, o que significa que a espessura do gelo está diminuindo […], como também está diminuindo o período de congelamento. Porque antes você tinha um período de congelamento total, então não tinha nem como navegar."
Silva acrescenta que o aumento das travessias no Ártico também contribui para o degelo na região. Ademais, o derretimento do gelo do Ártico em si também é um fator que potencializa o aquecimento global. Isso porque o gelo marítimo não captura apenas água, mas também gases do efeito estufa, que acabam liberados na atmosfera com o degelo.

"Então isso é um perigo para acelerar o efeito estufa. Liberando mais gases do efeito estufa, você aumenta ainda mais a taxa pela qual o planeta está esquentando e, com isso, aumenta ainda mais a taxa pela qual o próprio Ártico está esquentando", alerta Silva.

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