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Ocidente seguirá calado frente ao apoio ucraniano a terroristas que desestabilizam o Sahel africano?

© AP Photo / Jerome DelayForças da Nigéria e do Chade participam de exercício conjunto coordenado pelos EUA, com o objetivo de combater a ameaça terrorista na região do Sahel na África Central
Forças da Nigéria e do Chade participam de exercício conjunto coordenado pelos EUA, com o objetivo de combater a ameaça terrorista na região do Sahel na África Central - Sputnik Brasil, 1920, 16.08.2024
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Em meio a um conflito armado que já dura mais de 12 anos no Mali e que deixou cerca de 8,8 milhões de pessoas em situação de fome, a Ucrânia é acusada de apoiar grupos terroristas no Sahel que trazem ainda mais instabilidade para a região. Enquanto países rompem relações com Kiev em retaliação, o Ocidente seguirá calado frente à situação?
Desde o fim do último mês, autoridades do Mali e da Mauritânia, na região do Sahel africano, investigam o envolvimento de instrutores militares e da inteligência ucraniana com rebeldes separatistas apoiados por grupos como o Daesh (também conhecido como Estado Islâmico, organização terrorista proibida na Rússia e em outros países), o que gera uma situação constante de insegurança, deslocamento em massa e situação humanitária caótica.
Em retaliação às intervenções, o Mali e o Níger, em solidariedade, decidiram romper relações diplomáticas com Kiev. Enquanto isso, a Rússia, que está em conflito com a Ucrânia e conta com amplo apoio dos países africanos em meio à histórica cooperação no continente, declarou por meio da representante oficial do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, que o apoio ucraniano aos terroristas não surpreende, e pediu a atenção da comunidade internacional à atuação de Kiev.
O pesquisador do Laboratório de Geopolítica, Relações Internacionais e Movimentos Antissistêmicos (LabGRIMA) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Jean-Carlo Gouveia avaliou ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, que vê como mínimas as chances de o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) e de outras entidades do sistema agirem contra a Ucrânia, principalmente por conta da pressão das potências ocidentais.
#424 Mundioka  - Sputnik Brasil, 1920, 16.08.2024
Mundioka
Qual a relação entre a Ucrânia e os grupos terroristas na África?

"Temos países que bloqueiam constantemente temas relacionados à Rússia e também os países africanos ainda enfrentam certo preconceito dentro dos âmbitos da ONU. Então a probabilidade de que haja alguma grande movimentação sobre isso, acredito que não exista essa possibilidade. Mas dentro de outros âmbitos [nas Nações Unidas], como a Assembleia Geral, pode haver aí uma mobilização um pouco maior, mas de forma objetiva", declarou.

Para o especialista, a possível interferência da Ucrânia com grupos terroristas na África é "um gol fora", já que a região possui amplas relações diplomáticas e comerciais com a Rússia.
"E, de certa forma, sim, a Ucrânia fez essa ação de apoiar um grupo separatista, que inclusive pegou muito mal na África e que pode ter um reflexo muito negativo na própria Europa. Os tuaregues são um grupo que atua ali na África, mas também junto com separações africanas da Al-Qaeda e do Estado Islâmico", acrescenta, ao lembrar que a região vive um processo de descolonização das potências ocidentais.
Além disso, o pesquisador lembra que Níger e Mali estão no "centro dos acontecimentos geopolíticos nos últimos anos na África", inclusive com ações históricas, como a expulsão do Exército da França da região.
"São países muito importantes na comunidade econômica do oeste africano. Então pode haver uma repercussão muito grande [do apoio ucraniano aos separatistas], uma vez que a Rússia tem afinidade e importância também muito grande para o continente", pontuou.
A representante oficial do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, durante uma entrevista coletiva em 2 de outubro de 2017 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2024
Panorama internacional
Zakharova: ruptura das relações do Níger com Ucrânia mostra que África compreende natureza de Kiev
A situação, até mesmo, pode levar a uma proximidade ainda maior com Moscou, avalia Gouveia.
"A África não precisa de ainda mais conflitos, e com certeza esse ataque [realizado pelos separatistas, que provocou a morte de militares do Mali e do grupo russo Wagner] na região, com o envolvimento ucraniano, já trouxe retaliação ao país […]. Acredito que se a Ucrânia continuar a bater nessa tecla, pode ser ainda mais nocivo para a sua imagem, e consolida a Rússia, que já é benquista no continente, não ficando apenas na região do Sahel, que é onde a gente está discutindo bastante, mas [também] no resto do continente", enfatizou.
Já a principal entidade do continente, a União Africana ainda não se posicionou "de maneira mais ativa" sobre a situação, segundo o especialista.
"Ela apenas manifesta que é uma lástima qualquer interferência externa nos países africanos e que busca a paz. É um posicionamento, de certa maneira, tradicional, mas de certa forma a gente pode extrair que há um repúdio dos países, tanto de países-chave dentro da organização contra esses acontecimentos".

Qual é a importância da África no cenário mundial?

O pesquisador da UFPel defendeu que o continente africano, apesar de ser menosprezado pelas potências ocidentais como um ator global relevante, reflete diariamente situações que ocorrem no sistema internacional, como a relação Rússia e Ucrânia.

"O continente africano, por si só também, já é muito interessante. A gente tem todos esses acontecimentos geopolíticos que tomaram lugar nos últimos anos e que não recebem a atenção devida. Então eu acredito que exista essa mistura de ser um continente que tem muito protagonismo interno e intracontinental, que é muito interessante e que também, ao mesmo tempo, recebe esses reflexos do que acontece [no mundo]. A África está muito próxima da Europa, está muito perto da Península Arábica do Oriente Médio e também tem relações muito fortes com a América. Então acaba sendo um continente-chave, eu acredito", resume, ao lembrar que três países africanos fazem parte do BRICS (Egito, Etiópia e África do Sul), além da União Africana, que reúne 55 países, ter entrado no ano passado no G20.

OTAN incentiva propagação de ainda mais conflitos na África?

O professor associado e vice-diretor do Instituto de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Vitor Stuart de Pieri, acrescentou ao podcast Mudioka que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que também fornece armas e munições a Kiev no conflito contra a Rússia, atua para incentivar países como Nigéria, Senegal e Costa do Marfim a confrontarem Níger, Mali e Burkina Faso, na região do Sahel.

"Esses últimos buscam defender a perspectiva de descolonização através de parcerias com países como a Rússia. E, por outro lado, não digo nem a Ucrânia, mas o mundo ocidental, que sempre com a desculpa de que estão combatendo terroristas, como no norte da Nigéria, acabam investindo em outros que desrespeitam os limites territoriais de países como Níger e Mali", enfatiza.

Já com relação ao rompimento diplomático com a Ucrânia iniciado no continente, o especialista avalia como um movimento "muito significativo" e demonstra que esses países, apesar de pobres e de conviverem com grande desigualdade, possuem voz e influência no cenário internacional.
"Além disso, são regiões que exportam urânio, especialmente para a França, cuja matriz energética é muito dependente da energia nuclear. A gente tem que lembrar que o abastecimento de gás na Europa está afetado e o gasoduto da Nigéria, país com muito gás e petróleo, atravessa o Níger, em sentido à Europa. Então, o corte de relações com a Ucrânia é uma mensagem definitiva ao mundo ocidental em geral", finalizou.
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