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Bandeira do bolsonarismo: apoio a Israel em meio a guerra deixou de ser um cabo eleitoral no Brasil?

© Fernando Frazão/Agência BrasilEleitores comemoram a eleição do candidato Jair Bolsonaro nas eleições de 2018 em carro de som. Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2018
Eleitores comemoram a eleição do candidato Jair Bolsonaro nas eleições de 2018 em carro de som. Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2018 - Sputnik Brasil, 1920, 11.10.2024
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Há pouco mais de um ano, a guerra promovida por Israel contra o Hamas na Faixa de Gaza entrava como mais um elemento na já extrema polarização do mundo. De um lado, apoiadores das ações israelenses, enquanto outros denunciavam o genocídio contra palestinos. E no bolsonarismo não podia ser diferente: defender Tel Aviv.
Em meio à multidão vestida de verde e amarelo, algumas bandeiras chamavam a atenção nos atos bolsonaristas que tomaram conta do país nos últimos anos: as de Israel. Das motociatas às celebrações do 7 de Setembro que, com o tempo, foram se esvaziando, a demonstração de apoio ao país judeu se fortalecia ainda mais após o ataque promovido pelo Hamas em 7 de outubro de 2023. No outro espectro político brasileiro, liderado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eram iniciados discursos mais fortes contra os bombardeios israelenses à Faixa de Gaza, que passaram a ser taxados como genocídio contra a população palestina.
Após comparar, no início do ano, as ações militares israelenses no Oriente Médio ao Holocausto nazista, Lula chegou a ser considerado por Israel persona non grata, o que, na prática, significa que o petista não era mais bem-vindo no país. No Congresso Nacional, deputados bolsonaristas reagiram com ameaças até de um pedido de impeachment, enquanto o embaixador israelense Daniel Zonshine se encontrava em Brasília (DF) com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Meses depois, o assunto praticamente desapareceu da pauta política brasileira, inclusive no palanque, mesmo com a repetição da fórmula similar à que Tel Aviv aplicou em Gaza no Líbano desde o fim de setembro e a possibilidade cada vez maior de uma guerra total na região. Esse fenômeno demonstra que o apoio a Israel deixou de ser um cabo eleitoral para o bolsonarismo, mesmo em um período em que milhões de brasileiros vão às urnas?
O cientista político e presidente do Instituto Cultiva, Rudá Ricci, explica à Sputnik Brasil que um dos motivos desse "sumiço" são justamente as eleições municipais. "É um período em que são tratados temas mais locais e pautas cotidianas dos brasileiros. Mesmo quando você polariza, o discurso não passa pela política internacional [como ocorre nas eleições gerais]. Raramente aconteceu de um pleito municipal ter algum tema da agenda global. Além disso, quem ganhou a eleição no Brasil foi o centrão, movido pelo clientelismo, que nada mais é do que tratar de questões do dia a dia, como asfalto, hospital, iluminação. Isso não deixa espaço para entrar nessa pauta de guerra", enfatiza.
Bandeira de Israel em rua de Tel Aviv. - Sputnik Brasil, 1920, 01.11.2023
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Neste momento, acrescenta Ricci, o bolsonarismo também está mais voltado para assuntos como a limitação dos Poderes do Supremo Tribunal Federal (STF) e os embates com o ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo bloqueio da rede social X (antigo Twitter) por mais de um mês no Brasil.
"Agora, isso significa que vai sumir do mapa? Não, porque, como eu falei, Israel é uma espécie de ícone [para o bolsonarismo]. Mas também há várias sinalizações de que Israel passou a gerar um certo incômodo, principalmente por conta das suas ações desumanas. Além disso, há um isolamento internacional, em especial na ONU [Organização das Nações Unidas], na medida em que o governo de Israel vai transformando muitas autoridades em persona non grata, inclusive o secretário-geral da ONU [António Guterres]. Então pode ser um problema aqui no Brasil ficar defendendo", diz.
Prova disso é o vídeo divulgado por Bolsonaro, em que desejou feliz ano-novo judaico a Israel no início de outubro: o ex-presidente pediu "paz para o mundo" e não citou ou defendeu a guerra promovida por Tel Aviv. Aliado a isso, o então líder do movimento que leva seu sobrenome, inclusive, vê surgir "duas grandes pedras no caminho" para manter sua liderança, como Pablo Marçal (PRTB) que, por pouco, não foi para o segundo turno em São Paulo, e o governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

"Bolsonaro saiu menor nessa eleição municipal […]. Do campo bolsonarista, quem se saiu muito bem foi o próprio Tarcísio e o [deputado federal] Nikolas Ferreira, que ajudou a eleger mais de 20 prefeitos em Minas Gerais e até o vereador mais votado em Belo Horizonte. Talvez a pauta internacional seja o que resta para o ex-presidente se diferenciar e aparecer, tentando galvanizar os apoiadores dele. Mas ele saiu bem machucado desse pleito. Inclusive, é por isso que o Silas Malafaia foi para o ataque", defende.

Qual a ligação entre Israel e o bolsonarismo?

O doutor em ciências sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) Robson Sávio Reis Souza lembra que a aproximação entre Israel e os segmentos políticos, como o bolsonarismo, é um fenômeno que ocorre há alguns anos em todo o mundo.
"É uma ligação com o sionismo, que é uma corrente do judaísmo que defende a ideia de um Estado a partir de certa leitura bíblica, com um país até maior do que atual, abrangendo toda a Palestina e parte do Líbano. Essa linha de pensamento articula com setores muito fortes do campo do pentecostalismo evangélico, principalmente de base estadunidense, onde também é muito forte a influência do judaísmo. Também acontece em setores do catolicismo, que chamamos de fundamentalistas ultraconservadores. A ideia que articula esses dois grupos religiosos é em torno de um projeto de poder", argumenta. E entre a principal base eleitoral de Bolsonaro estão os evangélicos.
Como o Brasil é de ampla maioria cristã e com forte presença de religiões evangélicas, esse discurso caiu como uma luva também na política, aponta Souza.
"Está cada vez mais claro que o [Benjamin] Netanyahu trabalha nessa perspectiva de se manter no poder sem nenhum limite bélico. Isso tem feito com que haja reposicionamento de setores da imprensa internacional, sem aquele apoio tão explícito e incondicional ao avanço da guerra. Enquanto havia um discurso somente de defesa do Estado de Israel, havia quase uma unanimidade nos setores conservadores mais à direita. É muito importante, que fique bem claro, que essa articulação do sionismo não se dá na direita de um modo geral, mas na extrema-direita", acrescenta.
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Apesar das eleições municipais serem pautadas pelas questões mais locais, diversas candidaturas usaram a bandeira de Israel como um dos motes, mesmo que em número não tão expressivo quanto antes. Além disso, o especialista lembra da discussão entre Marçal e o candidato do PSOL a prefeito de São Paulo, Guilherme Boulos, quando o ex-coach "evocou o Antigo Testamento". Para a disputa presidencial em 2026, Robson Sávio acredita que a temática israelense e sua atuação no Oriente Médio terá um peso muito forte nas campanhas.

"Certamente essa questão virá à tona nas eleições de 2026. Ela está um pouco incubada neste momento, até porque a pauta municipal tem um pouco de diferença, mas certamente voltará com muita força […]. Em relação à postura de segmentos da esquerda [de defesa da população palestina], é importante lembrar que o Estado de Israel foi criado em 1947, e a ONU também previa a criação da Palestina. Desde então, Israel tem ocupado cada vez mais territórios palestinos, desrespeitando as resoluções da ONU que pedem a desocupação, até que esse ato terrorista do Hamas deflagrou a guerra que foi muito oportuna para Benjamin Netanyahu. Ele é uma figura da extrema-direita e buscou controlar o Judiciário de Israel. Por conta disso, estava muito enfraquecido. Porém, a guerra deu a ele uma oportunidade de retomar o poder", finaliza.

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