- Sputnik Brasil, 1920
Panorama internacional
Notícias sobre eventos de todo o mundo. Siga informado sobre tudo o que se passa em diferentes regiões do planeta.

Compra da Groelândia é 'bravata': Trump usa fraqueza da Europa contra ela própria, notam analistas

© AP Photo / Alex BrandonDonald Trump sorri em comício em West Palm Beach, Flórida. EUA, 6 de novembro de 2024
Donald Trump sorri em comício em West Palm Beach, Flórida. EUA, 6 de novembro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 15.01.2025
Nos siga no
Especiais
Analistas ouvidos pela Sputnik Brasil dizem que a ameaça de Trump de ocupar ou comprar a ilha traria instabilidade, mas não mudaria a balança de poder na região, onde os EUA são sócios majoritários e os europeus minoritários, e que o objetivo real do republicano é elevar a submissão de aliados europeus fragilizados por conta do conflito ucraniano.
Antes mesmo de assumir a Casa Branca, o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, já coleciona declarações polêmicas. Após afirmar que vai promover deportações em massa e taxar em 100% os países do BRICS, na semana passada ele afirmou que não descarta usar a força militar para tomar o controle e ocupar a Groenlândia e o canal do Panamá, que apontou serem cruciais para a segurança nacional dos EUA. Dias depois, um grupo de deputados republicanos da Câmara dos Representantes elaborou um projeto de lei que autoriza Trump a negociar a compra da ilha.
Rica em minerais, petróleo e gás e localizada em uma região cada vez mais disputada, entre o Atlântico Norte e o Ártico, a Groenlândia tem sido uma obsessão de Trump desde o seu primeiro mandato (2017–2021). Com cerca de 56 mil habitantes, a ilha foi uma colônia da Dinamarca, um dos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), até 1953. Ela continua sendo parte do reino da Dinamarca, mas em 1979 se tornou uma região autônoma.
Hugo Albuquerque, jurista, editor da Autonomia Literária e analista geopolítico, afirma que a aquisição da Groenlândia poderia se dar com a independência em relação à Dinamarca e a transformação dela em um protetorado. Ele afirma que essa seria a tendência, na medida em que nem a Dinamarca nem a União Europeia (UE) têm procurado ocupar devidamente a ilha.

"Quando os EUA miram adquirir a Groenlândia, aquilo sai de um status quase neutro de um país-membro da OTAN, que é pequeno, que é a Dinamarca, para o país líder da OTAN e que é uma superpotência militar [os EUA]", afirma.

O então presidente dos EUA, Donald Trump, faz anúncio sobre as relações comerciais dos EUA com a China e Hong Kong, no Rose Garden, na Casa Branca. Washington, D.C., 29 de maio de 2020 - Sputnik Brasil, 1920, 08.01.2025
Panorama internacional
Ameaçando Panamá e Dinamarca, Trump procura 'manter o poder tecnológico e geopolítico', diz analista
Ele destaca que, embora menor do que aparece no mapa-múndi, a Groenlândia é um território bem grande como ilha, que por conta de sua posição geográfica é estratégica para o controle do Polo Norte. Ademais, há uma questão econômica envolvida, sobretudo com o processo de degelo causado pelas mudanças climáticas, uma vez que a ilha aparentemente é rica em recursos naturais.
Porém ele afirma que as declarações de Trump sobre a Groenlândia também são uma forma de tensionar a Europa e parceiros europeus na OTAN. Segundo ele, a ideia é aumentar o poder de submissão dos EUA em relação aos parceiros ocidentais de Washington, algo que também pode ser observado nas declarações dadas pelo republicano sobre anexar o Canadá.

"Trump, na realidade, está mirando a Dinamarca na questão groelandesa, mas mira o Reino Unido na questão do Canadá. O rei da Inglaterra é chefe de Estado do Canadá. Isso tem a ver com o desejo de Trump de aumentar o poder dele de submissão sobre seus parceiros ocidentais. […] já que a OTAN, já que a Europa, está em conflito com a Rússia, aliás provocado pelos EUA, agora ele está usando essa posição de fraqueza da Europa contra ela própria, para obter vantagens em vários níveis."

O ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Noël Barrot, durante a conferência anual de embaixadores franceses no Centro Internacional de Conferências do Ministério das Relações Exteriores da França, Paris, 6 de janeiro de 2025. - Sputnik Brasil, 1920, 08.01.2025
Panorama internacional
Chanceler francês sobre Trump e Groenlândia: época da lei do mais forte retorna
Sobre a declaração de Trump relativa a ocupar militarmente o canal do Panamá, Albuquerque afirma que ela tem como alvo a China e o fluxo de mercadorias que abastece o país asiático, e a Venezuela, já que a Colômbia deixou de ser "uma grande base militar" dos EUA na América do Sul.
"Retomar o controle do canal do Panamá por motivos mentirosos tem a ver com uma política de controle que mira certamente a China, mas também é um jeito de colocar tropas próximo à Venezuela e também à Colômbia, já que os EUA perderam, pelo menos no curto prazo, o controle político sobre a Colômbia, com a eleição de Gustavo Petro", enfatiza.
Para Luiz Felipe Osório, professor de relações internacionais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e autor do livro "Imperialismo, Estado e Relações Internacionais", a ocupação ou compra da Groelândia não parece, pelo menos agora, "uma proposta factível do governo Trump".
"Parece, sim, mais uma bravata de um ator político que vive mobilizando sua base, seja no poder ou não, na vitória e na derrota, como já testemunhamos em outras ocasiões. Enquanto ainda não assume o mandato, ele [Trump] busca se fortalecer internamente, até para poder emplacar nomes mais próximos a ele nos cargos dentro do governo, em meio às disputas internas da facção vencedora da eleição."
Ele acrescenta que não parecer haver um movimento articulado para a tomada da Groelândia porque os EUA já têm uma posição bastante privilegiada no Atlântico Norte, a partir da OTAN.

"Não seria nem uma ocupação militar inédita estadunidense na Europa, pois desde a Segunda Guerra Mundial os americanos já possuem bases militares importantes na porção ocidental do continente, principalmente na Alemanha e na Itália. O equilíbrio de poder no Atlântico Norte, aliás, é um condomínio em que os EUA são os sócios majoritários e os europeus os minoritários, que está firmado há quase 80 anos, e recentemente se podem ver atos relacionados à submissão, como as sanções europeias à guerra na Ucrânia."

Na avaliação de Osório, a compra da Groelândia pelos EUA traria muita instabilidade no contexto global, mas não mudaria tanto assim o cenário regionalmente por dois fatores: a dominância estadunidense no Atlântico Norte e a relação mais histórica do que politicamente estreita entre Groenlândia e Dinamarca.
Justin Trudeau, primeiro-ministro canadense, fala antes de Joe Biden, presidente dos EUA, no parlamento canadense, Ottawa, Canadá, 24 de março de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 13.01.2025
Panorama internacional
Trudeau afirma que o Canadá imporá tarifas aos EUA se Trump cumprir sua ameaça
Já no contexto militar, ele afirma que a compra poderia render aos EUA o controle sobre os recursos naturais da ilha e uma proximidade maior dos EUA em relação à região do Ártico, atualmente alvo de disputa com a Rússia e outras potências próximas do território.

"Ainda assim, não me parece que os EUA queiram ir muito além. A política externa indicada por Trump e seu círculo político é a do isolacionismo em relação à Europa, mantendo, mas sem muito apoio e financiamento direto, a OTAN", explica.

Osório sublinha que o discurso de Trump sobre a Groelândia foi direcionado a inflamar sua base e ganhar pontos nas disputas internas dentro do governo que se forma, e a ilha entrou na retórica por sua condição autônoma e por estar no entorno regional de segurança dos EUA.
"As falas são arroubos que não se preocupam em cultivar quaisquer laços multilaterais, mas sim cativar o público interno e até os aliados externos mais próximos. São movimentos militares muito improváveis e sem grande sentido geopolítico.
Segundo ele, entre as declarações recentes de Trump, a que mais chama atenção é a ameaça de ocupação militar do canal do Panamá, que indica que o que deve se acirrar no segundo mandato do republicano são as disputas comerciais, principalmente com a China.

"E o canal do Panamá é um ponto nodal no comércio marítimo, fundamental para os dois países. O controle militar significaria a possibilidade de ter uma política tributária e fiscal seletiva, prejudicando os concorrentes e favorecendo os EUA, além, claro, de esvaziar e de inviabilizar o projeto apoiado pela China da construção de um segundo canal interoceânico na região, só que na Nicarágua, o que poderia ser um grande foco de tensão regional e mundial. No mais, as falas não passam de bravatas sem qualquer efeito prático. Como diz o povo, cão que ladra não morde", conclui o especialista.

Logo da emissora Sputnik - Sputnik Brasil
Acompanhe as notícias que a grande mídia não mostra!

Siga a Sputnik Brasil e tenha acesso a conteúdos exclusivos no nosso canal no Telegram.

Já que a Sputnik está bloqueada em alguns países, por aqui você consegue baixar o nosso aplicativo para celular (somente para Android).

Feed de notícias
0
Para participar da discussão
inicie sessão ou cadastre-se
loader
Bate-papos
Заголовок открываемого материала