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Padecendo de alta evasão, o que as Forças Armadas podem fazer para manter seu quadro de militares?

© flickr.com / 1SGT SIONIRMilitares do Exército Brasileiro participam do desfile cívico-militar do Dia da Independência, em 7 de setembro de 2024
Militares do Exército Brasileiro participam do desfile cívico-militar do Dia da Independência, em 7 de setembro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 23.05.2025
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Um levantamento recente aponta que, nos primeiros três meses de 2025, mais de 40 oficiais de carreira deixaram a Força Aérea Brasileira (FAB) — a grande maioria aviadores.
No ano passado, a CNN divulgou dados que apontavam que Marinha e Exército perderam mais de 5 mil profissionais entre 2015 e 2024. Entre os motivos relatados, estão a diferença salarial entre o setor militar e o privado, as longas jornadas de trabalho, a obsolescência da frota e a falta de perspectiva na carreira.
Professor aposentado da Universidade Federal Fluminense (UFF) e integrante do Núcleo de Estudos de Defesa, Inovação, Capacitação e Competitividade Industrial (UFFDefesa), Eduardo Siqueira Brick falou à Sputnik Brasil sobre o assunto.
A saída desses profissionais representa uma dupla perda, pois ocasiona a falta de mão de obra qualificada e o desperdício de dinheiro público na preparação desses oficiais, que demanda investimento de longo prazo por parte do Estado:
Desde muito cedo, os jovens são recrutados em colégios como o Colégio Naval e a Escola Preparatória de Cadetes do Ar (EPCAr), de onde muitos partem para as escolas de formação de oficiais, como a Escola Naval, a Academia da Força Aérea (AFA) e a Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN).
Exemplo vivo desse investimento, Brick, que foi engenheiro do Corpo de Engenheiros da Marinha, contou que fez desde sua graduação até o doutorado graças à força naval. Essa qualificação de anos torna esses profissionais fundamentais para as atividades das Forças Armadas, defendeu.
Para ele, o problema da remuneração baixa em comparação com outras carreiras é um ponto importante, mas não decisivo para explicar a evasão:
"Eles [militares] sempre tiveram um salário mais baixo do que as outras carreiras. Isso nunca impediu que novos jovens com vocação para servir à pátria, servir ao país, mais do que a si próprio, procurassem emprego, procurassem trabalhar nas Forças Armadas", opinou o especialista.
Ele contou que ainda na Marinha recusou uma proposta de emprego em um órgão de pesquisa para ganhar o dobro do salário. "Não foi o salário que me motivou a ficar, […] passei 11 anos fazendo aquele trabalho até eu sair da Marinha."
Outro entrevistado da Sputnik Brasil sobre o tema, o analista internacional e pesquisador do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social e do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (Gedes) Jorge Rodrigues também salientou que a remuneração não é o principal causador da fuga de mão de obra da FAB.
Ele citou uma pesquisa realizada com oficiais do Exército que mostra que 51% dos oficiais com até dez anos de serviço militar cogitariam mudar de carreira sem perder a estabilidade. Outros 40% com 11 a 20 anos de serviço cogitariam o mesmo movimento. Cerca de 54% responderam que seguiriam no funcionalismo público se não fossem militares.

"Os números parecem indicar que há um anseio entre os oficiais por carreiras mais benéficas, especialmente no funcionalismo público. Nesse sentido, me parece que a evasão identificada na FAB e nas demais forças singulares se baseia no desejo legítimo por melhores condições de carreira", disse ele.

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As desigualdades dentro da caserna são outro problema que se intensificou, segundo ele, com a reforma implementada pelo último governo, de Jair Bolsonaro (PL), que "privilegiou os generais em detrimento das baixas patentes".
Rodrigues também ressaltou que as evasões em massa colocam em risco operações conjuntas, treinamentos, cooperação com forças armadas de países parceiros. E, para enfrentar esse aspecto, a primeira meta a ser definida é que tipo de Forças Armadas o país quer e precisa.

"O primeiro passo que o Ministério da Defesa deve encabeçar é implementar um amplo processo de diálogo sobre defesa nacional, articulando, escutando e construindo em conjunto com todas as partes envolvidas, de militares à sociedade civil."

Eduardo Brick também questionou a baixa atenção, e o baixo orçamento, que o governo dá para a defesa.

"O Brasil não se preocupa com defesa, então como é que se vai motivar alguém a trabalhar pela defesa do país se o Estado brasileiro não dá importância à defesa? Essa é a causa-raiz de tudo isso. […] alguma coisa tem que ser feita de uma forma muito mais abrangente."

Para ele, a capacidade militar do país tem se deteriorado com a falta de investimento em equipamentos, infraestrutura, base logística e indústrias estratégicas de defesa, ao citar que na década de 1990 os investimentos em defesa representavam 2% do produto interno bruto (PIB) e atualmente caíram para cerca de 1,5% do PIB.
"Não adianta ter um excelente piloto se não tem aeronave, se não tem treinamento, não tem combustível para voar e não tem munição para ser gasta em treinamento […]. Países equivalentes ao Brasil em porte e riqueza gastam 3%, 4%, 5% do PIB para se proteger, e 2% são considerados na OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte] como o piso."
Uma das soluções para contornar a falta de dinheiro para investir na aquisição de novos meios, em pesquisa e em desenvolvimento é criar vagas temporárias para carreiras nos níveis mais baixos, sugeriu Brick. "Depois eles sairiam, receberiam uma indenização, algo assim; não iriam onerar a Previdência dos militares", argumentou.

"Formar menos gente nas academias militares, menos custo para isso, mas depois seguir carreira e chegar ao topo da carreira. Essa é uma possibilidade que outros países têm feito em paralelo com outras medidas", disse ele.

Outra medida seria transferir a responsabilidade da aquisição, da pesquisa e do desenvolvimento para o Ministério da Defesa, deixando as Forças Armadas apenas com a atividade operacional, sua atividade fim, segundo o engenheiro.

"Isso também reduziria o custo de ter essa estrutura triplicada dentro das Forças Armadas. Se você está tendo muita redundância no sistema, essa é outra medida que é fundamental também dentro desse rearranjo geral, […] mudar a estrutura da defesa, colocando a parte de logística de defesa separada da parte de operações."

Essas mudanças, na visão do especialista e do professor aposentado, dariam ainda mais motivação aos engenheiros para seguir uma carreira técnica dentro do Ministério da Defesa e aos militares e combatentes, porque teriam mais meios, e mais modernos, para operar.
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