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Ao reconhecer multipolaridade, EUA abandonam papel de polícia global e buscam domínio das Américas

© Florence Lo via APEm maio de 2025, a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) realizou um fórum com a China para discutir a relação da região com o país asiático
Em maio de 2025, a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) realizou um fórum com a China para discutir a relação da região com o país asiático - Sputnik Brasil, 1920, 08.12.2025
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Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas explicam que força crescente de China e Rússia obrigam governo norte-americano a concentrar esforços na vizinhança. O Brasil, por sua vez, segue atento ao aumento da influência militar e política de Washington na região.
O segundo mandato do republicano Donald Trump à frente da presidência dos Estados Unidos foi marcado, neste primeiro ano, pela política externa da Casa Branca, em especial por meio das áreas econômica e militar. Esse direcionamento do comando de Washington foi amplamente sentido nas Américas.
Em julho, o Brasil foi alvo de tarifas acumuladas de 50% na exportação de alguns dos principais produtos enviados aos Estados Unidos, como café e carne bovina. Parceiros de longa data dos estadunidenses, Canadá e México também sofreram com novas taxas.
Já em setembro, foi a vez de a Venezuela entrar no radar de Trump, com ordens de ataque a embarcações supostamente originárias do país caribenho que, alegadamente, levariam drogas à América do Norte. As tensões geradas por Washington na América Latina cresceram ainda mais após o secretário de Guerra dos EUA, Pete Hegseth, anunciar o lançamento da operação Lança Austral, que visa ao suposto desmantelamento de organizações classificadas como narcoterroristas pela Casa Branca.
Com milhares de soldados norte-americanos ancorados no Caribe, presença reforçada por duas das principais embarcações militares do país — USS Gerald R. Ford e USS Thomas Hudner —, levanta-se o questionamento: os EUA estão tentando controlar e cercar a região que tem como principal expoente o Brasil?
Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas explicaram que Brasília, por si só, não é alvo de Washington. Todavia, há um entendimento neste governo republicano de que é preciso dar um passo atrás, deixar em segundo plano o imperialismo global e buscar influenciar o que os Estados Unidos sempre entenderam como quintal: as Américas.
Williams Gonçalves, professor de relações internacionais aposentado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU), explica que o avanço militar norte-americano na região, assim como as novas políticas para o continente, atendem a uma abordagem pragmática das relações internacionais.

"O governo Trump desistiu, abriu mão de uma política hegemônica. Sob Trump, os EUA não buscam mais a hegemonia mundial. Trump reconhece que há uma multipolaridade, que há outros polos de poder, que são a Rússia, a China e, poderíamos adicionar, a Índia também."

Para Gonçalves, esse entendimento de a multipolaridade ser incontornável faz com que Washington abandone a Europa; e a América Latina entre na ótica norte-americana, e o Brasil, país mais influente dessa esfera, "não pode ficar de fora".
Segundo o especialista, Brasília é "extraordinariamente importante" nessa equação de Washington não só pelas dimensões continentais e econômicas, mas também por fazer parte do BRICS e ter laços estreitos com China e Rússia.

"Nós vamos abrir mão do BRICS, virar as costas ao BRICS e nos acomodar em um alinhamento com os EUA? Vamos nos afastar desses aliados? E se não fizermos, o que vai acontecer?", argumentou.

Roberto Uebel, professor de relações internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM — São Paulo), economista e geógrafo, diferentemente de Gonçalves, aponta que os Estados Unidos não entregaram os pontos na Europa e crê que a parte ocidental do continente ainda é área de influência norte-americana.
Ao mesmo tempo em que Washington atua entre os europeus, Uebel afirma que uma das ênfases tem sido criar mecanismos para desestabilizar governos os quais entende que não são interessantes para a política externa da Casa Branca, como, por exemplo, o de Nicolás Maduro na Venezuela.
Essa clara pressão sobre Caracas faz com que haja atenção de Brasília aos desdobramentos das tensões criadas pelo governo de Trump. Segundo o professor da ESPM, dois setores do governo brasileiro, em especial, acompanham de perto a situação: a diplomacia e as Forças Armadas.

"A gente não pode ser ingênuo e pensar que o Brasil não está monitorando o que está acontecendo hoje no Caribe e até mesmo na Venezuela. O Brasil olha com muita atenção. Eu diria que, se tem hoje dois atores preocupados com a questão venezuelana, eles são o próprio Itamaraty, por uma questão da diplomacia, de integração regional sul-americana; mas também as Forças Armadas brasileiras, para evitar qualquer violação territorial."

Uebel conta que há bases militares internacionais de outras duas nações, além dos Estados Unidos, na América Latina e no Atlântico Sul: França (Guiana Francesa) e Reino Unido (Malvinas, Ascensão, Santa Helena e Tristão da Cunha). O especialista destaca que o Brasil nunca enxergou isto como um problema e, neste terceiro mandato de Lula, a estratégia tem sido buscar consolidar a imagem internacional do país por meio de fóruns.
"O Brasil tem se destacado em certa medida, conseguido construir uma presença muito ativa, em fóruns como o G20 e o BRICS. O país foi convidado nos últimos três anos como observador das reuniões do próprio G7, mantém candidatura a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), tem uma atuação na tentativa de aproximar a União Europeia do Mercosul."
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante discurso à nação sobre a lei que isenta o imposto de renda para quem recebe até R$ 5 mil. Brasília, 30 de novembro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 08.12.2025
Notícias do Brasil
Brasil busca solução diplomática para tensões entre EUA e Venezuela, afirma mídia

Visão empresarial disfarçada em pauta populista

Antes de ser presidente dos Estados Unidos, Trump era um conhecido empresário norte-americano, inclusive, apresentando um programa na TV local que tinha como enredo principal encontrar um sócio para seus empreendimentos.
Na Casa Branca, o presidente continua gerindo suas ações sob visão empresarial, afirma Gonçalves. O analista explica que o norte-americano tem como orientação o comércio, ou seja, opera os interesses do país com viés econômico, ainda que ancorado em pautas populistas.

"O combate ao narcotráfico é uma questão popular nos EUA. A sociedade norte-americana é uma sociedade que convive com o problema econômico e de saúde pública das drogas. [...] As ações que ele tem desenvolvido no Caribe são ilegais do ponto de vista da legislação norte-americana, e, obviamente, ele está transgredindo o direito internacional. Mas nada disso está sendo colocado, em virtude da popularidade da política de combate às drogas."

Se internamente não há uma pressão pelas ações no Caribe, nem mesmo países da região confrontam o governo norte-americana. Uebel explica que nações como Argentina e El Salvador — e possivelmente o Chile — por serem alinhados com Washington, enfraquecem um eventual núcleo sólido para lutar contra possíveis ingerências dos Estados Unidos na região.

"[A desunião] acaba enfraquecendo as organizações multilaterais que foram criadas nas décadas anteriores para a promoção de uma integração regional, justamente para a reduzir a dependência dos Estados Unidos, como o caso da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) e da CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos)."

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