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Encontro entre Bolsonaro e Putin traz benefícios ou riscos ao Brasil?

A Sputnik Brasil conversou com o professor de relações internacionais Arnaldo Francisco Cardoso, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, para entender de que forma o aceno do presidente Jair Bolsonaro a Vladimir Putin pode beneficiar ou prejudicar o país.
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Durante três anos e um mês, a política externa do governo brasileiro se baseou na aproximação a chefes de Estado identificados com o trumpismo e em embates de diversas naturezas com nações contrárias ao movimento antiglobalista. Neste período, porém, a Rússia não se tornou aliada nem adversária aos olhos do Itamaraty.
Apesar disso, em meio às tensões entre o Ocidente e Moscou sobre a Ucrânia, o presidente Jair Bolsonaro decidiu se reunir com seu homólogo russo, Vladimir Putin, nesta semana.
O chefe do Executivo brasileiro chegará à Rússia nesta terça-feira (15) e cumprirá agenda até a quinta-feira (17). Além de almoço com Putin, Bolsonaro participará de um cerimonial militar.
Porém, até que ponto este encontro alterará a relação entre os países? O evento pode resultar em benefícios econômicos e políticos ao Brasil?
Para entender o quebra-cabeça da política externa do país, a Sputnik Brasil conversou com o professor de relações internacionais Arnaldo Francisco Cardoso, da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Para o especialista, a resposta para o movimento de Bolsonaro não está em potenciais novas estratégias de política externa. Em seu ponto de vista, o presidente está de olho em sua reeleição, em outubro, e busca resgatar parte da popularidade perdida para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, favorito na corrida eleitoral neste momento, conforme as últimas pesquisas de intenções de voto.

"Essa é uma estratégia comumente utilizada por governantes enfraquecidos que enfrentam crises no ambiente doméstico. Parece ser o caso dessa viagem de Bolsonaro a Rússia, em ano eleitoral e com uma crise econômica, social e política se agravando", apontou Cardoso.

Segundo o professor, em um momento de conflito crescente envolvendo a Ucrânia, "posar de estadista e buscar um palco internacional parecem ser as principais motivações da arriscada viagem".

"O problema é o histórico acumulado de desastres internacionais de viagens de Bolsonaro, uma sucessão de vexames. Mas desta vez, na iminência de uma guerra de grandes proporções, não há espaço para bizarrices", disse ele.

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Cardoso destacou que a nota do Itamaraty sobre os 30 anos das relações diplomáticas entre Brasil e Ucrânia, divulgada na última sexta-feira (11), ameniza as tensões. Para ele, em meio a "tantas temeridades", foi um aceno importante a comunidades de descendentes de ucranianos que vivem no Brasil.
O Ministério das Relações Exteriores anunciou, nesta segunda-feira (14), que o chanceler Carlos França também conversou por telefone com seu colega ucraniano Dmitry Kuleba.
O especialista alerta, porém, que o gesto "poderá ser anulado em um eventual surto verborrágico" do presidente brasileiro.
Em seu roteiro de viagem, após a passagem por Moscou, Bolsonaro visitará a Hungria e se reunirá com o primeiro-ministro Viktor Orbán.
O professor acredita que a segunda parada "servirá para reforçar a imagem de Bolsonaro como integrante da extrema-direita mundial e liberal, com suas bandeiras moralistas e de desprezo pela democracia".

"Outros membros dessa extrema-direita têm feito alguns contorcionismos pra emitir seus sinais de apreço por Vladimir Putin, como é o caso do líder do partido italiano Liga do Norte, Matteo Salvini, que costuma trocar afagos com Bolsonaro", disse.

Porém, segundo o especialista, diferentemente de Bolsonaro, os líderes europeus temem as consequências diretas que uma guerra trará a seus países devido à dependência do abastecimento do gás russo.
Cardoso lembra que as relações exteriores do Brasil sempre "se pautaram pela defesa da paz e do diálogo entre as nações". Para ele, pela própria configuração dos seus recursos de poder, a diplomacia é a principal ferramenta do país para afirmar sua identidade internacional.
Contudo, ele pondera que a situação entre Ocidente e Rússia escapa da alçada diplomática brasileira.
"Diante de outras crises internacionais, o Brasil já exercitou sua habilidade de mediação. Mas, na região hoje em crise, o Brasil tem pouquíssima relevância. O jogo ali é para gente grande", afirmou.

Putin x Biden

No embate entre os presidentes da Rússia e dos EUA, o especialista vê Vladimir Putin um passo à frente de Joe Biden. Segundo ele, a relação estratégica de Putin com Xi Jinping, presidente da China - que também vive em situação de tensão com os EUA -, "tem peso muito significativo na composição do tabuleiro".
"Putin está em posição de vantagem. Biden é reativo", resumiu.
Esta combinação de fotos, criada em 6 de dezembro de 2021, mostra o presidente dos EUA Joe Biden durante uma cerimônia na Casa Branca, em Washington, em 18 de novembro de 2021, e o presidente russo Vladimir Putin em um congresso, em Moscou, em 4 de dezembro, 2021
O professor pontua ainda que, "em um contexto de extrema gravidade, o legado da diplomacia brasileira recomenda que o governante de plantão renove os valores tradicionais com os quais o país tem orientado suas relações com a Rússia e outras potências mundiais".
"Tudo dependerá das declarações públicas de Bolsonaro e Putin sobre o encontro. Putin é sagaz, enxadrista na política mundial. Infelizmente, nós brasileiros não podemos dizer o mesmo sobre Bolsonaro", disse Cardoso.
Ele diz não acreditar que Biden e Putin estejam preocupados com eventuais posicionamentos do presidente brasileiro.
Mas alertou: "Em um ambiente de crise deflagrada, é sempre temoroso dar declarações estúpidas e irresponsáveis".
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