O analista internacional e ex-diplomata venezuelano Wilmer Depablos explicou em entrevista à Sputnik que uma peculiaridade da tentativa de golpe de Estado de 26 de junho em La Paz é que ela foi transmitida "pela televisão, pela rádio, pela imprensa e principalmente pelas redes em tempo real. Foi realmente um acontecimento bastante noticioso".
O especialista destacou ainda que a resposta rápida e decisiva do presidente Luis Arce, juntamente com o apoio incondicional do povo boliviano, foi crucial para reverter a situação.
"O presidente [Luis] Arce nomeou imediatamente um novo alto comando militar, e a primeira ordem de um deles foi a retirada imediata dos militares para os respectivos quartéis, o que foi feito", acrescentou.
O analista destacou também a importância geopolítica da Bolívia, especialmente em relação às suas vastas reservas de lítio, como fonte permanente de desestabilização.
"A Bolívia representa um dos países do triângulo do lítio; ou seja, uma das reservas mais importantes, possui 24% das reservas de lítio do mundo. Poderíamos estar na presença de uma nova estratégia imperial", disse Depablos, sugerindo uma possível intervenção externa no contexto do golpe.
O papel da comunidade internacional também foi destacado por Depablos como um mecanismo fundamental para neutralizar qualquer tentativa de minar a democracia na região.
"Nós, a partir dos diversos países da América Latina, claro da CELAC, além da ALBA-TCP, da própria UNASUL, ou seja, dos mecanismos de integração regional, vamos acompanhar tudo e não só acompanhamos, mas também acreditamos que o nível e o momento histórico destes companheiros bolivianos lhes permitirão discernir os interesses não só da Bolívia, mas da grande pátria", afirmou.
Golpe atípico em um contexto geopolítico tenso
Martin Pulgar, cientista político e filósofo, apresentou uma análise que situa a tentativa de golpe em um quadro geopolítico mais amplo.
"Foi um golpe de Estado atípico. Geralmente acontecem à noite ou de manhã cedo, o fato de ter sido em pleno sol lhe confere uma certa particularidade", observou Pulgar, sugerindo que os golpistas poderiam ter agido precipitadamente.
Além disso, destacou a importância do contexto internacional, especialmente das ações dos Estados Unidos na América Latina, definindo-as como parte de uma "nova guerra fria na região".
"A ação dos Estados Unidos para reverter os processos progressistas continua o seu caminho e, no caso da Bolívia, tentou intervir não só por causa do lítio, mas para impedir as suas alianças com a Rússia e a China", disse ele.
Pulgar também se referiu às divisões dentro do Movimento ao Socialismo (MAS), o partido no poder, e como estas enfraquecem a coesão interna do partido. No entanto, destacou que a resposta organizada e determinada do povo boliviano foi crucial para frustrar o golpe.
O especialista considerou ainda que é fundamental evitar que militares que participaram em golpes de Estado ou tentativas de desestabilização no passado continuem na liderança das Forças Armadas.
"Acredito que os processos progressistas na América Latina com as suas forças armadas foram esquecidos ou não abordaram com suficiente importância tudo o que é a doutrina dos exércitos nacionais no campo da luta pela mudança social para romper com os esquemas doutrinais da OTAN ou do Ocidente que ainda estão presentes em muitas das forças armadas", concluiu.