Panorama internacional

'Violência recorrente' e zero novidades: atentado contra Trump pode mudar resultados nos EUA ou não?

O atentado sofrido pelo republicano Donald Trump durante um comício de sua candidatura, no sábado (13), em Butler, na Pensilvânia, vem dando o que falar.
Sputnik
Se antes o desempenho do atual presidente Joe Biden já não estava agradando tanto os estadunidenses, agora, o fator Trump pode virar uma opção aos indecisos, dentro e fora do campo dos democratas, que optam por não querer que o atual chefe de Estado norte-americano continue no poder.
Especialistas ouvidos pelo podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, apontam que o movimento feito contra o magnata, além de mudar a lógica e a ordem do debate, acusando a "esquerda" de ser violenta contra a direita, pode desembocar no seu retorno à Casa Branca. Um dos analistas, no entanto, acredita que o retorno de Trump pode não ser tão certeiro assim.
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Segundo Andrew Traumann, professor de relações internacionais no Centro Universitário Curitiba (UniCuritiba) e coordenador da Pós-Graduação em Geopolítica da Ásia na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), o ex-presidente sai dessa "muito fortalecido porque, em um momento como esse, há uma solidariedade nacional e internacional".
"Ele [Trump] foi vítima de um atentado, quase morreu e vai ganhar força. Aquela foto dele se tornou uma foto icônica, com o punho cerrado, a bandeira, o sangue, enfim, tudo aquilo forma uma imagética muito poderosa para a população, e, inclusive, ele pode até atrair mais eleitores republicanos às urnas", explicou ao ser questionado qual poderia ser o resultado do que ocorreu a Trump.
Segundo Lucas Massimo, doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo (USP), o atentado sofrido por Donald Trump "aumenta a preocupação dos líderes mundiais com a democracia norte-americana". Ele destacou ainda que, independentemente do resultado eleitoral, "um episódio de tamanha gravidade num momento tão crítico da campanha" prejudica a legitimidade do novo eleito e enfraquece a posição dos Estados Unidos na geopolítica mundial.

Trump contra o sistema?

O analista internacional menciona a narrativa de Trump como uma vítima perseguida pelo sistema como fator que pode mobilizar eleitores que não pretendiam votar.
Ao ser indagado sobre a influência das teorias da conspiração de ajudarem a criar um candidato forte, Traumann retrucou que sim: "A versão oficial dos fatos é que existia um perímetro de segurança em torno do palanque onde estava Trump… O FBI vem culpando a polícia local por essa negligência."

"Porque, a partir de agora [do atentado], ele [Trump] está contra o sistema, alguma coisa ele sabe. Aquela narrativa de que ele está do lado do americano comum, contra todo um sistema que é Wall Street, as grandes corporações, as big techs, enfim, toda uma questão muito relacionada à teoria da conspiração, que faz parte do imaginário do norte-americano médio", arguiu ele, garantindo que será muito difícil para Biden reverter a situação.

Política dos EUA é 'violenta'

Por outro lado, Ricardo Caichiolo, professor de relações internacionais do Ibmec Brasília, afirma que o atentado contra Trump mostra a verdadeira face norte-americana.
"[O atentado] sinaliza que a política americana é uma política violenta, que ao longo dos anos, das décadas, ela sempre foi marcada por momentos de violência, inclusive destinados ao chefe maior dos Estados Unidos — no caso, do presidente da República", cravou o especialista.
Lucas Massimo vai ao encontro do que afirma Caichiolo, dizendo que "a violência nos Estados Unidos é algo recorrente" e destacando que o acesso massificado a armas torna complexa a tarefa dos profissionais de segurança. Ele sugere que a polarização extrema da campanha eleitoral contribuiu para o atentado e que é necessário um entendimento mais profundo do fenômeno, além de culpar apenas a inépcia dos serviços de segurança.
Ricardo Caichiolo alerta para o fator considerado "decisivo" quando o assunto é o atentado sofrido por Trump e sua possibilidade de retorno ao Salão Oval.

"A gente tem um tempo bem grande até as eleições de novembro, então não dá para cravar em que medida isso vai repercutir positivamente para o Trump", retrucou o internacionalista, acrescentando que negativamente não repercutirá. Segundo ele, o que pode acontecer é "ser um elemento neutro em termos de impacto na disputa presidencial".

O atentado é visto pelo analista como algo positivo para Joe Biden — que vem sendo o assunto principal dos veículos de comunicação mundo afora — e que pode ajudá-lo na corrida eleitoral dos EUA.
"Há analistas, inclusive, que falam que para o Biden seria um momento até que ajudaria, porque seria um momento em que o foco não é mais na questão de ele ser uma pessoa mais idosa, de ele não ter condições psíquicas para poder disputar a presidência, que era o que estava na pauta americana, na imprensa americana nas últimas semanas. Porque agora você tem essa pauta, os olhos dos Estados Unidos e da imprensa norte-americana obviamente estão voltados para o atentado ocorrido", pondera Caichiolo.
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Ao Mundioka, o professor de relações internacionais afirmou que agora é um momento no qual os próprios democratas estão revendo uma série de questões, uma série de diferenças dentro do próprio partido.
"Então isso de uma certa forma pode ajudar também o Partido Democrata, melhor dizendo, a se reorganizar. Enfim, eu acredito que os votantes que já haviam se decidido tanto pelo lado republicano como pelo lado democrata, eles não tendem a mudar o seu voto mesmo por conta do atentado", defende.
Sobre a possibilidade de Joe Biden ser substituído como candidato democrata, Ricardo Caichiolo foi claro: "Eu entendo que ele vai permanecer como candidato." Por outro lado, destacou a importância de Kamala Harris, que "tem totais condições" de assumir a presidência caso necessário.
Acerca da eventualidade de Trump mudar sua posição sobre o controle de armas após o atentado, Massimo foi cético: "Não vejo essa possibilidade no entorno imediato da campanha de Donald Trump." Ele explicou que o perfil de políticos republicanos que poderiam ponderar sobre a centralidade das armas na sociedade americana foi alijado dos centros de poder desde 2016.

O atentado

Na tarde de sábado (13) foram disparados tiros durante o comício da campanha de Trump em Butler, Pensilvânia. O ex-presidente sofreu um ferimento à bala na orelha direita e foi hospitalizado por um breve período. O atirador matou um membro da plateia e feriu gravemente outros dois na multidão antes que o Serviço Secreto o neutralizasse.
O Departamento Federal de Investigação (FBI, na sigla em inglês) está tratando o ocorrido como uma tentativa de assassinato e potencial terrorismo doméstico. O suposto atirador foi identificado como Thomas Matthew Crooks, de 20 anos, de Bethel Park, Pensilvânia.
Trump se juntou à pequena lista de presidentes dos EUA que sobreviveram a uma tentativa de assassinato. Inclui Theodore Roosevelt, que foi baleado em 1912 durante a campanha, e Ronald Reagan, que foi baleado em 1981. Abraham Lincoln e John F. Kennedy estão entre os que foram assassinados.
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