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Das florestas às cidades: como entender 'as muitas Amazônias' ajuda na conservação do bioma?

Com cerca de 30 milhões de habitantes espalhados por nove estados, a região amazônica tem 74% das populações em área urbana, principalmente nas capitais. Especialistas explicam que entender a existência das 'muitas Amazônias' ajuda a elaborar políticas eficazes de conservação e atender às necessidades locais.
Sputnik
Da Bolívia à Colômbia, da Venezuela ao Suriname, das Guianas ao Peru, do Equador ao Brasil. Bioma único que cobre cerca de 420 milhões de hectares da América do Sul, caso a Amazônia fosse um país seria o sexto maior do mundo em extensão territorial, à frente de nações como Austrália e Índia. Esses números expressivos ajudam a explicar o motivo de a região ser considerada a maior floresta tropical do mundo. Para além da biodiversidade, possui um papel crucial na regulação do clima mundial e pode ser vista até da Estação Espacial Internacional.
No Brasil, que tem a maior cobertura florestal entre os oito países do bioma, a floresta representa 59% do território, que atravessa nove estados e onde vivem cerca de 30 milhões de pessoas. Em meio à pior seca da história enfrentada pela região, com rios outrora caudalosos em que sequer é possível navegar e capitais como Manaus e Belém cobertas por fumaça dos incêndios florestais, o Brasil celebra nesta quinta-feira (5) o Dia Nacional da Amazônia. O especialista em gestão ambiental e gerente da Rede Origens Brasil (iniciativa premiada pela Organização das Nações Unidas), Luiz Brasi Filho, ressaltou ao podcast Jabuticaba Sem Caroço, da Sputnik Brasil, que a Amazônia coloca o país em outro patamar em um período de discussão das mudanças climáticas e perda da biodiversidade no mundo.
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Mas para enfrentar os desafios de manter a floresta em pé, é crucial entender que existem "diversas Amazônias", segundo o especialista. "Temos que compreender que existe a região de florestas, onde estão as terras indígenas, unidades de conservação e áreas que ainda não foram destinadas [para proteção], com imensa vegetação. Ali existem desafios e também oportunidades. Temos também a área onde a agropecuária já se consolidou com áreas produtivas, com fazendas grandes, médias e pequenas. E também existem dentro desse bioma as cidades, em que é preciso também discutir caminhos e soluções, assim como oportunidades para quem vive nessas regiões", pontua.
Já a pesquisadora do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) Andréia Pinto acrescenta ao podcast Jabuticaba Sem Caroço que 74% da população brasileira amazônica está nos centros urbanos, principalmente nas capitais dos nove estados da Amazônia Legal. "Isso também traz um elemento a mais, porque muitas pessoas que vivem nas cidades estão desconectadas dessas percepções [dos impactos da destruição das florestas], como ver um riacho secando e de uma floresta morrendo. Já quem vive da terra, como um produtor rural, começa a perceber mais essa ligação entre desmatar e degradar com a escassez de água, principalmente o pequeno agricultor familiar, que não tem condição de fazer grandes irrigações", defende.
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O que falar sobre a Amazônia?

Conforme a especialista, a Amazônia desempenha vários "serviços ambientais" a nível regional, nacional e mundial. Entre os principais está a liberação do vapor d'água pela vegetação (evapotranspiração), que equilibra o regime de chuvas em todo o Brasil. É com a formação dos chamados rios voadores que ocorre boa parte dos índices pluviométricos nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul, fechando um ciclo crucial para a regulação do clima — o desmatamento da floresta tem reduzido a força desse fenômeno natural, o que explica em parte tantos eventos climáticos extremos nos últimos anos no Brasil.
"E quando a gente olha para a região Norte, são muitos outros serviços ambientais, como facilitar a geração de alimento a partir da agricultura familiar nas comunidades locais", diz. Atualmente, explica a pesquisadora, o Brasil está próximo a um limite perigoso que ameaça a própria existência do país: a destruição ser tão grande a ponto de não possibilitar mais a recuperação da maior floresta tropical do mundo. De toda a área que a vegetação amazônica um dia ocupou no país, mais de 20% já foi desmatada (a maior parte para dar espaço à pecuária). Já outros 20% são de locais degradados.

"É onde existe floresta, mas não as mesmas características e capacidade de absorção de carbono, evapotranspiração. A mata está de pé, não teve uma retirada completa, mas sofreu grandes alterações [provocadas pelos humanos] ao longo do tempo […]. E agora, com esses eventos climáticos, isso fica muito mais perceptível. Quem mora na região convive com estações de chuva mais intensas, enquanto o período de seca é muito mais intenso", conta.

Apesar desse indicador, Andréia Pinto enfatiza que a Amazônia possui grande capacidade de regeneração e até 2022 havia na região mais de 5,7 milhões de hectares de vegetação secundária (em uma área antes devastada), com idade a partir de seis anos. "O primeiro passo é tentar auxiliar a floresta nessa recuperação. É simplesmente deixar que a natureza faça a parte dela e o homem não atrapalhar", comenta.

O que o garimpo causa na Amazônia?

Entre 2016 e 2022, cerca de 241 mil hectares de florestas amazônicas foram ocupadas de forma ilegal pelo garimpo, área duas vezes maior que Belém, a segunda maior cidade da região. De acordo com o estudo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), o crescimento registrado no período foi de 361% e, desse total, 25 mil hectares foram em áreas de 17 terras indígenas, protegidas pela legislação brasileira. Luiz Brasi Filho vê que essa atividade ilegal e predatória é o maior problema enfrentado atualmente pela Amazônia.

"Se você olhar o mapa do garimpo hoje, há grandes impactos nas terras indígenas Yanomami e Kayapó. Precisamos de uma ação coordenada entre os governos federal e estaduais para um efetivo combate ao garimpo […]. Outro ponto é a extração de madeira ilegal, comercializada não só no Brasil. Essas atividades são extremamente desafiadoras para a conservação do bioma", afirma.

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Facções criminosas também avançam na região

Estudo do ano passado publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) revela ainda o avanço das facções criminosas pelos estados amazônicos: foram mapeados 22 grupos presentes em 178 municípios da região, onde vivem quase 58% da população da Amazônia Legal. Para além da violência, crescem problemas como tráfico, grilagem e desmatamento.

"A presença do narcotráfico na Amazônia tem trazido um conjunto de desafios para as comunidades locais, principalmente por conta da insegurança dentro desses territórios. Precisamos ter ações efetivas de comando e controle que sejam políticas de governo", resume o especialista, que ressalta a importância de conciliar o ativo florestal com atividades econômicas sustentáveis que gerem renda para a população. Isso inclusive desestimula a atuação dessas organizações criminosas.

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