Panorama internacional

África no Conselho de Segurança da ONU: desejo é antigo, mas analista vê falta de vontade ocidental

O debate sobre a inclusão da África como um bloco no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) ganha novo fôlego, com a União Africana pleiteando uma vaga permanente.
Sputnik
Essa demanda, embora não nova, reflete, segundo especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil, a urgência por uma representação mais equitativa na arena internacional, especialmente diante da histórica sub-representação do continente.
Ao Mundioka, podcast desta agência, Miguel Mikelli Ribeiro, professor de relações internacionais do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), destacou que a ideia de reforma do CSNU se intensificou desde a proposta do G4, que contava com o apoio de Brasil, Índia, Japão e Alemanha, visando incluir dois assentos para africanos. Ele afirmou: "Não é uma questão nova."
Mas agora, segundo ele, com o recente apoio dos Estados Unidos para países da África aderirem ao Conselho, a possibilidade de mudança, por mínima que seja, ganha mais "força".
Contudo, é, segundo ele, uma mudança "mínima". Isso porque, na opinião dos EUA, a adesão dos países africanos deve ocorrer sem poder de veto a esses novos assentos permanentes.
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No entanto, a complexidade do continente africano, com suas diversas economias e estruturas políticas, levanta questões sobre como esses assentos seriam distribuídos e representados.
Ribeiro enfatizou que, enquanto a África busca um lugar à mesa, potências tradicionais como os Estados Unidos e membros permanentes do CSNU frequentemente relutam em aceitar mudanças que poderiam diluir seu poder.

Poder da África

"[Boa parte] dos membros do Conselho não têm muito desejo de reforma", disse ele, ressaltando a resistência. Essa postura pode complicar ainda mais o caminho da África em direção a uma representação significativa, já que, para muitos países, a ideia de um único assento representando o continente pode parecer insuficiente.
Com o aumento do poder econômico e político da África no cenário global, especialmente por meio da cooperação com blocos como o BRICS, a busca por duas cadeiras permanentes com direito a veto se torna uma questão de justiça e eficácia.

Ribeiro observou: "É um claro problema de representatividade. São 54 países sem um membro permanente." A situação atual, onde as principais operações de paz da ONU ocorrem no continente sem a voz africana no processo decisório, evidencia a necessidade de reformulação.

A proposta da União Africana não apenas desafia a estrutura do CSNU, mas também coloca em discussão a natureza da representação. Ele concluiu, dizendo que a capacidade de um país ou grupo de países de realmente representar as vozes diversas de um continente inteiro permanece um desafio, mas a pressão por maior inclusão está mais forte do que nunca.

Fatores que explicam vaga permanente para africanos

Rafaela Serpa, doutoranda em ciência política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pesquisadora-assistente do Centro Brasileiro de Estudos Africanos (CEBRAFRICA) relatou à Sputnik que tem quatro fatores que explicam essa posição para a questão de uma vaga permanente para a África e da União Africana.

"A questão da reforma do Conselho de Segurança de forma geral e como explica a defesa de uma representação africana, primeiro, obviamente, está ligada a essa sub-representação do Terceiro Mundo que o Conselho de Segurança tem. […] A maioria dos países que hoje são membros da ONU nem existiam naquela época como estados independentes. E, no caso da África, mais ainda. Em 1945, da organização, só quatro Estados africanos existiam", explicou.

Segundo ela, esse anacronismo do Conselho de Segurança e de como ele representa uma ordem internacional defasada, cada vez mais há presença de países emergentes, e a África é um ponto central dessa nova construção, de uma multipolaridade que defende essa reforma e, principalmente, uma representação da África.
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"A importância de pensar uma representação da África no Conselho de Segurança é porque a África, hoje, é o principal tema desse organismo. Então é indispensável que se tenha atores africanos que, obviamente, têm mais condição até de falar sobre seus problemas, e que precisam ser ouvidos sobre esses seus problemas e as formas de solução dentro desses órgãos de decisão mundial", continuou.
Daí, agora, de acordo com a cientista política, especificamente sobre a União Africana, por que se vem falando numa representação única a partir da organização.
"Essa conjuntura atual, principalmente com a entrada da União Africana no G20, e essa nova reestruturação global e do papel do continente africano — em relação aos novos eixos de poder mundial — vêm trazendo essa ideia de uma representação a partir dessa organização. […] A partir de uma organização multilateral, é mais fácil conseguir controlar as próprias atuações a partir dos seus interesses", pontuou.
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