Questões como essa — e o que será do Canadá frente à nova presidência de Donald Trump nos EUA, que ameaça o país vizinho com tarifas, controle de fronteiras e até mesmo anexação de seu território — foram tema do episódio desta quarta-feira do Mundioka, podcast da Sputnik Brasil.
Renúncia: o que aconteceu com Trudeau?
Em entrevista ao podcast, Cristina Pacheco, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e pesquisadora sobre política externa norte-americana, explicou que a política de Trudeau e seu Partido Liberal foi marcada pela defesa do meio ambiente, dos direitos das mulheres, dos povos originários e pelo acolhimento de imigrantes.
No entanto, o cenário político atual é o oposto ao que Trudeau encontrou na década passada. Não só Donald Trump retorna à Casa Branca, como na Europa partidos conservadores e ultranacionalistas ganham terreno.
Nesse ponto, a professora de relações internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) Denilde Holzhacker afirma ao Mundioka que Trudeau passa a ser "mais pressionado pelos conservadores canadenses".
A pesquisadora explica que, se por um lado Trudeau tentou manter o estado de bem-estar social canadense, com amplo acesso a políticas públicas, por outro, ele vem falhando economicamente.
"O Canadá tem uma dependência bastante grande em termos de comércio com os Estados Unidos. Gira em torno de 70%", diz Holzhacker. O país acabou sendo bastante afetado pela crise econômica que atingiu os Estados Unidos. "Então, qualquer problema econômico afeta esses serviços e, consequentemente, a popularidade do primeiro-ministro."
"No final esse castelinho de areia cai", brinca Pacheco.
As influências de Trump no Canadá
Segundo as entrevistas, ainda que a chegada de Trump no poder não tenha diretamente afetado a renúncia de Trudeau — o premiê já sofria desconfiança por parte do parlamento canadense e da população há anos —, a chegada do novo mandante da Casa Branca certamente tem repercussões em Ottawa.
A queda de Trudeau foi prenunciada pela renúncia de sua própria ministra das Finanças, Chrystia Freeland, que em carta aberta afirmou discordar das políticas de Trudeau frente a um governo estadunidense agressivo na esfera econômica, que ameaça tarifas de 25% nos produtos canadenses.
"É essa convicção que impulsionou meus esforços árduos neste outono para administrar nossos gastos de maneiras que nos darão a flexibilidade necessária para enfrentar os sérios desafios apresentados pelos Estados Unidos", disse.
Segundo Holzhacker, a saída de Freeland foi determinante para que Trudeau percebesse que já não contava com o apoio do próprio partido.
Em seu lugar, as pesquisas de intenção de voto indicam a vitória de um aliado de Trump: Pierre Poilievre, do Partido Conservador, afirmou ao Mundioka Carlos Eduardo Martins, professor associado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e professor visitante na Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, em 2022.
"É um candidato mais afinado com a plataforma do Trump, que defende corte de impostos, defende corte dos direitos. Um candidato que tem uma agenda contra a migração. Há uma série de afinidades com o discurso de direita do Trump que está retomando uma perspectiva de controle mais estrito das Américas."
Poilievre, contudo, já mostrou não ser apenas um capacho do bilionário norte-americano. Após falas de anexar o Canadá e torná-lo o 51º estado do país, "até Poilievre foi obrigado a se posicionar contra esse discurso anexionista de Trump", explicitou o professor.
Por enquanto, contudo, Trudeau ainda está no poder. O premiê só deixa o cargo quando um sucessor for eleito e as eleições ainda não têm data para acontecer, mas podem ocorrer tão cedo quanto o final de março.
"Então, digamos assim, essa vai ser a encruzilhada do Canadá no ano de 2025. Essas eleições que vão colocar em cena a disputa política e o maior alinhamento ao Trump ou não."