Criada em 2014 para ser o que as autoridades chamam de "maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro que o Brasil já teve", a Operação Lava Jato teve um protagonismo especial na política brasileira em 2016.
Entre impeachment, prisões, críticas, provas e convicções, a investigação conduzida pelo juiz federal Sérgio Moro produziu severas transformações no cenário nacional neste ano. Glorificada nas ruas pelas manifestações que pediram o impedimento de Dilma Rousseff, a Operação Lava Jato, apesar das ações decisivas que aconteceram neste ano, ainda traz suspeitas sobre sua idoneidade em relação ao combate à corrupção e gera incertezas sobre o futuro político brasileiro.
Condução coercitiva e o vazamento de conversa entre Dilma e Lula
Em um dos momentos mais críticos da política brasileira neste ano, o juiz Sérgio Moro divulgou em março conversas telefônicas grampeadas entre o ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e a então presidente Dilma Rousseff. O vazamento dos grampos aconteceu alguns dias após o ex-presidente Lula ter sofrido condução coercitiva para depor na Polícia Federal no âmbito da quarta fase da Operação Lava Jato.
O vazamento da conversa telefônica entre Lula e Dilma aconteceu logo após a então presidente ter anunciado que Lula assumiria o cargo de ministro da Casa Civil. A decisão foi encarada pelos críticos como uma maneira de proteger o petista das acusações de corrupção garantindo o foro privilegiado.
"Nós estamos diante de um fato grave, uma agressão não à minha pessoa, mas à cidadania, à democracia e à nossa Constituição", disse Dilma na ocasião.
Lula é acusado de ter recebido R$ 3,7 milhões de propina de empresas envolvidas no esquema de corrupção da Petrobras, por meio de vantagens indevidas.
Delações da Odebrecht
Tido como um divisor de águas na política brasileira, a delação premiada da construtora Odebrecht foi acordada com mais de 70 executivos e ex-executivos da empresa e registrou o nome de 240 políticos de 22 partidos envolvidos em repasses de propinas da empresa. O acordo da delação premiada prevê uma multa de 6,7 bilhões de reais ao longo de 23 anos, representando a maior indenização paga por uma empresa brasileira envolvida em corrupção.
No início de dezembro, a empresa divulgou uma nota admitindo ter participado de "práticas impróprias em sua atividade empresarial" e classificou os casos de corrupção de "erro".
Os acordos de delação premiada da Odebrecht devem desencadear novas fases da Operação Lava Jato até o ano que vem.
Gravação de Jucá revela pacto para deter Lava Jato
Outro vazamento marcante de grampos foi a conversa entre o ex-ministro do Planejamento, senador licenciado Romero Jucá (PMDB), e o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, revelada algumas semanas antes da votação na Câmara sobre a abertura do impeachment contra Dilma Rousseff.
O escândalo reforçou a ideia de que a tentativa de instalar Michel Temer na presidência da República fez parte de um golpe concertado entre o PMDB, o PSDB de Aécio Neves, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e a grande mídia, que, segundo Jucá, só pararia de falar na Lava Jato se Dilma caísse.
As conversas também comprometem o senador Aécio Neves (PSDB). Em dado momento, Jucá diz que "caiu a ficha de líderes do PSDB" sobre o perigo da continuidade da Lava Jato para quadros do partido. Está "todo mundo na bandeja para ser comido", diz o ministro interino, ao que Machado responde: Aécio será o primeiro.
As violações de Sergio Moro ao Código de Ética
— Vando Correia (@vando_correia) 17 de dezembro de 2016
Foto com Aécio Neves, premiações de grupos empresariais https://t.co/w23HzPcbpZ pic.twitter.com/KfnLjb6XEE
Eficiência e seletividade
A Operação Lava Jato teve efeitos decisivos para a história da política brasileira em 2016. Este ano marcou o maior número de operações realizadas desde o início das investigações em 2014. Foram 17 fases, 20 denúncias e 500 milhões de reais devolvidos à Petrobras em 2016. No total, a Lava Jato soma 17 operações, 6 prisões em flagrante, 103 mandados de prisão temporária e 79 mandados de prisão preventiva, somando 259 acusados ao todo.
“A execração pública dos réus e a violação às prerrogativas da advocacia, dentre outros graves vícios, estão se consolidando como marca da Lava Jato, com consequências nefastas para o presente e o futuro da justiça criminal brasileira”
“O menoscabo à presunção de inocência, ao direito de defesa, à garantia da imparcialidade da jurisdição e ao princípio do juízo natural, o desvirtuamento do uso da prisão provisória, o vazamento seletivo de documentos e informações sigilosas, a sonegação de documentos às defesas dos acusados, a execração pública dos réus e a violação às prerrogativas da advocacia, dentre outros graves vícios, estão se consolidando como marca da Lava Jato, com consequências nefastas para o presente e o futuro da justiça criminal brasileira”, afirmaram os juristas em carta.
Sem condução coercitiva? Sem circo? Sem Plantão da Globo? Sem transmissão ao vivo? Ué… pic.twitter.com/0VgHYVQ583
— Elika Takimoto (@elikatakimoto) 27 de dezembro de 2016
Outro fator preponderante que põe Lava Jato em xeque é o fato de que, apesar das investigações terem alcançado o PSDB, incluindo envolvimento do chanceler brasileiro, José Serra, e o senador Aécio Neves, em esquemas de corrupção, a elite política oposicionista que conduziu o impeachment de Dilma Roussef ainda está longe dos holofotes da grande mídia.
O grande desafio da Lava Jato para o ano de 2017, portanto, será mostrar que a eficiência das investigações, tidas como as mais importantes do combate á corrupção da história brasileira, respeita os princípios democráticos e direitos garantidos pela Constituição, promovendo a imparcialidade da investigação. Caso contrário, os impactantes eventos da Lava Jato em 2016 podem ser registrados como mais uma face das manobras que historicamente defendem determinadas classes políticas brasileiras.