Para remediar a situação, o governo estadual recorreu ao presidente da República, Michel Temer, que autorizou o envio de homens da Força Nacional e das Forças Armadas para o Espírito Santo, a fim de reduzir os impactos do problema. Após muitas tentativas de negociação e pressão de ambas as partes, uma grande quantidade de policiais voltou a exercer suas atividades. Os protestos, no entanto, continuaram, e, até o momento, não há acordo.
Nesta semana, a Polícia Militar anunciou o início do processo de demissão de 161 agentes, destacando que, ao todo, 703 haviam sido indiciados pelo crime de revolta. Mas, na tarde de ontem, a Câmara dos Deputados informou sobre a tramitação de um projeto de lei, apresentado pelo deputado Alberto Fraga, do Democratas do Distrito Federal, para anistiar os policiais envolvidos na paralisação no Espírito Santo.
No Rio de Janeiro, atingido por uma grave crise econômica, denúncias de corrupção e uma série de medidas impopulares que já vinham sendo foco de muita tensão entre o governo e a população, o movimento dos PMs, muito semelhante ao do estado vizinho, não teve, até agora, o mesmo impacto visto no território capixaba. Temendo, entretanto, perder o controle da situação, o governador Luiz Fernando Pezão, que enfrenta problemas com a Justiça e pode ser afastado do cargo por abuso de poder ou crime de responsabilidade, solicitou rapidamente o uso de soldados do Exército e da Marinha, que já patrulham áreas da capital e da região metropolitana.
Apesar de algumas diferenças, o atendimento das reivindicações tanto no caso capixaba como no fluminense demandaria algo que os dois governos afirmam não possuir: dinheiro. Em sua pauta original, apresentada pelas esposas dos agentes aquartelados, os manifestantes do Espírito Santo exigiam um reajuste salarial de 43% (salário-base é de R$ 2.646,12), auxílio-alimentação de R$ 176 e regulamentação da carga horária, entre outras coisas. Já no Rio, os familiares dos PMs pedem principalmente a regularização dos pagamentos, uma vez que os militares ainda não receberam o 13º e o RAS (Regime Adicional de Serviço) das Olimpíadas, mudanças nas escalas e a compra de equipamentos e armamentos mais modernos. Mas, em ambos os casos, os governadores dizem não haver espaço no orçamento para dar conta desses pedidos.
Do presídio para as ruas
Muito antes de estourar a bolha da PM no Espírito Santo e no Rio, outros estados do Brasil já davam sinais claros de que a situação geral da segurança pública estava se tornando insustentável, em diferentes aspectos. Recentemente, no final do ano passado, policiais de Bahia, Minas Gerais e Pernambuco já chamavam a atenção de todos com ameaças de grandes paralisações, forma de protesto considerada ilegal entre os militares.
Também no final de 2016, mas, principalmente, no início de 2017, uma grande crise, com raízes imprecisas, atingiu em cheio o sistema prisional brasileiro, multiplicando motins de norte a sul de um país que possui mais de 600 mil detentos, sendo que mais de 40% deles ainda nem foram julgados. Em apenas duas semanas, as rebeliões, provocadas principalmente por brigas de facções e superlotação, provocaram nada menos do que 133 mortes, divididas entre São Paulo, Paraná, Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte.
Na última quarta-feira, 15, uma rebelião em uma penitenciária de Palmas, capital do Tocantins, mobilizou um grande número de agentes das forças de segurança, que, felizmente, conseguiram controlar a situação. Assim como em outras cadeias, essa unidade, identificada como Casa de Prisão Provisória, também é dominada por grupos criminosos rivais, que, no mês passado, já haviam provocado a transferência de, mais ou menos, 200 presos.
E amanhã?
Embora essas questões venham sendo apontadas há muito tempo, esses problemas, em diversos níveis, em um país que passou, há pouco, por uma mudança radical de poder e, desde então, vem sofrendo com convulsões sociais e políticas, devem ser abordados a partir de um contexto mais amplo de insatisfação com o estado das coisas ou eles refletem uma crise de características bem delimitadas e soluções específicas? Sem um acordo real entre aqueles que estão reivindicando algo e o poder público, até o momento, o que se tem são algumas medidas pontuais que podem ou não surtir efeito. Mas, se as contas não estão fechando agora, quem garante que irão fechar amanhã?