Presunção de inocência? O que se sabe até agora sobre as armas químicas na Síria

© AFP 2023 / KHALIL MAZRAAWISoldiers wear mask sas they take part in a military exercise simulating a chemical weapons attack during the international Eager Lion military event on June 2, 2014 at Prince Hashem Bin Abdullah II training center, in Zarqa, 30 km east of Amman, Jordan
Soldiers wear mask sas they take part in a military exercise simulating a chemical weapons attack during the international Eager Lion military event on June 2, 2014 at Prince Hashem Bin Abdullah II training center, in Zarqa, 30 km east of Amman, Jordan - Sputnik Brasil
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A tensão em redor do conflito sírio, que já se arrasta por 6 anos, tem se agudizado ao longo das últimas semanas, levando a que a questão das armas químicas no território sírio tenha se tornado uma das principais na agenda internacional. A Sputnik explica como o fator das armas de destruição em massa na Síria tem repercutido ao longo dos anos.

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Na noite da passada quinta (6) para sexta-feira (7), os Estados Unidos lançaram, sem mandato do governo sírio ou da ONU, 59 mísseis de cruzeiro Tomahawk contra a base aérea de Shayrat, de onde, segundo os oficiais americanos, em 4 de abril teria sido efetuado um ataque químico contra a população civil, alegadamente por parte das forças de Bashar Assad.

Tal passo provocou diferentes reações entre os atores internacionais, tendo a Rússia condenado o ataque. Moscou apela à investigação escrupulosa do caso e qualifica o bombardeio americano como um ato de agressão.

Não há fogo sem fumaça: de onde vieram as substâncias tóxicas

A Síria, tendo sido país signatário do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares desde 1968, porém, não chegou a assinar a Convenção sobre Armas Químicas em 1993, argumentando a sua decisão pela necessidade de manter um "fator de contenção" contra Israel.

Ao mesmo tempo, as autoridades do país rechaçaram todas as alegações de elaboração de armas de destruição maciça no território sírio até 2012, quando reconheceram oficialmente que possuíam o respectivo programa químico.

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O primeiro precedente de uso de tais substâncias tóxicas, que se tornou um dos fatores-chave para o desenvolvimento ulterior do conflito e da violenta guerra de informações, foi o ataque químico em Ghouta, nas cercanias de Damasco, ocorrido em agosto de 2013. Até hoje, não se conhece o número preciso de vítimas, sendo que as estatísticas variam entre 280 e 1700 pessoas.

Já que nem o governo, nem a oposição síria nunca chegaram a reivindicar o ataque, culpando-se um ao outro pelo sucedido, a situação vinha assumindo um caráter tenso, com ameaças por parte da administração de Obama de efetuar uma intervenção militar na Síria.

Porém, seu homôlogo russo, Vladimir Putin, se esforçou por buscar um caminho de compromisso e propôs que todas as armas químicas fossem destruídas na Síria, sob a supervisão de especialistas internacionais, inclusive russos e americanos. O plano foi aceito tanto pelos EUA, como pelo regime de Bashar Assad, e a Síria acabou por aderir à Convenção sobre Armas Químicas em 13 de outubro de 2013.

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Neste mesmo mês começou o processo de destruição das armas químicas sírias, enquando o país permanecia em plena guerra civil. Segundo realçam muitos especialistas no assunto, embora já em 2015 os grupos de especialistas internacionais tenham eliminado quase 100% das armas químicas que estavam em disposição do governo sírio, muitas regiões estavam sob controle da oposição na época.

Consequentemente, há certa possibilidade de uma parte das substâncias tóxicas ter ficado em algumas regiões sírias. Entretanto, ainda ninguém respondeu à pergunta como as armas químicas foram parar às mãos dos terroristas, sendo que a maioria dos especialistas acredita que elas poderiam ter vindo de fora.

Renascimento do conflito: ataque em Idlib

Em 2013, a Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ), que supervisionou o processo de destruição das armas químicas sírias com as forças russas como garante, recebeu o prêmio Nobel da Paz pela causa. Os peritos da ONU, por sua vez, encarregados de investigar o ataque de Ghouta em 2013, apenas confirmaram o uso de gás sarin, sem apresentar evidências irrefutáveis sobre os responsáveis do ataque.

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No entanto, o recente ataque em Han Sheyhun, na província síria de Idlib, durante o qual, na opinião de muitos países ocidentais, o Exército sírio teria bombardeado o povoado com munições químicas, fez surgir uma pergunta: como as armas químicas teriam permanecido no país onde há pouco terminou um trabalho multilateral de larga escala para eliminar estas armas?

Logo após o ataque, Damasco se apressou a afirmar que o sarin tinha sido empregue pelas forças de oposição, já que o arsenal químico do país está reduzido a zero, o que foi confirmado pelos especialistas da OPAQ em 2015.

O Ministério da Defesa russo, por sua vez, apresentou uma versão alternativa: sem rechaçar o fato de bombardeio, os representantes russos asseguram que as munições químicas não foram disparadas, e que a nuvem de gás tóxico (provavelmente, sarin) teria surgido após uma bomba ter atingido um armazém com substâncias tóxicas controlado por terroristas. Estes, por sua vez, pretendiam transportar as substâncias ao Iraque, adiantam os militares russos.

Brecha no processo de paz?

Obviamente, a crise do processo de paz na Síria tem sido um dos temas mais repercutidos na maioria das organizações internacionais nos últimos tempos, dado que os EUA, o Reino Unido e a França já apresentaram ao Conselho de Segurança uma resolução que, de fato, imputa a responsabilidade pelo ataque químico em Idlib ao governo de Assad. Porém, o documento acabou por ser vetado pela Rússia e Bolívia, dado que outros 3 membros dos 10 membros do órgão se abstiveram.

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Os EUA, por sua vez, continuam mantendo uma retórica dura e intransigente em relação ao ocorrido, afirmando possuir "provas" incontestáveis de que foi Assad, qualificado por Trump como um "animal", que usou as armas químicas contra sua própria população.

Vale ressaltar que, na opinião de muitos cientistas políticos, esta versão carece de lógica: a verdade é que tal ataque não era nada benéfico para o governo sírio no momento. Pouco antes do acontecido, houve um certo abrandamento na postura americana em relação de Assad, com Trump falando que Washington "não deveria mais derrubar o presidente sírio".

Parece pouco provável que o líder sírio, por tantos anos odiado pelas potências ocidentais, se comporte de modo tão irracional, tanto mais que não há nenhumas provas que ele tenha quaisquer substâncias tóxicas em sua disposição.

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Infelizmente, Trump não conseguiu se conter, como seu antecessor fez. As tensões no palco internacional chegaram ao rubro. Porém, vale frisar que não é justo tirar quaisquer conclusões finais antes que uma equipe da OPAQ efetue uma inspeção total e abrangente no local do incidente e apresente evidências sólidas.

Não é de estranhar que os olhos de toda a comunidade internacional ontem (12) estivessem pregados no encontro entre o secretário de Estado americano, Rex Tillerson, e o chanceler russo, Sergei Lavrov: parece que todos, incluindo a própria Casa Branca, já se deram de conta de que Moscou e Washington devem voltar a tentar encontrar compromissos.

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