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Macron vê governabilidade ameaçada em meio ao 'polarizado' Parlamento eleito na França
Macron vê governabilidade ameaçada em meio ao 'polarizado' Parlamento eleito na França
Sputnik Brasil
Em uma das eleições mais acirradas e concorridas na história da democracia francesa, a coalizão Nova Frente Popular, que reúne vários partidos de esquerda... 08.07.2024, Sputnik Brasil
2024-07-08T19:36-0300
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País em que o voto não é obrigatório e que convive com um sistema semiparlamentarista, a França registrou no último fim de semana a eleição com a maior participação popular dos últimos 40 anos: quase 60% dos eleitores compareceram às urnas. Para além desse feito histórico, o resultado também mostrou uma reviravolta após a Nova Frente Popular, coligação que reúne vários partidos de esquerda, conquistar o maior número de assentos na Assembleia Nacional, seguida pelo Juntos, do presidente Emmanuel Macron, com 168 assentos, e a Reunião Nacional, de Marine Le Pen, com 143. No primeiro turno, a última sigla, de direita, liderava a corrida parlamentar.Apesar disso, nenhuma coalizão conquistou as 289 vagas necessárias para indicar o primeiro-ministro do país, o que deve levar a longas e incertas negociações. O professor da pós-graduação em ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenador do Centro de Estudos sobre a União Europeia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Rodrigo Barros de Albuquerque, ressalta em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, que a situação mostra um país extremamente polarizado e com a governabilidade ameaçada. Além disso, representa mais uma derrota interna para Macron, que convocou o pleito após o resultado pífio do partido nas eleições para o Parlamento Europeu no fim de maio.Depois de a Reunião Nacional liderar o primeiro turno, Juntos e Nova Frente Popular chegaram a fazer uma aliança informal na segunda etapa das eleições para barrar o avanço histórico no país da direita. "Nas eleições para o Parlamento Europeu, a maior parte dos candidatos franceses eleitos eram de alguma forma ligados à direita. Então foi uma estratégia do Macron [convocar eleições antecipadas no país] que claramente não foi bem-sucedida no primeiro turno. Considerando o resultado final, a sorte ficou no outro lado, com os partidos de esquerda se mobilizando para impedir a ascensão da Reunião Nacional, o que deu certo, mas não por conta do presidente. Deu certo por outras figuras ficarem preocupadas com a situação e reagirem", resume.O especialista pontua ainda que Macron caiu em uma armadilha que pode comprometer o atual governo ainda mais. "Eu acho que ele pensou nisso como uma boa estratégia. É algo comum em regimes como o da França, que é semipresidencialista, de pedir a antecipação de eleições como uma forma de tentar restaurar alguma força perdida recentemente. Então você dissolve o Parlamento e tenta promover certa reação da população para ter um novo Legislativo que seja mais favorável ao governo", explica, ao acrescentar que ambos os espectros políticos do país mostraram insatisfação com a condução do país por Macron.Quando termina o mandato do presidente da França?Reeleito em abril de 2022 para um mandato de cinco anos na França após a intensa disputa com Marine Le Pen, Macron tem acumulado derrotas internas nos últimos meses, como protestos por conta da Reforma da Previdência e crise no governo após o endurecimento das leis de imigração. "Nessa situação agora tão divisiva que ficou a Assembleia Nacional, é muito difícil ele ter governabilidade, já que não tendo apoio de uma parte significativa do Parlamento você não vai conseguir governar. E uma coisa é você ter a formação da Nova Frente Popular para barrar o período eleitoral que o partido de Marine Le Pen subisse. Outra coisa é você continuar encampando todos os projetos aos quais eles tecem críticas constantemente do governo atual", argumenta.Rodrigo Barros de Albuquerque enfatiza também a diferença entre a agenda da esquerda e a coalizão governista, mais equilibrada com relação às questões migratórias e que busca melhorar a situação dos trabalhadores do país, o que levou a rejeitarem inclusive a mudança previdenciária de Macron.Esquerda ou direita: quem ganhou a eleição na França?Com a vitória da esquerda, o atual primeiro-ministro Gabriel Attal chegou a pedir a renúncia do cargo, mas foi convencido por Macron a permanecer, pelo menos até a situação ficar mais definida no país. Enquanto o impasse sobre quem ficará no comando da política interna francesa permanece, a atuação do país no globo não deve sofrer muitas mudanças, avalia o professor da UFPE. "Enquanto o chefe de Estado que conduz a política externa do país é o presidente, no caso o Macron, acredito que não terá muitas mudanças com relação a isso", diz.Já o professor de relações internacionais do Ibmec, Márcio Sette Fortes, afirma à Sputnik Brasil que as eleições francesas tiveram mais perdedores do que vitoriosos em ambos os espectros políticos. "O que vai acontecer a partir de agora deixa muito claro que deixou um cenário de impasse, um cenário de uma França bastante polarizada. Nós temos agora uma situação em que a direita, que saiu vitoriosa no primeiro turno das eleições e que esperava um resultado melhor, foi eclipsada por uma aliança feita pelos centristas com a esquerda", enfatiza.Para o especialista, a própria configuração da coalizão de esquerda que envolve diversos movimentos políticos pode se tornar um empecilho para alcançar algum consenso sobre quais rumos tomar. "Se a estratégia era barrar a Reunião Nacional da Marine Le Pen, ou seja, barrar aqueles que são chamados de direita, eles lograram êxito, é verdade. Mas, por outro lado, conseguiram mais cadeiras, mas sem maioria para governar. Então fica uma situação que deixa a desejar no futuro da política francesa, que exigirá muita negociação entre eles para que se possa conduzir a política do país", complementa.Tudo isso, segundo Fortes, pode ser classificado como "um tiro no pé" dado pelo próprio Macron, que perdeu a maioria no Parlamento e passa a ter uma oposição ainda mais forte. "Antes você tinha um presidente com baixa popularidade, que após as eleições legislativas continua com baixa popularidade, mas com um panorama ainda pior. Antes você tinha um presidente que tinha maioria na Assembleia Nacional e, por isso, estava livre para escolher o seu primeiro-ministro, para formar o seu ministério e até aprovar certas leis que fossem rejeitadas pelos deputados", explica.Um país cada vez mais polarizadoPor fim, o professor do Ibmec acredita que países muito polarizados como a França deixam de conviver com uma divergência política saudável para terem o predomínio de embates constantes. "O que impera não é o bem-estar da população, mas brigar com o seu inimigo político. Em ambientes muito polarizados, deixa de existir o adversário e passa a existir o inimigo. E quando isso acontece, não importa se você tem um grande projeto para a nação, se você tem leis que possam trazer melhorias. Basta isso ser trazido pela oposição e será combatido ferozmente pelo partido que está no governo ou pelo partido que está na oposição."
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Macron vê governabilidade ameaçada em meio ao 'polarizado' Parlamento eleito na França
19:36 08.07.2024 (atualizado: 20:34 08.07.2024) Especiais
Em uma das eleições mais acirradas e concorridas na história da democracia francesa, a coalizão Nova Frente Popular, que reúne vários partidos de esquerda, conquistou o primeiro lugar com 182 cadeiras. Porém, nenhuma frente teve maioria no Parlamento, e o futuro político do país deve seguir uma incógnita por semanas ou até meses.
País em que o voto não é obrigatório e que convive com um sistema semiparlamentarista, a França registrou no último fim de semana a
eleição com a maior participação popular dos últimos 40 anos: quase 60% dos eleitores compareceram às urnas. Para além desse feito histórico, o resultado também mostrou uma
reviravolta após a Nova Frente Popular, coligação que reúne vários partidos de esquerda, conquistar o maior número de assentos na Assembleia Nacional, seguida pelo Juntos, do presidente Emmanuel Macron, com 168 assentos, e a
Reunião Nacional, de Marine Le Pen, com 143. No primeiro turno, a última sigla, de direita, liderava a corrida parlamentar.
Apesar disso, nenhuma coalizão conquistou as
289 vagas necessárias para indicar o primeiro-ministro do país, o que deve levar a longas e incertas negociações. O professor da pós-graduação em ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenador do Centro de Estudos sobre a União Europeia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Rodrigo Barros de Albuquerque, ressalta em
entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, que a situação mostra um país extremamente polarizado e com a governabilidade ameaçada. Além disso, representa
mais uma derrota interna para Macron, que convocou o pleito após o resultado pífio do partido nas eleições para o Parlamento Europeu no fim de maio.
Depois de a Reunião Nacional liderar o primeiro turno, Juntos e Nova Frente Popular chegaram a fazer uma aliança informal na segunda etapa das eleições para barrar o avanço histórico no país da direita. "Nas eleições para o Parlamento Europeu, a maior parte dos candidatos franceses eleitos eram de alguma forma ligados à direita. Então foi uma estratégia do Macron [convocar eleições antecipadas no país] que claramente não foi bem-sucedida no primeiro turno. Considerando o resultado final, a sorte ficou no outro lado, com os partidos de esquerda se mobilizando para impedir a ascensão da Reunião Nacional, o que deu certo, mas não por conta do presidente. Deu certo por outras figuras ficarem preocupadas com a situação e reagirem", resume.
O especialista pontua ainda que Macron caiu em uma
armadilha que pode comprometer o atual governo ainda mais. "Eu acho que ele pensou nisso como uma boa estratégia. É algo comum em regimes como o da França, que é semipresidencialista, de pedir a antecipação de eleições como uma forma de tentar restaurar alguma força perdida recentemente. Então você dissolve o Parlamento e tenta promover certa reação da população para ter um novo Legislativo que seja mais favorável ao governo", explica, ao acrescentar que
ambos os espectros políticos do país mostraram insatisfação com a condução do país por Macron.
Quando termina o mandato do presidente da França?
Reeleito em abril de 2022 para um mandato de cinco anos na França após a
intensa disputa com Marine Le Pen, Macron tem acumulado derrotas internas nos últimos meses, como protestos por conta da Reforma da Previdência e crise no governo após o
endurecimento das leis de imigração. "Nessa situação agora tão divisiva que ficou a Assembleia Nacional, é muito difícil ele ter governabilidade, já que não tendo apoio de uma parte significativa do Parlamento você não vai conseguir governar. E uma coisa é você ter a formação da Nova Frente Popular para barrar o período eleitoral que o partido de Marine Le Pen subisse. Outra coisa é você continuar encampando todos os projetos aos quais
eles tecem críticas constantemente do governo atual", argumenta.
E mesmo após perder a liderança no segundo turno, a Reunião Nacional conquistou um espaço histórico no Parlamento, com aumento de 55 assentos na comparação com o último pleito, enquanto o Juntos perdeu 82. "Se nós tivemos um grande vencedor, não foi o Macron com toda certeza […]. E acredito que Marine Le Pen, apesar dessa queda brusca que teve entre o primeiro e o segundo turno, ainda saiu como grande vitoriosa. Conseguiu muita visibilidade para o partido e alcançar um espaço que nunca teve", enfatiza.
Rodrigo Barros de Albuquerque enfatiza também a diferença entre a agenda da
esquerda e a coalizão governista, mais equilibrada com relação às questões migratórias e que busca melhorar a situação dos trabalhadores do país, o que levou a rejeitarem inclusive a
mudança previdenciária de Macron.
Esquerda ou direita: quem ganhou a eleição na França?
Com a vitória da esquerda, o atual
primeiro-ministro Gabriel Attal chegou a pedir a renúncia do cargo, mas foi convencido por Macron a permanecer,
pelo menos até a situação ficar mais definida no país. Enquanto o impasse sobre quem ficará no comando da política interna francesa permanece, a atuação do país no globo não deve sofrer muitas mudanças, avalia o professor da UFPE. "Enquanto o chefe de Estado que conduz a política externa do país é o presidente, no caso o Macron, acredito que não terá muitas mudanças com relação a isso", diz.
Já o professor de relações internacionais do Ibmec, Márcio Sette Fortes, afirma à Sputnik Brasil que as eleições francesas tiveram mais perdedores do que vitoriosos em ambos os espectros políticos. "O que vai acontecer a partir de agora deixa muito claro que deixou um cenário de impasse, um cenário de uma França bastante polarizada. Nós temos agora uma situação em que a direita, que saiu vitoriosa no primeiro turno das eleições e que esperava um resultado melhor, foi eclipsada por uma aliança feita pelos centristas com a esquerda", enfatiza.
Para o especialista, a própria configuração da coalizão de esquerda que envolve diversos movimentos políticos pode se tornar um empecilho para alcançar algum consenso sobre quais rumos tomar. "Se a estratégia era barrar a Reunião Nacional da Marine Le Pen, ou seja, barrar aqueles que são chamados de direita, eles lograram êxito, é verdade. Mas, por outro lado, conseguiram mais cadeiras, mas sem maioria para governar. Então fica uma situação que deixa a desejar no futuro da política francesa, que exigirá muita negociação entre eles para que se possa conduzir a política do país", complementa.
Tudo isso, segundo Fortes, pode ser classificado como "um tiro no pé" dado pelo próprio Macron, que perdeu a maioria no Parlamento e
passa a ter uma oposição ainda mais forte. "Antes você tinha um presidente com baixa popularidade, que após as eleições legislativas continua
com baixa popularidade, mas com um panorama ainda pior. Antes você tinha um presidente que tinha maioria na Assembleia Nacional e, por isso, estava livre para escolher o seu primeiro-ministro, para formar o seu ministério e até
aprovar certas leis que fossem rejeitadas pelos deputados", explica.
Um país cada vez mais polarizado
Por fim, o professor do Ibmec acredita que países muito polarizados como a França deixam de conviver com uma divergência política saudável para terem o predomínio de embates constantes. "O que impera não é o bem-estar da população, mas brigar com o seu inimigo político. Em ambientes muito polarizados, deixa de existir o adversário e passa a existir o inimigo. E quando isso acontece, não importa se você tem um grande projeto para a nação, se você tem leis que possam trazer melhorias. Basta isso ser trazido pela oposição e será combatido ferozmente pelo partido que está no governo ou pelo partido que está na oposição."
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