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Pragmatismo diplomático e poder de barganha: como o Brasil equilibra as relações com China e EUA?

© Foto / Palácio do Planalto / Ricardo Stuckert / CC BY 2.0Presidente Lula empossa novos ministros e Mauro Vieira é empossado como ministro das Relações Exteriores, em 14 de janeiro de 2023
Presidente Lula empossa novos ministros e Mauro Vieira é empossado como ministro das Relações Exteriores, em 14 de janeiro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 26.08.2024
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O Brasil já demonstrou interesse e elaborou propostas para considerar a entrada na Iniciativa Cinturão e Rota. Entretanto, ao mesmo tempo, o país não quer se indispor com os EUA, segundo principal destino de nossas exportações.
Em entrevista ao Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, especialistas avaliaram como o Brasil deve proceder diplomaticamente para manter o equilíbrio nas relações tanto com a China quanto com os EUA.
Além disso, o que a entrada na Iniciativa Cinturão e Rota, também conhecida como Nova Rota da Seda, pode significar para o Brasil? Quais condições o Brasil precisa estabelecer para que a adesão ao plano chinês seja importante para o desenvolvimento do país sul-americano?

Governo brasileiro pode se equilibrar entre os interesses de Washington e Pequim?

Rafael Pons Reis, doutor em sociologia política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e professor do Centro Universitário Internacional Uninter, afirma que, para conseguir tal equilíbrio, o Brasil precisa lançar mão de uma postura pragmática e ressalta que o país tem elementos que preparam os diplomatas brasileiros para essa "postura assertiva".
Aderir à Nova Rota da Seda pode fortalecer ainda mais as relações com a China e também com o BRICS, no qual, segundo o analista, o Brasil vem perdendo um pouco de força, uma vez que a entrada de novos membros "enfraqueceu um pouco a posição negociadora do Brasil".
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Para equilibrar as ações em relações aos EUA, Pons Reis avalia que o governo brasileiro, sobretudo na figura do presidente Lula, precisa evitar discursos improvisados que tomem posições ideológicas que atinjam os norte-americanos.
"Não cabe isso para o Brasil. O Brasil precisa deixar de lado o envolvimento com questões que não lhe dizem competência", diz, citando ponderações do presidente brasileiro em situações como os conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza.

"Se o Brasil — e aqui especificamente falando do Lula — conseguir deixar um pouco essas práticas discursivas antiamericanistas, […] vai conseguir não apenas se sair bem, vai construir uma posição melhor diante do BRICS sem, com isso, enfraquecer a sua posição negociadora com os Estados Unidos", acrescenta.

Entretanto, para não ficar refém de nenhum dos países, o analista explica que o Brasil precisa "saber barganhar" e construir um conjunto de parcerias.

Brasil na Nova Rota da Seda: vai ou não vai?

A iniciativa chinesa Nova Rota da Seda completou dez anos em 2023 e já engloba 150 países. Sobre a estratégia, é necessário entender, segundo Bruno Hendler, professor de relações internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que se trata de "uma marca da política externa da China que busca se consolidar como grande potência".
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A China potencializa, dessa forma, investimentos em setores que são vetores de projeção de política externa e econômica. "Eles [China] entram com investimento externo direto na construção civil, que está no limbo entre serviço e indústria, serviços financeiros, como empréstimos, doações, acordos cambiais", explica Hendler.
Para o analista, a visão de mundo chinesa dificulta análises dotadas de certa perspectiva ocidental, como pensar: "Quais seriam prejuízos e benefícios ao aderir à iniciativa?"

"A Nova Rota da Seda é um guarda-chuva muito pouco vinculativo, que faz com que as relações bilaterais da China sejam reforçadas. Muito mais do que um novo Plano Marshall, um novo Bretton Woods, é um guarda-chuva. E o Brasil economicamente já tem sido puxado, como boa parte do Sul Global já tem sido puxada para esse campo de gravitação em torno da China", analisa.

Nesse sentido, como o Brasil é abrangido por esse guarda-chuva chinês, mesmo sem aderir à Nova Rota da Seda, o país já tem visto o setor de energia, por exemplo, sendo comprado por companhias estatais chinesas, ressalta o professor da UFSM.
A entrada do Brasil na iniciativa, portanto, é vista pelo analista como algo que deve acontecer naturalmente, haja vista a proximidade entre os dois países.
Desde 1993, o Brasil tem status de parceiro estratégico da China. O laço foi estreitado principalmente após a criação da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban).

"A gravitação econômica, que já existe, faz com que a adesão à Nova Rota da Seda seja meio inevitável, mas ela não é iminente. Ela não precisa acontecer agora, nos próximos meses, no próximo ano. Mas é meio que natural, dada a proximidade econômica que o Brasil está tendo com a China", destaca o especialista.

Para Pons Reis, a entrada do Brasil na Iniciativa Cinturão e Rota pode, sim, ser vista de maneira benéfica, desde que os termos de negociação sejam favoráveis aos brasileiros.

"Participar da Nova Rota da Seda exige esforços diplomáticos muito contundentes no sentido de negociar os tratados que vão ser colocados à mesa. O Brasil precisa de incentivos para ingressar."

Ou seja, a presença em projetos de desenvolvimento global "tende a aproximar o Brasil de uma maior participação nas cadeias globais de valor e de infraestrutura do comércio internacional", argumenta o professor da Uninter.
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No caso do Brasil, os investimentos chineses, em linhas gerais, poderiam chegar para o setor de infraestrutura e transitar em setores "como a construção de portos e estradas para melhorar o escoamento das commodities agrícolas que os chineses estão de olho", explica Pons Reis.

"Esse investimento em infraestrutura logística tem como objetivo também baratear o custo desses processos específicos realmente relacionados ao agronegócio, e não apenas isso. A China está de olho no Brasil por conta daquela famosa batalha de 5G que vem se arrastando pelo menos há mais de cinco anos", acrescenta.

Em relação a este último, o Brasil poderia se beneficiar de uma benesse que a China estaria disposta a conceder no setor de tecnologia, o que seria importante para o país sul-americano.
Tais investimentos, reforça o analista, poderiam fazer com o que o Brasil aumentasse o valor agregado de suas commodities agrícolas, mas não só isso. Seria interessante se o país aumentasse o valor do produto agregado mediante investimentos que sejam sustentáveis.

"Nós precisamos deixar a nossa economia mais complexa e investimentos em infraestrutura e tecnologia, sobretudo na área agora relacionada a energias renováveis. Talvez seja uma das formas de o Brasil tentar equilibrar mais a balança comercial, sobretudo com a China", atesta.

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De modo hipotético, para os analistas, dado o cenário atual, é possível apontar setores que, por ora, se beneficiariam do acordo.
Como a China é o país que mais investe em energia renovável no mundo, "o grande pulo do gato da China para entrar no Brasil é via economia verde, energia sustentável", diz Hendler.
Setores que eventualmente perderiam espaço, segundo o professor da UFSM, poderiam ser o da construção civil. Se nos anos 2000 as companhias se tornaram grandes campeãs nacionais com mercados na América do Sul e na África, após a operação Lava Jato teve a destruição dessa indústria pujante nacional.
"Esse é um dos setores que tem mais a perder. Não só por causa da Lava Jato, mas porque agora muitos mercados cativos dessas indústrias brasileiras caíram na mão de empresas e contratos chineses", explica.
Além disso, poderia também abrir a entrada para setores de tecnologia da informação e serviços no país, ressalta.
"Empresas gigantes como a Huawei estão querendo entrar aqui e controlar todo o 5G", completa Pons Reis, enfatizando a força tecnológica chinesa que quer chegar ao Brasil, deixando para trás a imagem que se popularizou de produtos "made in China" como sinônimos de pequenos objetos manufaturados.
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