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Brasil à deriva: como a Lei do Mar pode consolidar uma estratégia nacional sobre a Amazônia Azul?

© Sputnik / Laura Korobkova / Acessar o banco de imagensPlataforma petrolífera perto do Rio de Janeiro
Plataforma petrolífera perto do Rio de Janeiro - Sputnik Brasil, 1920, 04.04.2025
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Após ONU reconhecer como brasileira área marítima do Amapá ao Rio Grande do Norte equivalente ao território da Alemanha, necessidade de retomar discussões sobre o projeto da Lei do Mar volta a ser defendida no Congresso. Legislação busca conciliar interesses ambientais, econômicos e sociais sobre a Amazônia Azul, mas enfrenta resistência.
Um pleito histórico do Brasil para ampliar a fronteira marítima do país foi finalmente atendido pela Organização das Nações Unidas (ONU) na última semana: uma área de 360 mil km² no oceano que excede em 370 quilômetros a atual faixa de mar que o país possui teve os direitos de uso reconhecidos internacionalmente. A região se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte e é onde está localizada justamente a Margem Equatorial, nova fronteira marítima que se tornou esperança brasileira para o aumento das reservas de petróleo, que já começam a gerar preocupação por conta da aproximação do fim da vida útil da exploração do pré-sal.
Diante de um novo território marítimo reconhecido e que equivale ao tamanho de uma Alemanha, que já fazia parte da área conhecida como Amazônia Azul (em alusão às riquezas e à biodiversidade da maior floresta tropical do mundo, só que no mar), o Congresso Nacional pode retomar as discussões de um projeto de lei que está na pauta do Legislativo há 12 anos. É a instituição da Lei do Mar, proposta que cria a Política Nacional para Gestão Integrada, a Conservação e o Uso Sustentável do Sistema-Costeiro-Marinho, que pode ser votado nos próximos dias na Câmara Federal.
O texto tem autoria dos ex-deputados federais Alessandro Molon (PSB) e Sarney Filho (PV) e traz um arcabouço de medidas que vão orientar a gestão, governança e utilização do mar para as diversas atividades, tudo isso com foco no desenvolvimento sustentável. Porém a tramitação lenta é resultado da resistência de setores como o da pesca industrial e o da exploração de recursos marítimos, que inclusive possuem forte lobby no Congresso.
O professor de geopolítica do petróleo e das energias Marcelo Simas pontuou à Sputnik Brasil que o projeto busca organizar as várias atividades que coexistem no mar.

"Isso é justamente uma tentativa de fazer uma organização entre as questões econômicas, sociais e ambientais. Temos o transporte marítimo, turismo, pesca, plataformas de petróleo e gás, submarinos. Então é preciso organizar tudo isso para que possam coexistir e não competir por espaço […]. Mas existem alguns setores que resistem a essa questão, que são justamente os setores da mineração, do petróleo e gás, e da pesca, por exemplo, que temem justamente uma burocratização desse espaço marinho", explica, ao lembrar que, apesar de a mineração ainda não ocorrer no ambiente marinho, é uma atividade que se desenha para o futuro.

O especialista reforçou ainda a dimensão da Amazônia Azul, que conta com mais de 6 milhões de km² e de onde são retirados 95% do petróleo produzido pelo Brasil, dados que reforçam ainda mais a necessidade da nova legislação.
"Além disso, 95% do comércio exterior vêm pelo mar, 99% das comunicações, via cabo submarino, e 45% da pesca também estão no oceano. Para ter uma ideia, cerca de 20% do PIB, conforme estimativa do IBGE, também são gerados na região, quase o mesmo índice do agronegócio. Esse é um espaço enorme de que o Brasil se apropriou sem dar um tiro, sem guerra, em meio a um trabalho feito desde a década de 1970 em conjunto com a Petrobras, Marinha e outras entidades", ressalta.
Navio-sonda da Petrobras durante partida do Rio de Janeiro para o Rio Grande do Norte - Sputnik Brasil, 1920, 04.01.2024
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Sem riscos para a exploração da Margem Equatorial

Já o especialista em cadeia de suprimentos para o setor de petróleo e gás e diretor da empresa de consultoria Vita Digital Soluções, Antonio Batista, acrescentou à Sputnik Brasil que a Lei do Mar não representa nenhum obstáculo para a exploração dos recursos energéticos da Margem Equatorial, pelo contrário, vai representar um novo marco regulatório que fortalece a responsabilidade ambiental do setor.

"A Lei do Mar estabelece diretrizes para o uso sustentável dos recursos marinhos, e justamente por isso ela não inviabiliza, mas orienta as atividades econômicas, como a exploração de petróleo e gás, para que sejam realizadas com responsabilidade ambiental, social e econômica. No caso da Margem Equatorial brasileira, trata-se de uma nova fronteira exploratória com alto potencial energético e estratégico para a segurança energética do país. As tecnologias e normas ambientais atuais permitem que essa exploração seja feita de forma segura e sustentável, com respeito à biodiversidade marinha e aos povos costeiros. Isso assegura que o desenvolvimento dessa região ocorra dentro dos princípios da Lei do Mar", diz.

Além disso, o especialista lembra que a decisão da ONU que amplia a plataforma continental na costa do litoral norte pode acelerar a tramitação da proposta no Congresso e ainda criar um ambiente mais favorável para investimentos no setor energético.
"Na prática, a aplicação da Lei do Mar reforça a soberania do Brasil sobre a sua plataforma continental estendida, como no caso da Margem Equatorial, permitindo que o país exerça o direito exclusivo de explorar e utilizar os recursos naturais existentes nessa área — incluindo o petróleo e o gás natural. Com esse respaldo legal internacional, reconhecido pela ONU, o Brasil ganha maior segurança jurídica e reconhecimento geopolítico para desenvolver atividades econômicas no mar de forma sustentável e estratégica."

Desafios do poder marítimo do Brasil

Sem uma grande estratégia pensada sobre a expansão do setor marítimo brasileiro com objetivos nacionais de longo prazo, ceder às influências externas se torna um risco para a Amazônia Azul. O professor Marcelo Simas lembrou que esse é um dos desafios de futuro para o país, que teve seu último grande plano de desenvolvimento criado em 1975.
"Entre as décadas de 1930 e 1980, o Brasil planejou bem e conseguiu se desenvolver. Mas, desde a década de 1980, não temos um planejamento. E o poder marítimo é uma das vertentes do poder nacional, que tem cinco grandes expressões: política, psicossocial, econômica, militar e de ciência e tecnologia", afirma.
E uma oportunidade trazida por esse projeto é a de fazer uma utilização racional do poder marítimo brasileiro, a exemplo de países que também possuem dimensões continentais, como Rússia, China, Índia e Estados Unidos.
"Esse poder se traduz na nossa capacidade de portos, marinha mercante, pesca, produção de petróleo e também a proteção militar da Amazônia Azul […]. Um exemplo é a chamada maldição do petróleo, em que muitos países, apesar de terem o recurso, não conseguiram traduzir isso em desenvolvimento econômico e social. É preciso estratégia para se posicionar, já que temos todos esses recursos à nossa disposição", finaliza.
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