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De assentamentos ilegais à guerra na Faixa de Gaza: a expansão à força do projeto da Grande Israel

© AP Photo / Majdi MohammedTanques israelenses avançam em direção ao campo de Jenin, na Cisjordânia. Palestina, 23 de fevereiro de 2025
Tanques israelenses avançam em direção ao campo de Jenin, na Cisjordânia. Palestina, 23 de fevereiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 19.11.2025
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Guerra na Faixa de Gaza, novas incursões militares no Líbano e na Síria e o avanço de assentamentos considerados ilegais pelo direito internacional recolocaram no centro do debate uma ideia antiga, mas reativada por parte da direita israelense: o projeto da "Grande Israel".
A expressão remete a uma leitura bíblica segundo a qual a "terra prometida" aos judeus se estenderia do rio Nilo, no Egito, ao rio Eufrates, no atual Iraque. Na prática, virou bandeira de setores que defendem a expansão permanente das fronteiras israelenses, a anexação de territórios palestinos e o enfraquecimento definitivo da perspectiva de criação de um Estado palestino viável.
Para entender de onde vem a ideia da Grande Israel, é preciso voltar ao fim do século XIX e à figura de Theodor Herzl, considerado o pai do sionismo político, conforme explica ao podcast Mundioka o historiador Mansur Peixoto, fundador do canal História Islâmica. Em seus escritos, Herzl e outros intelectuais sionistas discutiam a formação de um Estado judeu em uma faixa de território muito maior do que as fronteiras atuais de Israel, ancorados em referências bíblicas que falam da terra entre o Nilo e o Eufrates.
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"Se a gente vai ler os escritos de Theodor Herzl sobre em qual espaço geográfico ele coloca o Estado de Israel, a gente vê que ele sempre colocou entre o Nilo e o Eufrates, a ideia de uma grande Israel bíblica", afirma.

Conforme o especialista, essa visão combina leitura religiosa e uma "pseudo-arqueologia sagrada" que tenta reconstituir a narrativa bíblica em termos de fronteiras concretas. "Na mente de Theodor Herzl e dos seus sequazes, e na mente dos planejadores do futuro do sionismo, a ideia da Grande Israel é um fato que precisa ser estabelecido", diz.
Na prática, Mansur vê um fio de continuidade entre os escritos de Herzl, o sionismo revisionista de Ze'ev Jabotinsky e lideranças atuais do movimento de colonos. "Você vai ter esse plano da Grande Israel desde o pai do sionismo, com Theodor Herzl, até as palavras de Daniela Weiss [ex-prefeita de Kedumim e uma das maiores defensoras dos assentamentos ilegais], em qualquer vídeo que você encontrar nas redes sociais dela, e de outros líderes do movimento dos colonos".
Para Mansur, o projeto da Grande Israel não é apenas retórica religiosa e se materializa em políticas concretas de expansão territorial e normalização de assentamentos em áreas ocupadas sob o atual governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. "Desde 2018, Israel tem como valor nacional a ideia dos seus assentamentos ilegais. Veja só, algo que é considerado ilegal pelo direito internacional é um valor nacional dentro do Estado de Israel", pontua, ao acrescentar que vê Israel como um Estado colonialista.
O especialista argumenta ainda que o sionismo se molda a diferentes expectativas políticas e religiosas, o que ajuda a explicar a amplitude de seu apoio global. "Para um cristão sionista, o sionismo atende a uma ideia perfeita de milenarismo messiânico. Para um judeu sionista, ele atende a uma ideia perfeita de autoafirmação de poder após uma história recente, trágica, como foi a do Holocausto. Para um sionista progressista, o sionismo possui a ideia da imposição de uma realidade progressista dentro de um ermo selvagem de bárbaros", exemplifica.
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Flotilha humanitária e a experiência do 'Estado corsário'

No fim de agosto, Mansur deixou o Brasil para participar da flotilha Global Sumud, iniciativa de 500 ativistas, de mais de 40 países, que tentou furar o bloqueio a Gaza criando um corredor humanitário pelo mar. "Passamos 30 dias no mar, sofremos bombardeios, ataques militares […]. Fomos sequestrados, todos os nossos barcos foram roubados, os nossos pertences pessoais foram roubados, a ajuda humanitária foi roubada, roubada em águas internacionais", revela.
Segundo o historiador, os barcos foram levados à força para um território controlado por Israel e os ativistas foram encaminhados ao centro de detenção de Kitzi'ot, no deserto de Negev. Para Mansur, Israel é uma espécie de "Estado corsário", que agiu em águas internacionais sob a tutela de grandes potências ocidentais, como os Estados Unidos.
Mansur também descreve o tratamento que os ativistas receberam nos centros de triagem. "Uma das coisas que os guardas sempre perguntavam era se eu era árabe […]. Meu tratamento ali seria absolutamente diferente se eu fosse", conta.
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Grande Israel: projeto ideológico minoritário

Já a assessora acadêmica do Instituto Brasil Israel (IBI) e professora de relações internacionais do Ibmec Karina Calandrin pontua ao podcast Mundioka que o projeto da Grande Israel de fato existe, mas não pode ser tomado como sinônimo de todo o sionismo nem de toda a sociedade israelense.

"O Instituto Brasil Israel entende que esse projeto da Grande Israel é um projeto ideológico […]. Ele é expresso hoje por grupos políticos dentro de Israel que têm uma inclinação, seja puramente religiosa, seja também política e ideológica, de aumentar o território israelense para um projeto maximizador", argumenta.

Segundo a especialista, a proposta que voltou ao centro do debate nos últimos anos é baseada em uma interpretação específica da terra bíblica: "Acreditam que, para Israel se realizar enquanto um Estado judaico pleno, não é apenas qualquer território que conta. Teria que ser toda a terra de Israel bíblica".
Porém Calandrin e o instituto se colocam na direção oposta: são favoráveis à solução de dois Estados, um palestino e outro judeu, seguindo as linhas definidas em 1967 pela Organização das Nações Unidas (ONU). "Então reconhecendo a Cisjordânia e a Faixa de Gaza como territórios palestinos, contra os assentamentos israelenses em ambos os territórios, e criticando sempre a expansão desses assentamentos como política de governos israelenses."
Além disso, a professora, que se considera uma sionista de esquerda, rejeita de forma contundente a comparação entre sionismo e nazismo. "Comparar o sionismo ao nazismo é uma forma de invalidar o movimento nacional judaico, invalidar a busca pela autodeterminação judaica, e eu não vejo isso como válido."
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Em meio à escalada da violência e à repercussão global da guerra em Gaza, cresce também a tensão em torno de acusações de antissemitismo dirigidas a críticos do governo israelense. Karina alerta sobre o risco de banalização do termo. "Isso é uma instrumentalização do antissemitismo, que é algo muito sério. E não deveria ser utilizado dessa forma, banalizando o que é o antissemitismo", afirma.
Para ela, é essencial separar a crítica política do ódio aos judeus. "Uma crítica ao governo Netanyahu, dizer que a guerra que Netanyahu realiza não é uma guerra justa, não é uma guerra proporcional, que o governo de Israel passou dos limites, isso não é antissemitismo […]. Agora, se você faz uma crítica no sentido de que os judeus não podem ter um Estado, que os judeus não têm direito à autodeterminação, isso sim pode ser entendido como antissemitismo", finaliza.
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