"No último minuto, quando chegou a hora do presidente estar presente nesta sexta-feira (7) pela manhã na sede do Cira, informaram que ele não compareceria porque o embaixador da Palestina estaria presente na reunião", explicou o vice-secretário de da instituição, Martín Saade.
O encontro contou com a presença do presidente do Cira, Fabián Ankah, do diretor do centro cultural islâmico King Fahd, Sultan Alarfaj, além da ministra das Relações Exteriores argentina, Diana Mondino.
A chanceler não soube dar qualquer explicação, visto que Milei estava prestes a chegar ao Centro Islâmico quando decidiu cancelar a visita, além das respostas de que foi por "problemas de agenda e complicações de última hora", disse o vice-secretário do Centro Islâmico.
"Foi uma grande bagunça, uma reunião frustrada", disse ele. "Tivemos aquele desprezo que nos deixa em uma situação pior do que estávamos, porque foi uma oportunidade para o presidente pedir desculpa pelos ataques que tem manifestado contra o Islã desde o ano passado até agora, e assim reconciliar-se e aproximar-se do comunidade islâmica".
Durante a reunião, os 19 embaixadores manifestaram à Ministra das Relações Exteriores a sua preocupação com a impossibilidade "de poder avançar um vínculo sem discriminação com uma minoria deste país".
Discriminação reiterada
Desde que assumiu o cargo, em 10 de dezembro do ano passado, Milei tem se referido publicamente ao "terrorismo islâmico" em vários eventos, um conceito discriminatório e estigmatizante que conduz à islamofobia, como sublinha a Organização das Nações Unidas (ONU).
A Organização para a Cooperação Islâmica (OCI), composta por 57 países, também qualificou como "hostis" as declarações islamofóbicas do presidente argentino no Dia Internacional do Holocausto, 8 de maio, quando voltou a usar a mesma frase difamatória.
"Esse tipo de manifestação constrói um discurso de ódio estigmatizante que se transfere para a vida pública, com ataques a mulheres que vestem roupas árabes, com separação na fila do aeroporto de quem tem sobrenome árabe, ou com investigações de membros da comunidade que não prosperam e isso é um circo para a mídia", explicou Saade.
As conotações negativas referentes ao mundo muçulmano "prejudicam o tecido social ao qual pertencemos há mais de 150 anos, pois fazemos parte da comunidade argentina, as nossas instituições têm 100 anos e somos uma comunidade que contribui para o crescimento do país desde o aspecto social, científico e educacional", acrescentou.
Dadas as repetidas falas do líder do partido La Libertad Avanza, o Centro Islâmico solicitou, em diversas ocasiões, uma reunião para reverter a situação atual, mas ainda aguarda que esta oportunidade aconteça.
"Todos os dias distribuímos alimentos aos moradores de rua, temos uma escola com 500 crianças e receber esse tipo de tratamento não é bom", observou o representante do Cira.
Ao referir-se em diversas ocasiões ao "terrorismo islâmico", o presidente argentino incorre em uma atitude islamofóbica ao estabelecer um "conceito estigmatizante e discriminatório que gera discursos de ódio à população", reiterou o vice-secretário.
Apesar das declarações e atitudes humilhantes para com a comunidade muçulmana dirigidas por Milei, "a humanidade caminha na direção oposta a este tipo de construção que prejudica as comunidades minoritárias e, portanto, se uma frase semelhante tivesse sido dita sobre outra religião, não durariam dois minutos sem serem questionados como discriminatórios", observou Saade.
Alinhado incondicionalmente com os Estados Unidos e Israel, o presidente da Argentina prometeu em fevereiro, durante visita oficial a este último país, que transferiria a embaixada da Argentina para Jerusalém, fato que é considerado uma afronta e um gesto desafiador aos palestinos, que também consideram a cidade controlada pelo governo hebreu como sua capital.
Entre 450 mil e 500 mil pessoas compõem a comunidade muçulmana da capital argentina e dos chamados subúrbios de Buenos Aires, formada pelos 40 municípios adjacentes da província de Buenos Aires (leste), além de outros 2 milhões que estão distribuídos pelo resto do país.