Panorama internacional

Detenção de migrantes em Guantánamo 'geraria risco e insegurança', afirma analista

O presidente dos EUA, Donald Trump, assinou uma ordem executiva para permitir que a base naval de Guantánamo, localizada no leste de Cuba, seja usada como centro de detenção para imigrantes ilegais, que deve abrigar até 30.000 pessoas em situação irregular, consideradas uma ameaça social.
Sputnik
A decisão reacendeu mais uma vez os debates do uso desta instalação, que ocupa uma área de 117,6 quilômetros quadrados, e cuja devolução à maior das Antilhas não estava na mesa nem mesmo durante o restabelecimento das relações diplomáticas entre Washington e Havana, durante o segundo mandato de Barack Obama (2013-2017).
Segundo Ernesto Domínguez, professor do Centro de Estudos Hemisféricos e dos Estados Unidos da Universidade de Havana (UH), o tratado referente a esse enclave militar tem uma finalidade específica, porém, "na prática, tem sido usado para todo tipo de coisas", portanto, "deter ou enviar imigrantes para esse lugar não é a primeira vez que isso acontece".

Ele lembrou à Sputnik que, durante a chamada crise das balsas, o local recebeu dezenas de milhares de pessoas detidas ou interceptadas no mar na tentativa de chegar à costa dos EUA, e "elas permaneceram lá até que seus casos progredissem, com base em acordos de migração de 1994 e 1995".

Esse crise, ocorrida na década de 1990, foi determinada pela situação econômica da ilha e pelo descumprimento do acordo migratório de 1987, pelo qual os Estados Unidos se comprometeram a conceder até um máximo de 20.000 vistos por ano; No entanto, entre 1987 e 1994, concedeu apenas pouco mais de 11.000, de um total alegado de 160.000.
Precisamente na terça-feira (4), como parte da ordem executiva de Trump, o primeiro voo militar decolou dos Estados Unidos com migrantes deportados para a base naval de Guantánamo, o que se soma a eventos semelhantes recentes após o envio de pessoas para Índia, Equador, Honduras e Peru.
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Uma prisão para inimigos?

"Esta prisão ainda existe, embora o número de detentos seja menor agora. Obama, depois de chegar à Casa Branca, aprovou uma ordem executiva para fechamento desta penitenciária — embora em oito anos nunca tenha conseguido isso. A verdade é que, na prática, os Estados Unidos a usaram para o que queriam, e não é muito diferente neste caso", disse o especialista.

Entre os atos arbitrários cometidos naquela prisão militar estava a prisão de pessoas sem a proteção de direitos fundamentais durante o procedimento legal, incluindo o devido processo legal e o habeas corpus, violações do arcabouço legal dos EUA cometidas sob o pretexto de que a base não fica naquele país e, tecnicamente, "não é território soberano".

"Também foram utilizadas formas de tortura e há evidências de milhares de pessoas com acusações que, na maioria dos casos, eram infundadas ou não tinham qualquer fundamento. Além disso, as condições eram realmente negativas. Estamos falando de um lugar que não estava preparado e não estava equipado para ser uma prisão", destacou Domínguez.

Ele destacou que, apesar das denúncias, há um considerável apoio popular ao reforço da política migratória, especialmente contra a imigração ilegal. Durante a campanha eleitoral, nenhum partido ou candidato se afastou muito dessa abordagem e observa que a opinião pública não está pressionando contra o uso da base para transportar migrantes, mas isso tem implicações, pois os detidos estão fora do território dos EUA, sem garantias de direitos, o cumprimento do devido processo legal ou habeas corpus.
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A rejeição de Cuba

O presidente cubano Miguel Díaz-Canel denunciou a intenção do governo republicano de usar Guantánamo para deter migrantes, chamando-o de ato de brutalidade. Durante a XII Cúpula Extraordinária da ALBA-TCP, ele afirmou que a criação desse espaço de detenção é um "ato bárbaro" e uma ameaça à segurança nacional de Cuba e da sub-região e destacou que Guantánamo é um enclave militar ocupado contra a vontade do povo cubano e um centro de detenção e tortura condenado pela comunidade internacional.
Santiago Espinosa Bejerano, professor assistente e pesquisador do Centro de Pesquisa de Política Internacional (CIPI), disse à Sputnik que todos os anos o governo da maior das Antilhas rejeita a presença militar dos EUA no leste do país e exige seu retorno e lembrou que uma avaliação recente da Organização das Nações Unidas (ONU) determinou o fechamento urgente do presídio devido às injustiças ali cometidas.

"Agora não estamos falando de supostos combatentes classificados pelos EUA como terroristas, estamos falando de imigrantes, historicamente empregados como mão de obra barata em diversas ocupações que os nacionais desprezam, como agricultura, serviços e maquiadoras", destacou o professor que é especialista em questões de segurança, ciberespaço e guerra cibernética.

Bejerano diz que o uso irresponsável de Guantánamo como centro de detenção forçada "geraria um cenário de risco e insegurança neste enclave ilegal e seus arredores; ameaçaria a paz e se prestaria a erros, acidentes e interpretações errôneas que poderiam alterar a estabilidade e causar consequências graves".
Nesse sentido, segundo o direito internacional, a permanência dessa base ilegal — contra a vontade do povo cubano e em violação à integridade territorial de Cuba — qualifica-se como um ato de colonialismo, conforme registrado na resolução 1514, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) em 14 de dezembro de 1960.
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