Urano e Netuno são tradicionalmente classificados como "gigantes de gelo" porque contêm maiores quantidades de metano, água e outros voláteis do que Júpiter e Saturno. Em condições extremas de pressão, esses materiais se solidificam, formando o "gelo" que caracteriza essa categoria planetária. No entanto, essa visão clássica está sendo questionada por novas pesquisas que sugerem uma composição interna bem diferente da imaginada.
Um estudo recente da Universidade de Zurique (UZH) e do NCCR PlanetS propõe que os interiores de Urano e Netuno podem ser menos gelados e mais rochosos do que se acreditava. Os resultados, publicados na Astronomy & Astrophysics, indicam que seus núcleos podem conter proporções significativamente maiores de rocha. Além disso, o interior desses planetas pode não ser estático, uma vez que há indícios de que processos de convecção — semelhantes aos que ocorrem na Terra — podem estar presentes.
Segundo os pesquisadores, Urano pode ser um gigante de gelo (E) ou um gigante rochoso (D), dependendo das hipóteses do modelo
Historicamente, os planetas do Sistema Solar foram divididos em três grupos: os rochosos internos, os gigantes gasosos e os gigantes de gelo. Essa classificação se baseia na distância ao Sol e na presença de voláteis congelados além da chamada "Linha de Gelo". O novo estudo, conduzido por Luca Morf e Ravit Helled, desafia diretamente essa estrutura tradicional ao sugerir que Urano e Netuno não se encaixam tão bem nessa categoria.
A compreensão limitada desses planetas decorre do fato de que apenas a Voyager 2 os visitou, há quase quatro décadas. Para superar essa falta de dados, Morf e Helled criaram um método inovador que simula seus interiores usando perfis de densidade aleatórios e cálculos gravitacionais. O objetivo foi gerar modelos que fossem fisicamente consistentes, mas sem depender de suposições rígidas sobre a composição.
Os resultados mostraram que modelos "agnósticos" — que não partem do pressuposto de que o interior é dominado por água — descrevem melhor os dados observacionais. Isso sugere que Urano e Netuno podem ser majoritariamente rochosos, uma conclusão que se alinha a estudos sobre Plutão, cuja composição também é mais rochosa do que se pensava.
O estudo também oferece novas explicações para os campos magnéticos incomuns de Urano e Netuno, que apresentam múltiplos polos. Os modelos incluem camadas de "água iônica" capazes de gerar dínamos magnéticos em regiões específicas, o que explicaria a estrutura não dipolar observada. Os pesquisadores concluíram ainda que o campo magnético de Urano se origina mais profundamente do que o de Netuno.
Apesar dos avanços, o modelo ainda contém incertezas, reforçando a necessidade de missões dedicadas a esses planetas. Os novos cenários apresentados desafiam suposições mantidas por décadas e podem orientar pesquisas futuras sobre o comportamento da matéria em condições extremas.