Embora tenha durado pouco mais de dois meses, a guerra marcou toda uma geração de argentinos e o início do processo de redemocratização do país, com a queda do regime militar após a rendição em 14 de junho.
No início desta semana, a Organização das Nações Unidas (ONU) deu aval à argumentação apresentada pela Argentina em 2009, reconhecendo o direito do país em ampliar de 200 para 350 milhas náuticas sua soberania marítima, como previsto na Convenção do Mar. Na prática, o anúncio da ONU reconhece haver conflito de interesses na região. Ainda segundo a ONU, dos 16 territórios colonialistas hoje no mundo, a Grã-Bretanha responde por nove.
Para lembrar aquele tempo de combates, perdas e transformações na vida política e social da Argentina, Sputnik Brasil ouviu uma das testemunhas do conflito, Carlos Jorge Sili, membro da Associação dos Veteranos da Guerra das Malvinas, à época com 18 anos e integrante dos Fuzileiros Navais, os primeiros a desembarcar na zona de conflito.
“Minha unidade era o Batalhão de Infantaria da Marinha N.o 5, que chegou às Malvinas em 5 de abril para formar parte da defesa das ilhas. Ocupamos as posições principais em Puerto Argentino, onde as primeiras baixas foram nossas. Eles (ingleses) tinham maior número de efetivos e de equipamentos, mas nós dominávamos os terrenos. E tanto foi assim que, quando houve a rendição em 14 de junho, eles ficaram surpresos, porque estavam quebrados em termos de logística. Eles perderam barcos importantes, que foram postos a pique.”
“O retorno foi caótico, porque a sociedade naquele momento não queria saber de nada, tínhamos sido derrotados, ela não queria reconhecer o veterano de guerra, e por isso custou muito a reinserção à sociedade.”
Apesar de ter testemunhado a violência do conflito, Sili, hoje com 52 anos e jubilado, defende o serviço militar obrigatório para todos os países, mas reconhece que, naquele momento, o regime militar não podia continuar, porque era necessária a volta da democracia.
“Nenhum país que tem um governo militar tem boa condução, porque o militar não está preparado para conduzir um país. O militar é para cuidar do país, não conduzi-lo.”
Sili também faz uma revelação surpreendente e diz que, infelizmente, a Guerra das Malvinas abriu espaço para reivindicações de aventureiros.
“As pessoas que ocupam a Praça de Maio e se dizem veteranos não são veteranos de guerra. São pessoas que ficaram deste lado do continente e não lutaram nas Malvinas. São pessoas oportunistas que estão tentando ser reconhecidas como veteranos. Elas foram mobilizadas dentro do território, mas não foram às Malvinas.”
“O conflito teria que acontecer em algum momento, porque a Inglaterra, como é de conhecimento de todos, é um país invasor, não tem territórios próprios e por isso busca os distantes. Vão se cumprir 150 anos de usurpação permanente das Malvinas. Se a Argentina não tomasse a iniciativa de recuperar o que é nosso, a ilha ficaria permanentemente para a Inglaterra.”
“Trinta e quatro anos depois sabemos que nenhuma guerra é boa, porque deixa sequelas, perda de vidas e muita dor entre os familiares. Cabe a este Governo ou a outro que venha, de forma diplomática, recuperar o que nos pertence.
Início e fim dos combates
O conflito em torno das Malvinas começou quando tropas argentinas tomaram Puerto Argentino (Port Stanley), a capital do arquipélago, em 2 de abril de 1982. A resposta da Grã-Bretanha foi imediata, deslocando para o Atlântico Sul uma força-tarefa com 28 mil homens, quase quatro vezes maior do que o contingente argentino.
No dia 25 de abril, tropas britânicas desembarcaram na Ilha Geórgia do Sul e prepararam a contraofensiva com o apoio logístico também da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Houve perdas pesadas de ambas as partes. Do lado argentino, o torpedeamento do cruzador “General Belgrano” causou a morte de 386 tripulantes. Os britânicos perderam o destróier “Shefield” e outros navios, além de alguns caças abatidos pela artilharia antiaérea. O avanço britânico cresceu em 21 de maio, com o desembarque de mais tropas no lado oriental das Malvinas, e prosseguiu até a rendição das tropas argentinas em 14 de junho.
O saldo final dos combates para a Argentina foi de 649 mortos e um número não revelado de feridos. Os britânicos contabilizaram 255 mortos e 777 feridos. O custo da campanha foi avaliado em US$ 5 bilhões. Politicamente, a Primeira-Ministra Margareth Thatcher consolidou seu poder de influência na Europa, e do lado argentino a derrota contribuiu para acelerar a queda da ditadura militar.