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Análise: Milei avança no autoritarismo com o apoio de jovens que não viveram a ditadura argentina

© AP Photo / Gustavo GarelloJavier Milei canta em evento promocional de seu livro em Buenos Aires. Argentina, 22 de maio de 2024
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Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analistas afirmam que a população jovem da Argentina, sem memória da ditadura no país e descrente da política tradicional, apoia as iniciativas autoritárias do presidente argentino, Javier Milei, que podem desestabilizar a integração regional latino-americana.
O presidente argentino, Javier Milei, se elegeu no final de 2023 com a imagem de defensor do liberalismo. Porém, ao longo de seu primeiro ano de mandato, ele adotou, em várias ocasiões, medidas apontadas como um possível flerte com o autoritarismo, como ataques a instituições democráticas, deslegitimação de opositores e concentração de poder por meio de decretos presidenciais.
Somado a isso, no final de janeiro, o principal estrategista do governo Milei, Santiago Caputo, dono de uma conta na rede social X (antigo Twitter) intitulada Milei Emperador (Milei Imperador, em tradução livre), formulou uma controversa pesquisa on-line para saber se a população argentina aceitaria viver sob um regime autoritário.
A pesquisa não foi encomendada a nenhuma empresa de consultoria, sendo feita por meio de uma plataforma on-line, e trazia a pergunta "Em qual país você prefere viver?", com duas opções de resposta: "Em um país com um governo democrático, que respeita os direitos individuais das pessoas" ou "Em um país com um governo autoritário, que alcança bons resultados econômicos".
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas analisam por que Milei, que chegou a chamar o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, de ditador, vem flertando com o autoritarismo.
Regiane Bressan, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e especialista em América Latina, afirma que desde a campanha eleitoral, quando Milei falava em fechar o Banco Central da Argentina, já sinalizava a intenção de um avanço do autoritarismo no país.
"Quando a gente percebe um governo rompendo com as instituições, isso é um grande sinal de alerta", afirma.
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Bressan acrescenta que, desde que assumiu, o governo Milei vem adotando políticas para tentar criminalizar a oposição e reprimir o direito ao protesto. Ela lembra que a ministra da Segurança argentina, Patricia Bullrich, que concorreu com Milei nas eleições, vem atuando de maneira bastante assertiva e já anunciou um conjunto de restrições que visam punir manifestantes e organizadores de protestos.

"Lembrando que a Argentina é um país que tradicionalmente tem uma população muito politizada que vai às ruas, que se manifesta livremente. Então realmente esse é um ato que fere as conquistas da sociedade argentina. Aliás, a Patricia Bullrich já declarou que os envolvidos nos bloqueios em vias públicas serão também identificados e processados, o que de fato está na contramão das conquistas da sociedade argentina", afirma a especialista.

Na avaliação de Bressan, a descrença na política observada na população argentina, sobretudo entre os jovens, criou um terreno fértil para o autoritarismo de Milei. Segundo ela, "o grande problema na Argentina foi o país estar em uma crise econômica desde 2002".
"São 23 anos de crise econômica, e isso leva uma geração mais jovem a ser muito descrente da política tradicional, de tudo que o país construiu para as suas instituições, tudo que ele consolidou em relação às suas instituições democráticas. Porque a geração mais jovem quer uma resposta aos problemas econômicos, e muitas vezes esses jovens nunca reconheceram [na Argentina] um país próspero, como já foi no passado", explica.
Ela afirma que essa descrença resultou na eleição de Milei, que em sua tentativa de minar as instituições democráticas "encontra apoio em gerações jovens que querem uma resposta mais imediata às questões econômicas".
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"A juventude argentina quer respostas de maneira muito mais rápida aos problemas econômicos, e, ao mesmo tempo, não se reconhece a importância da política mais tradicional. Ou seja, a juventude, de maneira geral, está muito mais suscetível ao que se fala em redes sociais, a discursos e frases de efeito, do que a entender as questões mais profundas da própria política."

Matheus Oliveira, professor de relações internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), afirma que Milei nunca demonstrou ser "um defensor convicto, com apreço genuíno pela democracia", mas descarta que a pesquisa seja um indício de que esteja preparando um golpe de Estado. Isso porque Milei já tem apoio para governar.
"Me parece que é muito mais um esforço de tentar capturar um pouco a temperatura da opinião pública, até a temperatura da sociedade, considerando que se trata de um governo que vem aplicando uma política econômica bastante agressiva do ponto de vista social, sobretudo, e que tem aí um ano pela frente que não deve ser dos mais fáceis também."
Ele afirma que o grande elemento que faz com que Milei preserve o apoio entre a sociedade argentina é a redução da inflação, que encerrou 2024 em 117,8%, com queda de 94 pontos em relação aos 211,4% registrados em 2023.

"A sociedade argentina tem verdadeira aversão à inflação, porque já passou por experiências de hiperinflação, inclusive bastante brutais, no passado. Então isso é um elemento que não pode ser desconsiderado, porque ele permite que o governo ofusque uma série de problemas que ele possa ter em nome de ter conseguido baixar a inflação", afirma.

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Oliveira enfatiza que Milei tem o apoio da população jovem argentina seja porque essa parcela da sociedade não tem vivência nem memória das experiências do autoritarismo, seja porque, de alguma forma, se identifica com a retórica libertária dele de se opor ao politicamente correto.
Ele afirma que o apoio a Milei no cenário interno gera preocupação, sobretudo diante do atual contexto político latino-americano, que tem governos que estão em diferentes faixas do espectro. Segundo o especialista, atualmente existe uma divisão entre os governos da região e existe uma divisão também dentro dos próprios países.

"As sociedades latino-americanas estão, de modo geral, mais polarizadas, então isso por si só já torna o cenário mais complicado. O fato de o Brasil e o México estarem neste momento sob governos progressistas sem dúvida cria uma certa capacidade de compreensão desses arroubos da extrema-direita na agenda regional. Agora, a Argentina também é um país muito importante para a região, e a liderança [do país] contando com o apoio dos EUA nesse tipo de iniciativa, eu acho que aí a gente tem um fator de desestabilização importante para a agenda regional", afirma o analista.

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