"A indignação, o medo, o preconceito, o insulto, a polêmica racista ou de gênero se propagam nas telas e proporcionam muito mais atenção e engajamento do que os debates enfadonhos da velha política", diz, citando o livro "Os engenheiros do caos", de Giuliano Da Empoli.
"A balança comercial com a Espanha é superavitária para a Argentina e, do ponto de vista econômico, a atitude de Milei em nada colabora para mudar substancialmente essa relação. Entendo que pode isolar um pouco mais a Argentina, com uma ou outra sanção pontual, mas nada que se sobressaia à questão central: uma brutal crise econômica pela qual passa o país vizinho."
"A gente pensa que não dá problema, mas dá, tomando como exemplo a indústria frigorífica brasileira e as exportações de carne para a China durante o período pandêmico. A China levantou uma série de barreiras às importações brasileiras, e várias frigoríficas ficaram de fora", exemplifica.
Brasil e Mercosul podem ser prejudicados?
"Os problemas da Argentina têm outra origem, bem mais complexa. Para exemplificar, as vendas de produtos brasileiros para lá saíram de US$ 5,6 bilhões [R$ cerca de 28,9 bilhões], em 2023, para US$ 3,9 bilhões [R$
20,1 bilhões], em 2024, no acumulado de janeiro até abril de cada ano, uma queda de quase 30% na comparação. E isso não tem relação com a verborragia de Milei. A venda de combustíveis e lubrificantes do Brasil para a Argentina caiu 65% nesse período", comenta.
"A Argentina já está afastada das decisões de investimentos estrangeiros faz muito tempo. Sequer investidores especulativos têm apetite pela Argentina, menos ainda os investimentos produtivos. Como resultado, o peso argentino deverá desvalorizar em cerca de 70% em 2024, segundo o Bank of America. Tudo isso afasta o país do cenário econômico internacional, o que reforça a necessidade de flertar com a estratégia engendrada pelos 'engenheiros do caos', para Milei aparecer de alguma forma no noticiário", argumenta.
"Tanto o Paraguai como a Argentina assinaram e se comprometeram a conveniar com o Comando Sul dos Estados Unidos para fazer a gestão hidrográfica em conjunto. Os dois governos — Paraguai por chantagem, Argentina por subordinação — colocaram o Comando Sul, colocaram a DEA [Agência de Combate às Drogas] para administrar o corredor do narcotráfico da América do Sul", relata.
Crise econômica na Argentina: Brasil sente impacto no setor de turismo
"Se o presidente argentino trata mal outro chefe de governo, no caso Pedro Sánchez e sua esposa, qual a garantia de que um simples turista brasileiro [ou espanhol] será bem tratado lá? O mau exemplo não ajuda a atrair turistas, o que só piora o quadro da falta de dólares por lá. […] Longe de uma solução, os problemas vão se avolumando", finaliza Silva.